Argélia vai a votos em ambiente de descrédito
3 de maio de 2017No norte de África, a Argélia é vista como um país relativamente fechado. Mas muitos argelinos dão facilmente a sua opinião, mesmo sobre as eleições legislativas. "Não encontrei ninguém que diga: vou votar. Não sabia que havia eleições na Argélia", desvaloriza em tom irónico um cidadão argelino.
Dos 23 milhões de eleitores, quantos irão realmente votar? Poderão ser poucos. "Muitos argelinos diriam que esta eleição não significa nada. Há muito poucas expectativas em relação ao novo Parlamento", explica Issandr Amrani, especialista na Argélia da organização não-governamental International Crisis Group.
Atualmente, a Frente de Libertação Nacional, no poder, detém 221 dos 462 assentos no Parlamento. A segunda maior força é a União Nacional Democrática, com 70 deputados.
Temendo fraude, alguns partidos anunciaram boicotar a eleição. E na internet, circulam também vídeos de apelo ao boicote.
"Senti-me enganado"
"É incrível como as eleições e o Parlamento foram desvalorizados na era do Presidente Bouteflika", avalia Issandr Amrani.
Com 80 anos, Abdelaziz Bouteflika está no poder há 18 anos. No entanto, desde que o chefe de Estado sofreu um acidente vascular cerebral, há quatro anos, não está, na prática, na linha da frente da governação. Contudo, Bouteflika continua a representar o poder. Muito se especula sobre quem realmente governa: políticos, militares e/ou influentes empresários.
Abdelaziz Rahabi, diplomata e ex-ministro da Comunicação independente, duvida da seriedade das eleições desta quinta-feira. "Nas últimas eleições votei por volta das 16-17 horas. E na altura perguntei sobre a adesão às urnas. Foi-me dito que, até à tarde, 8% dos eleitores tinham ido votar. À noite, dados oficiais davam conta de 88%. Mais de dez vezes mais. Cumpri o meu dever como cidadão, mas senti-me enganado”, lamenta Abdelaziz Rahabi.
Segundo dados oficiais, nas últimas eleições, há 5 anos, 43% dos eleitores votaram.
Para Nacer Djabi, sociólogo na Universidade de Argel, na capital, os lugares no Parlamento são comprados e vendidos. O que parece ter ficado provado quando o filho do secretário-geral do partido no poder, Frente de Libertação Nacional, foi detido, depois de descoberto com listas eleitorais e somas em dinheiro.
Crise económica põe em risco estabilidade
Depois da revolução, conhecida como Primavera Árabe, em 2011, os governantes da Argélia deram benefícios sociais à população. "Diz-se que a paz social foi comprada", afirma o sociólogo argelino Nacer Djabi.
"Mas foi também uma forma de redistribuir as receitas provenientes do petróleo. O que é apreciado pelo povo, porque é melhor que uma situação de caos e de exigências impossíveis", acrescenta Nacer Djabi, sociólogo na Universidade de Argel.
Mas os benefícios têm diminuído devido à crise económica, o que gera inquietação. Com os cortes orçamentais e medidas de austeridade, crescem na Argélia o descontentamento e a instabilidade.
Desde a guerra civil (1991-2002), que causou mais de 150 mil mortos, a estabilidade é um elemento muito importante na vida dos argelinos.