Aristides Gomes: "O meu Governo foi afastado à força"
2 de março de 2020
Em exclusivo à DW África, Aristides Gomes confirma que o seu Governo foi afastado do poder e os membros foram impedidos de entrar nos ministérios. Porta-voz de Sissoco Embaló diz que "a república das bananas acabou".
"Não podem trabalhar porque estão materialmente impedidos de aceder aos seus gabinetes. O meu Governo foi afastado do poder por via da força", afirma Aristides Gomes em entrevista exclusiva à DW África.
Militares ocupam instituições públicas
Demitido na sexta-feira passada por Umaro Sissoco Embaló, um dia depois de este ter sido empossado como Presidente da República à revelia do Supremo Tribunal de Justiça, o político diz que o país caminha para a consumação de um golpe de Estado e denuncia que o primeiro-ministro nomeado assumiu o seu gabinete esta segunda-feira (02.03).
"O meu gabinete foi assaltado e violado por Nuno Nabiam. Os militares continuam a bloquear o acesso a todas as instituições do Estado. Os juízes do Supremo Tribunal não reiniciaram os seus trabalhos porque a instância que alberga os órgãos judiciais está bloqueada por homens armados dos serviços de defesa e segurança", continua.
Gomes diz que está a trabalhar a partir de casa apenas com a segurança da força estrangeira estacionada na Guiné-Bissau, porque retiraram-lhe os militares nacionais que o protegiam. "Retiraram as duas viaturas que os meus seguranças utilizavam, porque nós não queremos entrar em briga, evidentemente. Eu dei instruções ao pessoal da minha segurança para não resistir e para entregar essas viaturas, que foram violadas e levadas para o Ministério do Interior. Quanto [à minha] segurança, estou relativamente seguro em casa, a ser protegido pelas forças da ECOMIB".
Sobre a posição da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), que condenou a atual situação política na Guiné-Bissau, Aristides Gomes diz: "Espero mais da comunidade nacional, dos guineenses. Espero que estejamos mobilizados e que nos possamos ocupar dos nossos assuntos internos. A comunidade internacional já está a fazer o que pode fazer ao acompanhar a situação."
Aristides Gomes: "O meu Governo foi afastado do poder à força"
Porta-voz de Sissoco Embaló nega golpe
Ouvido pela DW África, em nome de Umaro Sissoco Embaló, que preside a Guiné-Bissau atualmente, o diplomata Hélder Vaz anunciou uma nova era no país.
"Sempre que há mudanças de governos e novos primeiros-ministros, as forças de segurança ocupam os ministérios até que os novos titulares tomem posse nos seus respetivos ministérios. Não é nada de novo", refere Vaz.
"Não ocorrem situações de golpe de Estado. Isto é alarmismo. Em situações de golpe de Estado, não há necessidade sequer de ocupar os ministérios, porque os titulares dos ministérios são detidos. Estamos a brincar com a Guiné-Bissau, não é uma república das bananas. A república das bananas acabou", frisa.
Hélder Vaz diz que a situação política é de total acalmia e que as pessoas continuam a circular livremente nas ruas de Bissau: "naquilo que diz respeito à soberania nacional, a integridade das fronteiras, está perfeitamente controlada. No que diz respeito aos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos consagrados na Constituição, estã perfeitamente assegurados. Há plena liberdade de expressão, plena liberdade de imprensa e do exercício da atividade política e outras liberdades".
Segundo Vaz, há apenas um candidato derrotado que não quis aceitar os resultados das eleições presidenciais: o candidato Domingos Simões Pereira, do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC).
Sumos, bolachas e até "bifes" para diversificar rendimento do caju
O caju é a principal fonte de rendimento dos produtores guineenses. A fim de estimular a economia, os produtores de Ingoré uniram-se na cooperativa Buwondena, onde produzem sumo, bolachas e até "bife" de caju.
Foto: Gilberto Fontes
O fruto da economia
Sendo um dos símbolos da Guiné-Bissau, o caju é a principal fonte de receita dos camponeses. A castanha de caju representa cerca de 90% das exportações do país. Este ano, foram exportadas 200 toneladas de castanha de caju, um encaixe de mais de 250 mil euros. A Índia é o principal comprador. O caju poderá trazer ainda mais riqueza ao país, se houver maior aposta no processamento local do produto.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no processamento
Em Ingoré, no norte da Guiné-Bissau, produtores de caju uniram-se na cooperativa Buwondena - juntamos, em dialeto local balanta - para apostar no processamento do caju. Antes, aproveitava-se apenas a castanha, desperdiçando o chamado pedúnculo, que representa cerca de 80% do fruto. Na cooperativa produzem-se agora vários produtos derivados do caju.
Foto: Gilberto Fontes
“Bife” de caju
Depois de devidamente preparado, o pedúnculo, que é a parte mais fibrosa do caju, pode ser cozinhado com cebola, alho e vários temperos. O resultado final é o chamado “bife” de caju.
A partir das fibras, produz-se também chá, mel, geleia, bolacha, entre outros. Ao desenvolverem novos produtos, os produtores diversificam a dieta e aumentam os seus rendimentos.
Foto: Gilberto Fontes
Néctar de caju
Depois de prensadas as fibras do caju, obtém-se um suco que é filtrado várias vezes, a fim de se produzir néctar e sumo. Com 50% desse suco e 50% de água com açúcar diluído, obtem-se o néctar de caju. Este ano, a cooperativa Buwondena produziu quase 400 litros desta bebida.
Foto: Gilberto Fontes
Sumo de caju
O sumo resulta da pasteurização do suco que foi filtrado do fruto, sem qualquer adicionante. Cada garrafa destas de 33cl de sumo de caju custa quase 0.40€. Ou seja, um litro de sumo pode render até 1.20€. O que é bem mais rentável que vinho de caju, produzido vulgarmente na Guiné-Bissau, que custa apenas 0.15€ o litro. Em 2016, foram produzidos na cooperativa quase 600 litros de sumo de caju.
Foto: Gilberto Fontes
Mel de caju
Clode N'dafa é um dos principais especialistas de transformação de fruta da cooperativa. Sabe de cor todas as receitas da cooperativa e só ele faz alguns produtos, como o mel. Mas devido à falta de recipientes, este produziu-se pouco mel de caju. Desde que se começou a dedicar ao processamento de fruta, Clode N'dafa conseguiu aumentar os seus rendimentos e melhorar a vida da sua família.
Foto: Gilberto Fontes
Castanha de caju
Este continua a ser o produto mais vendido pela cooperativa. O processamento passa por várias etapas: seleção das melhores castanhas, que depois vão a cozer, passam à secagem, ao corte e vão à estufa. As castanhas partidas são aproveitadas para a produção de bolacha de caju. Este ano, a cooperativa conseguiu fixar preço da castanha de caju em 1€ o quilo, protegendo os rendimentos dos produtores.
Foto: Gilberto Fontes
Potencial para aumentar produção
A maior parte dos produtos são vendidos localmente, mas alguns são comercializados também em Bissau e exportados para o Senegal. A produção decorre sobretudo entre os meses de março e junho, período da campanha do caju. No pico de produção, chegam a trabalhar cerca de 60 pessoas. Se a cooperativa conseguisse uma arca frigorífica para armazenar o caju, continuaria a produção depois da campanha.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no empreendedorismo
A cooperativa Buwondena aposta na formação a nível de empreendedorismo, para que os produtores possam aumentar o potencial do seu negócio. A cooperativa pretende criar uma caixa de poupança e crédito. O objetivo é que, através de juros, os produtores possam rentabilizar as suas poupanças e apostar noutros negócios.
Foto: Gilberto Fontes
É urgente reordenar as plantações
A plantação de cajueiros é outra das preocupações da cooperativa: uma plantação organizada, com ventilação é fundamental para aumentar a rentabilidade.
Devido ao peso do sector do caju na economia da Guiné-Bissau, todos os anos são destruídos entre 30 e 80 mil hectares de floresta para a plantação de cajueiros. Especialistas defendem uma reordenação urgente das plantações.