Arresto das participações de Isabel dos Santos em empresas angolanas não terá consequências negativas para os trabalhadores, acreditam sindicalistas, já que o Estado tem interesse em manter estas empresas a funcionar.
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Isabel dos Santos disse no início do ano ao Jornal de Negócios que as suas empresas "foram condenadas à morte" depois da Justiça angolana ordenar o arresto preventivo dos seus bens. Mas vários defensores dos direitos dos trabalhadores discordam da empresária.
A Associação Industrial de Angola disse esta quarta-feira (08.01) à agência Lusa que o interesse do Estado é que as empresas em que Isabel dos Santos detém participações funcionem e continuem a produzir riqueza. E segundo a Central Geral dos Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CG-CILA), os direitos dos trabalhadores destas empresas estão "garantidos".
Arresto a Isabel dos Santos afetará trabalhadores em Angola?
"Acreditamos que a atitude do tribunal sobre a providência cautelar não terá consequências diretas na relação jurídica com os trabalhadores com as respetivas empresas. Mesmo na área económica e financeira acreditamos que não venha a ter, porque as empresas têm outros acionistas. O acionista neste momento que é provisório, que é o Estado, não terá grande papel para alterar o quadro funcional das empresas", disse o secretário-geral da CG-CILA, Francisco Jacinto.
O salário dos trabalhadores estará, por isso, assegurado, entre outros direitos. "Não há ainda reclamação sobre o pagamento de salário, mesmo que for o maior acionista provisório, neste momento o Estado, o Estado não vai deixar de pagar os salários. No caso, por exemplo, da ZAP, onde a senhora Isabel dos Santos detém 99,5% das ações, o Estado não vai deixar de pagar o salário. Foram congeladas as contas particulares, mas as contas das empresas não foram", esclarece Francisco Jacinto.
A DW África tentou ouvir trabalhadores das referidas empresas, sem sucesso.
Arresto "esperado há muito"
O Tribunal Provincial de Luanda anunciou a 30 de dezembro o arresto preventivo de contas bancárias de Isabel dos Santos e das suas participações sociais nas nove empresas, incluindo na UNITEL, empresa de telefonia móvel, e na ZAP, televisão por satélite. Em causa está uma dívida avaliada em mais de mil milhões de dólares.
Estado angolano vs. Isabel dos Santos
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Para a empresária angolana, há uma "motivação política" por trás do processo. Mas João Malavindele, coordenador da organização não-governamental angolana Omunga, diz que não ficou surpreendido com o arresto de bens de Isabel dos Santos. "Há muito que era esperado essa ação judicial contra a empresária Isabel dos Santos. Devemos reconhecer que no passado faltou coragem da justiça angolana".
Manuel Fernandes, um dos vice-presidentes da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), da oposição, vê o arresto dos bens de Isabel dos Santos com naturalidade. "É perfeitamente normal, na medida em que, o Estado preocupado com a possível fuga de capitais investidos pela engenheira e que poderia incorrer na impossibilidade de recuperação do empréstimo feito pela engenheira Isabel enquanto empresária para avultado investimento que ela tem, intentou essa ação para ver se o Estado consiga rever todo o património financeiro", declarou.
O político da CASA-CE apela agora a que se garantam os direitos de Isabel dos Santos no decorrer do processo. "Nós temos que ter o hábito de permitir que a justiça faça o seu trabalho e acreditarmos que o processo vai ser conduzido com toda a transparência necessária […] para que haja a possibilidade de se fazer justiça e não injustiça. Porque sabemos que a engenheira Isabel dos Santos, enquanto cidadã, também merece a proteção das instituições da nossa Justiça", defende Manuel Fernandes.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.