Obras de Justino Cardoso retratam a vida e a história de Moçambique e do continente africano em banda desenhada, sobretudo no tocante à paz. Trabalho está exposto no Museu Nacional de Etnologia, em Nampula.
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As tréguas resultantes das negociações constantes entre o chefe do Estado moçambicano, Filipe Nyusi, e o líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Afonso Dhlakama, servem de fonte de inspiração, também, aos fazedores de arte a produzirem suas obras. Um deles é o artista gráfico Justino Cardoso, de 57 anos, natural de Namapa, na província nortenha de Nampula.
Apesar de os nacionais pouco aderirem aos seus trabalhos, o artista continua a produzir em banda desenhada. Algumas de suas obras encontram-se em exposição no Museu Nacional de Etnologia, na capital provincial.
Ainda neste ano, Cardoso lançou um trabalho em banda desenhada intitulado "O Preço da Paz". Nesta obra, saúda os esforços das duas lideranças, sobretudo do Presidente da Republica que, recentemente, abandou o ar condicionado e outras mordomias que tem por direito e foi juntar-se ao líder do maior partido da oposição para mais um frente-a-frente de diálogo.
Mas Justino tem um conselho. "Tem de haver abertura na história para esta ser conhecida. Não se pode tratar [o tema] só politicamente, mas sim tocar a história, para as pessoas saberem e unir a partir das suas linhagens [clãs e tribos]", disse.
Filipe Nyusi é o terceiro Presidente moçambicano a negociar a paz, depois de Joaquim Chissano em 1992 em Roma, e Armando Guebuza que, durante o seu último mandato, quase assinou um acordo com Afonso Dhlakama. Mas Guebuza falhou por, alegadamente, não se materializarem os compromissos rubricados entre as partes.
Esperança na paz
Justino Cardoso acredita que Nyusi poderá convencer Dhlakama a rubricarem uma paz definitiva.
"A humildade é a chave de tudo. Temos um Presidente humilde e com um carácter especial que não perde nada ir para ali [ao encontro do líder da RENAMO na serra da Gorongoza]. Portanto, não tivemos nenhum igual", afirmou.
Não é apenas de Moçambique e dos moçambicanos que Justino Cardoso fala nas suas obras, assim como de outros aspetos históricos a nível de África e do mundo em geral. Por isso, desde 2009, trabalha com o Laboratório Mundial da Física para Paz.
"Tenho produzido, através do laboratório, algo que seja bom para os seres humanos, através de cartazes e outras obras gráficas", revelou.
Aceitação internacional
Além da paz, Justino Cardoso já produziu várias obras - entre livros e cartazes de banda desenhada - que retratam sobre a corrupção, a fiscalidade, a história antes e para alcançar a independência, entre outros temas. Parte destas já foram traduzidas em nove línguas estrangeiras, além da publicação em português.
O artista falou da valorização e aderência dos produtos artísticos culturais, no país, como não sendo saudável. Devido a este factor, as suas obras, incluindo os direitos autorais, estão a ser geridos fora do país, concretamente na Suíça.
"Eu tenho muitas obras e até agora não sei quantas tenho porque não conto, e sou pago pelos direitos autorais. Mas aqui [em Moçambique], é difícil", disse.
Para a melhoria no sector cultural, Cardoso defende a criação, no país, da Direção Geral das Artes [a exemplo de Cabo Verde], apesar de já existir o Ministério da Cultura e Turismo.
"É esta que vai lidar com as artes e sabe que é necessário um determinado financiamento para um determinado artista ou grupo cultural e, neste caso, o Ministério da Cultura se encarregaria da divulgação das políticas de valorização das artes e culturas", sublinhou.
Em junho do próximo ano, Justino Cardoso vai completar 40 anos de carreira. Para marcar as festividades, o artista anunciou que poderá lançar entre finais deste ano e principio do próximo, sem revelar datas, mais duas obras artísticas.
Trata-se de dois livros intitulados "A História Secular da Província de Nampula" e "Mácuas de Moçambique Dois". Estes vão contar as manifestações históricas e culturais da província de Nampula antes e depois da independência de país.
Alemanha e Moçambique no olho de dois fotógrafos
Moçambique é o ponto comum na exposição em Berlim que junta fotografias do moçambicano Mário Macilau e do alemão Malte Wandel. As crianças de rua em Maputo são o tema em destaque na obra de Macilau.
Foto: Mario Macilau
Crianças de rua, na visão de Macilau
Nesta foto, o fotógrafo moçambicano Mário Macilau optou por um plano de detalhe para abordar a questão da alimentação das crianças de rua. Esse é um dos temas fortes na obra de Mário Macilau que, em 2017, foi um dos vencedores do prémio internacional The LensCulture Exposure Awards.
Foto: Mario Macilau
Crescendo na Escuridão
Em 2017, a obra do fotógrafo moçambicano Mário Macilau esteve em exposição na Galeria Kehrer, na capital da Alemanha. As fotos foram extraídas de diversas séries produzidas por ele, especialmente do livro "Crescendo na Escuridão", que mostra a infância de crianças de rua em Maputo. A exposição inclui também fotografias do alemão Malte Wandel, que documenta a vida dos "Madgermanes".
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
A casa
A foto intitulada "Escadas de Sombras" mostra o interior de uma casa abandonada do período colonial. "Entrei nessas casas e comecei a observar a forma como esse sonho das casas de luxo se foi perdendo e as casas foram envelhecendo", revela Macilau. "Não queria mostrar o lado de rua dessas crianças, por isso, a maioria das fotografias foi feita dentro das casas onde elas moram", afirma.
Foto: Mario Macilau
Brincadeira
O menino com a arma de fogo nas mãos é, quase sempre, uma imagem chocante. Macilau garante que, aqui, trata-se de uma arma de brinquedo, feita pelas próprias crianças. O fotógrafo quis mostrar não apenas a dura realidade da vida nas ruas, mas também o imaginário e as brincadeiras, apesar da falta de perspectivas dos menores.
Foto: Mario Macilau
A imagem da alegria
A diversão na praia estampada nos sorrisos. A foto retrata a liberdade e a alegria do momento. Nem só de desesperança é feita a vida das crianças retratadas por Mário Macilau. "São crianças normais, que também têm sonhos. Elas vão passear, brincam, vão à praia. Isso tudo faz parte do lazer delas", considera.
Foto: Mario Macilau
Duas visões em exposição
Moçambique é o elo de ligação que junta dois fotógrafos na exposição, diz a gerente da Galeria Kehrer, Pauline Friesescke. "Mário apresenta um olhar de grande proximidade com os seus protagonistas", afirma. Já o trabalho de Wandel "coloca em debate uma parte interessante da história da Alemanha" e de Moçambique.
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
"Madgermanes": Protestos e resistência
Desde 2007, Malte Wandel documenta a vida dos "Madgermanes" – tanto daqueles que ficaram na Alemanha quanto dos que retornaram a Moçambique. Para o fotógrafo, "era importante mostrar pessoas diferentes, em diversos lugares e também de níveis sociais variados" descreve. Na foto em exposição em Berlim, os "Madgermanes" protestam pelo pagamento de parte do salário que era descontado para Moçambique.
Foto: Malte Wandel
Ambiente familiar
Malte Wandel fotografou diversas famílias dentro de casa. Na foto, a família de Jamal Trabaco, em Halle an der Saale, no estado alemão da Saxónia-Anhalt. "Para mim, era muito importante mostrar os ambientes privados, contar as histórias privadas e tornar essas famílias visíveis", explica o fotógrafo alemão.
Foto: Malte Wandel
Vítimas de ataques racistas
Foi na Praça Jorge Gomodai, em Dresden, que em 1991 o moçambicano Jorge João Gomodai foi atacado por jovens de extrema direita, vindo depois a falecer. "Nestes tempos em que Dresden representa o Movimento Pegida [Europeus Patriotas contra a Islamização do Ocidente], muitas manifestações aconteceram nesta praça e escolhi-a como símbolo para mostrar que a história se repete", justifica Wandel.
Foto: Malte Wandel
Uma vida sem glamour
O fotógrafo alemão interessou-se por retratar a situação nada glamorosa em que se encontravam os ex-trabalhadores da RDA. A imagem demonstra a sala da casa de Nelson Munhequete, em Maputo. "A foto mostra que ele não teve uma chance", diz Malte Wandel. "Dar cada vez mais visibilidade a essa história é meu objetivo", conclui.
Foto: MalteWandel
A opinião do público
Durante uma visita à exposição, o artista plástico Thomas Kohl encantou-se com o trabalho de Mário Macilau. "Tem-se a impressão de que se trata de uma situação real e não de algo encenado", descreveu. Para Kohl, apesar de abordar o tema pobreza, "não há um julgamento nem uma realismo barato" no trabalho de Macilau.