Três pessoas, entre as quais uma freira, morreram num novo ataque na província moçambicana de Nampula. Para o bispo de Nacala, Dom Alberto Vera, o ataque é sinal de que o terrorismo se alastra no país.
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A freira italiana de 83 anos, que vivia em Moçambique desde 1963, estava na missão de Chipene, na diocese de Nacala, que albergava centenas de pessoas que fugiam dos combates no norte do país.
O bispo de Nacala, Dom Alberto Vera, disse à DW África que o ataque ocorreu naquela missão pelas 21 horas de terça-feira (06.09), quando cinco ou seis terroristas entraram na casa onde estavam duas freiras idosas.
"A irmã Maria, baleada na cabeça, morreu no momento. Não sabemos qual o motivo para terem disparado, ela sabia e entendia a língua macua… A outra irmã, que é espanhola, foi avisar as 12 meninas que estavam no lar que havia homens armados a disparar e fugiram todas para o mato", disse o bispo.
Governo destaca soldados para a região
À hora do ataque, grande parte da população já havia fugido da aldeia, pois foi notória, a meio da tarde, a chegada de homens desconhecidos ao local, segundo Dom Alberto Vera.
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Para além da irmã Maria morreram mais duas pessoas que trabalhavam no centro de saúde de Chipene. Os atacantes atearam fogo a várias estruturas, entre elas a igreja, o centro de saúde e o hospital.
O Governo de Maputo destacou mais de uma centena de militares para o local. O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, confirmou, entretanto, que começou no sábado uma nova vaga de ataques armados no norte do país, não só em Cabo Delgado, como também na província de Nampula.
"Seis cidadãos foram decapitados, três sequestrados e dezenas de casas foram incendiadas", disse Nyusi.
Indício de que o terrorismo se alastra
O bispo de Nacala, Dom Alberto Vera, diz não ter dúvidas que os ataques dos últimos dias na região são indicativos de um alastramento do terrorismo à sua província.
"Isto é a continuação da guerra de Cabo Delgado. Parece que é o mesmo grupo que, na semana passada, atacou Ancuabe e entrou no distrito de Chiure, e matou várias pessoas em cada sítio", disse Dom Alberto, acrescentando: "Em todos os sítios por que passaram estão a criar um terror e um medo grandíssimo entre a população".
Face ao sucedido, e à probabilidade dos ataques se repetirem na região, Dom Alberto Vera afirma que a Igreja terá de repensar as missões localizadas entre Memba e Nacala-a-Velha. Mas assistir os deslocados continua a ser uma prioridade.
"Vamos apresentar um projeto de emergência, porque aqui já há muitas pessoas que fugiram, e vêm outras. Estas pessoas precisam de comida para sobreviver. Vou reunir esta tarde com a Cáritas Diocesana para ver o que podemos fazer", disse o bispo de Nacala.
Desde 2017, os ataques terroristas em Cabo Delgado já levaram à fuga de 800 mil pessoas, de acordo com a Organização Internacional das Migrações.
O desterro forçado dos deslocados em Cabo Delgado
São mais de 450 mil no norte de Moçambique. O terrorismo cortou-lhes as raízes e tomou-lhes o chão. Os deslocados internos procuram vingar noutras paragens. E Pemba tem sido lugar de eleição. Sobreviverão na nova terra?
Foto: Privat
A dor da perda e da impotência
Um olhar que diz mais do que mil palavras, a imagem poderia ser "sem legenda". Foi depois de um ataque à aldeia "Criação", Muidumbe, a primeira investida terrorista ao distrito, em novembro de 2019. Os insurgentes começaram os seus ataques em Cabo Delgado em outubro de 2017.
Foto: Privat
Histórias de vida reduzidas a cinzas
Desde então, a matança e destruição passaram a ser visitas assíduas da região. Como ninguém quer ser anfitrião, os aldeões fugiram. Em finais de outubro, Muidumbe e outros distritos sangraram de novo e a população fugiu. Muidumbe está praticamente nas mãos dos terroristas, tal como Mocímboa da Praia, desde agosto.
Foto: Privat
Quase todos os caminhos vão dar a Pemba
O único desejo destes residentes de Mueda é conseguir um canto no camião para chegar à capital provincial de Cabo Delgado. Mas a disputa entre pessoas e os seus próprios pertences ameaça deixar alguém para trás. Desde meados de outubro, Pemba recebeu cerca de 12 mil deslocados. Inicialmente, recebia à volta de mil deslocados por dia.
Foto: Privat
Quando o mato passa a ser melhor que o lar
Para muitos em Cabo Delgado, ter um teto deixou de ser sinónimo de segurança. Conseguir manter a vida, mesmo sem casa, passou agora a ser a meta. Os bichos passaram a ser mais cordiais que os irmãos terroristas, as estrelas melhores que o teto e os arbustos melhores que as paredes. Famílias procuram refúgio nas matas, onde caminham por dias dominados pelo medo, sem comida e sem norte.
Foto: Privat
Um abraço amigo em Pemba
Estes deslocados chegam de Quissanga. Mas também chegam à praia de Paquitequete, Pemba, deslocados vindos de vários lugares. Todos tentam escapar ao terror. Muitos fixam-se aqui, onde recebem apoio de ONGs, associações, indivíduos e do Governo. Há até quem abra as portas da sua casa para os receber, mesmo não os conhecendo.
Foto: Privat
Crise humanitária faz brotar solidariedade infinita
A falta de quase tudo faz despertar solidariedade que chega de todo o lado. Para quem está longe, uma angariação de fundos e bens materiais é a opção. Já cuidar dos deslocados na praia de Paquitequete, atendendo-os nas suas necessidades, é o que faz quem está no terreno. Na praia, há jovens que chegam de madrugada para dar amor a quem precisa.
Foto: Privat
Uma fuga rodeada de perigos
O medo é tanto que nem a sobrelotação parece intimidar os deslocados internos. No começo de novembro, mais de 40 pessoas morreram a tentar chegar a Pemba num naufrágio entre as ilhas do Ibo e Matemo.
Foto: Privat
Pemba a rebentar pelas costuras
O "boom" de deslocados é tão grande que o sistema de serviços básicos para a população, como água e saneamento, está no limite. Antes desta nova vaga de deslocados, a capital de Cabo Delgado tinha 204 mil habitantes. Agora, tem mais de 300 mil.
Foto: DW/E. Silvestre
Começar nova vida noutro chão
O Governo criou um comité de gestão para esta crise humanitária. Afirma que está a criar novas aldeias, centros de reassentamento, infrastruturas e a parcelar terras para acomodar os deslocados. Embora esteja garantida a segurança, as suas raízes estão noutro chão.
Foto: Privat
Que futuro?
Por enquanto não há resposta. Mas há deslocados que se vão "desenrascando" para sobreviver. Muitos dizem que não querem viver de mão estendida. Por exemplo, quem tem barco vai à pesca ou trasporta mercadorias. Outros entretêm-se a jogar futebol. Vão cuidando das suas vidas. Mas para os que não têm alternativas, que são a maioria, correrão riscos de entrar para o mundo do crime?