O constitucionalista franco-moçambicano Gilles Cistac foi baleado em 2015. Os autores do crime ainda não foram identificados. Motivações políticas podem estar na origem da letargia do caso, diz analista.
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Passaram-se três anos desde o assassinato do constitucionalista franco-moçambicano Gilles Cistac e ainda não se conhecem os autores do crime. Motivações políticas podem estar na origem da letargia em que está mergulhado o processo de investigação.
Até agora não se sabe exatamente se a Polícia da República de Moçambique deteve suspeitos ou mesmo se tem pistas concretas. No entanto, o caso já transitou para o Ministério Público, como revelou à DW África Inácio Dina, porta-voz da polícia.
Por essa razão, a PRM diz que já não tem mais nada a declarar sobre este caso. "Em respeito das fases processuais estiveram envolvidas a Polícia e a SERNIC na investigação. Mas neste momento, tudo o que se possa saber sobre o decurso do processo cabe mesmo questionar o Ministério Público”, ressaltou o porta-voz da polícia. Sobre a data em que o processo teria transitado para o Ministério Público, a PRM também não forneceu informações.
Motivações políticas
Para o criminalista e advogado, Elísio Sousa, o Ministério Público teria muito material para começar a investigar. "Foi um crime praticado a luz do dia, numa zona e numa hora com muita movimentação e, portanto, não há motivos para se dizer que não há elementos suficientes para começar a perseguir os meliantes”, explica.
Sobre as motivações para a demora em resolver o caso, elas parecem não tem a ver apenas com a dificuldade nas investigações. "Apesar de ser um processo com alguma complexidade na sua investigação, quanto a demora, parece-me haver alguma letargia por parte dos órgãos responsáveis”, afirma. O criminalista moçambicano considera que está haver um esforço mínimo por parte das autoridades para o esclarecimento deste caso.
Assassinato de Giles Cistac completa três anos e segue sem resolução
A sensibilidade política subjacente a este caso pode estar na origem da letargia em que está mergulhado o processo. "Não tenhamos dúvidas disso, não vamos tapar o sol com a peneira, como se diz. De fato este caso levanta situações políticas, porque sabemos que nos últimos dias de vida do Professor Cistac ele fez alguns pronunciamentos, que apesar de serem de condão juridico tinham alguns laivos políticos, que fazia mexer com o status quo”, lembra.
Relembre o caso
O constitucionalista foi assassinado no centro da capital moçambicana Maputo, a 3 de março de 2015, depois de ter considerado publicamente que não havia impedimento constitucional à pretensão do maior partido da oposição, a RENAMO, de criar governos provinciais autónomos nos locais onde saiu vencedora nas últimas eleições gerais.
Também dias antes do seu assassinato, Gilles Cistac estava a ser alvo de discriminação racista e a ser acusado por figuras não devidamente identificadas nas redes sociais de promover a subversão no país.
Além de constitucionalista, Gilles Cistac era docente, diretor adjunto de investigação e expansão e coordenador dos cursos de pós-graduação na Faculdade de Direito da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo.
Moçambique: Assassinato de figuras incómodas é uma moda que veio para ficar
O preço de fazer valer a verdade, justiça, conhecimento ou até posições diferentes costuma ser a vida em Moçambique. A RENAMO é prova disso, no pico da tensão com o Governo da FRELIMO perdeu dezenas de membros.
Foto: BilderBox
Mahamudo Amurane: Silenciada uma voz contra corrupção e má governação
O edil da cidade de Nampula foi morto a tiros no dia 4 de outubro de 2017. Insurgia-se contra a má gestão da coisa pública e corrupção no seu Município. Foi eleito para o cargo de edil através do partido MDM. Embora mais de sessenta pessoas já estejam a ser ouvidas pela justiça não se conhecem os autores do crime.
Foto: DW/Nelson Carvalho Miguel
Jeremias Pondeca: Uma voz forte nas negociações de paz que foi emudecida
Foi alvejado mortalmente a tiro por homens desconhecidos no dia 8 de setembro de 2016 em Maputo quando fazia os seus exercícios matinais. O assassinato aconteceu numa altura delicada das negociações de paz. Pondeca era membro da Comissão Mista do diálogo de paz, membro do Conselho de Estado, membro sénior da RENAMO e antigo parlamentar. Até hoje a polícia não encontrou os autores do crime.
Foto: DW/L. Matias
Manuel Bissopo: O homem da RENAMO que escapou por um triz
No dia 4 de janeiro de 2016 foi baleado depois de uma conferência de imprensa do seu partido na Beira. Bissopo tinha acabado de denunciar alegados raptos e assassinatos de membros do seu partido e preparava-se para se deslocar para uma reunião da força de oposição quando foi baleado. A polícia moçambicana até hoje não encontrou os atiradores.
Foto: Nelson Carvalho
José Manuel: Uma das caras da ala militar da RENAMO que se apagou
Em abril de 2016 este membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança em representação da RENAMO e membro da ala militar do principal partido da oposição foi morto a tiro por desconhecidos à saída do aeroporto internacional da Beira. A questão militar é um dos pontos sensíveis nas negociações de paz. Os assassinos continuam a monte.
Foto: DW/J. Beck
Marcelino Vilanculos: Assassinado quando investigava raptos
Era procurador foi baleado no dia 11 de abril de 2016 à entrada da sua casa, na Matola. Marcelino Vilanculos investigava casos de rapto de empresários que agitavam o país na altura. O julgamento deste assassinato começou em outubro de 2017.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Gilles Cistac: A morte foi preço pelo conhecimento divulgado?
O especialista em assuntos constitucionais de Moçambique foi baleado por desconhecidos no dia 3 de março de 2015 na capital Maputo. O assassinato aconteceu após uma declaração que fortaleceu a posição da RENAMO de gestão autónoma na sua querela com o Governo da FRELIMO. Volvidos mais de dois anos a sua morte continua por esclarecer.
Foto: A Verdade
Dinis Silica: Assassinado em circunstâncias estranhas
O juiz Dinis Silica também foi morto a tiro por desconhecidos, em 2014, em plena luz do dia, quando conduzia o seu carro na capital moçambicana. Na altura transportava uma avultada quantia de dinheiro, cuja proveniência é desconhecida. O juiz da Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo investigava igualmente casos de raptos. Os assassinos continuam a monte.
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck
Siba Siba Macuacua: Uma morte brutal em nome da verdade
O economista do Banco de Moçambique foi atirado de um dos andares do prédio sede do Banco Austral no dia 11 de agosto de 2001. Na altura investigava um caso de corrupção na gestão do Banco Austral. Siba Siba trabalhava na recuperação da dívida de milhões de meticais, resultante da má gestão do banco. Embora tenha sido aberta uma investigação sobre esta morte ainda não há esclarecimentos até hoje.
Foto: DW/M. Sampaio
Carlos Cardoso: O começo da onda de assassinatos
Considerado o símbolo do jornalismo investigativo em Moçambique, Carlos Cardoso foi assassinado a tiros a 22 de novembro de 2000. Na altura investigava a maior fraude bancária de Moçambique. O seu assassinato foi interpretado como um aviso claro aos jornalistas moçambicanos para que não interferissem nos interesses dos poderosos. Devido a pressões internacionais o caso chegou a justiça.