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Assassinato de Gilles Cistac não intimida vozes críticas

Nádia Issufo4 de março de 2015

Em Moçambique, outras vozes críticas têm sido alvo de ameaças, mas garantem que não se deixam intimidar. Entretanto, teme-se um aumento dos ataques racistas e a possibilidade dos doadores voltarem a penalizar o país.

Gilles CistacFoto: A Verdade

Fernando Lima, jornalista e diretor do semanário Savana, é uma das vozes críticas que tem sido alvo de ameaças em Moçambique.

"As nossas fotografias têm sido distribuídas nas redes sociais, como 'perigosos cadastrados'", diz. Além dele, outras figuras da praça pública moçambicana têm sido ameaçadas e acusadas de promoverem a instabilidade no país: incluindo o jornalista Fernando Veloso e o economista Nuno Castel-Branco.

"Há muito tempo que ataques de grande baixeza têm sido dirigidos a essas pessoas nas páginas dos jornais afetos ao regime. Também já foi pedido o seu fuzilamento e de mais umas tantas pessoas, à semelhança do fuzilamento que foi feito a Mateus Gwengere e Uria Simango." Ao todo, cerca de 40 pessoas foram ameaçadas, conta Fernando Lima. Muitas delas são jornalistas.

Lima não se deixa intimidar

Jornalista Fernando LimaFoto: DW

Os colaboradores do jornal independente dirigido por Fernando Lima já foram chamados várias vezes à Procuradoria-Geral da República e ao Conselho Superior de Comunicação Social devido a artigos que questionavam atitudes de gente ligada ao partido no poder, a FRELIMO.

Moçambique é um país onde as liberdades de expressão e de imprensa foram relativamente respeitadas nos últimos treze anos, mas regista-se um forte declínio nos últimos anos. Para Fernando Lima, o assassinato do constitucionalista Gilles Cistac, esta terça-feira (03.03), é um grande retrocesso em relação a tudo o que se conquistou até aqui ao nível das liberdades e da democracia no país.

Porém, o jornalista não se deixa intimidar. "Não alterarei a minha maneira de viver, de pensar e de me pronunciar politica e profissionalmente. O contrário seria fazer o jogo das pessoas ou instituições que pensam que, com seis tiros, amedrontam quem acredita na democracia, liberdade e pluralismo de ideias."

Racismo

A par das ações intimidatórias a vozes contestatárias, há também ofensas de natureza xenófoba. Na semana passada, Cistac queixou-se de estar a ser vítima de racismo. Nas redes sociais, um utilizador acusou inclusive o constitucionalista de ser um "espião francês", que conseguiu a nacionalidade moçambicana de forma fraudulenta.

O racismo é punível por lei em Moçambique, mas os autores de comentários racistas nas redes sociais nunca foram chamados a prestar contas, nem pela polícia, nem pela Procuradoria-Geral da República.

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"É preocupante quando o ódio toma estas proporções e estas tendências xenófobas e raciais", afirma Silvério Ronguane. O politólogo moçambicano diz que é preciso tomar medidas "enérgicas" para proteger as minorias. Caso contrário, isso pode ser "confundido em alguns círculos como tendências xenófobas e racistas das elites moçambicanas. Algo que é perigoso, porque a maior parte dos moçambicanos deseja uma convivência pacífica entre todos os grupos".

Efeitos nas relações com outros países?

Ronguane teme que, se não houver uma resposta firme do Governo moçambicano ao assassinato de Gilles Cistac, o caso tenha consequências negativas para as relações externas.

"É preciso lembrar que houve há pouco tempo um negócio de navios de guerra [e pesca, encomendados pela EMATUM] e quem apoiou efetivamente foi a França. Se há um cidadão de origem francesa que é vítima disto, acho que devia constituir uma grande preocupação para este Governo, porque estes são acontecimentos que até podem criar relações de inimizade."

Depois do assassinato do jornalista, também branco, Carlos Cardoso, em novembro de 2000, boa parte dos doadores internacionais, principalmente dos países nórdicos, fecharam os cordões à bolsa. A intenção era pressionar por mais justiça, transparência e por um combate mais forte à corrupção. O país, que tentou responder satisfatoriamente à pressão, ficou prejudicado com o corte das ajudas.

Politólogo Silvério RonguaneFoto: privat

O politólogo moçambicano Silvério Ronguane espera que, desta vez, isso não aconteça e que, "pelo contrário, essas organizações e países ajudem a esclarecer o caso rapidamente e a procurar os assassinos."

"É importante que nós, moçambicanos, comecemos a tomar medidas para que qualquer tipo de discriminação seja imediatamente reprimido. Há indivíduos, com agendas ocultas, que se aproveitam deste tipo de ataques para criar um clima de medo - mas sobretudo para colocar o nosso país em guerra com outros países."

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