O assassinato de um homem negro na última semana dentro de um supermercado no Brasil continua a gerar protestos. Movimento "Black Lives Matter" solidariza-se e caso é comparado ao de George Floyd, ocorrido nos EUA.
Publicidade
A morte de João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos, que ocorreu na última quinta-feira (19.11) dentro de um supermercado do grupo francês Carrefour na cidade de Porto Alegre, no sul do Brasil, está a gerar uma série de manifestações pelo país, que já contam o seu quarto dia.
João Alberto, também chamado por "Beto", foi espancado até à morte por dois seguranças do supermercado.
Na noite dessa segunda-feira (23.11), uma confrontação foi registada numa unidade Carrefour, entretando, noutra área da cidade.
Devido às manifestações, o supermercado teve de encerrar as atividades mais cedo e dispensou todos os seus funcionários.
Protestos contra racismo
O grupo de manifestantes entoava cânticos contra o racismo. Nas imediações do supermercado, fogo foi ateado em galhos de árvores e foram derrubadas grades de proteção que cercam a unidade. A polícia militar foi chamada para conter os manifestantes, reprimidos com balas de borracha.
As manifestações que pedem justiça pela morte de Beto e contra o racismo no país iniciaram-se na sexta-feira (20.11), o dia em que, coincidentemente, celebra-se no Brasil o "Dia Nacional da Consciência Negra".
Além de Porto Alegre, protestos espalharam-se por várias cidades do país neste final de semana - como Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Osasco.
No Rio de Janeiro, centenas de pessoas ocuparam a filial do Carrefour na Barra da Tijuca, uma zona nobre dessa cidade. Em protesto, os manifestantes gritavam: "Racistas não passarão" e "Carrefour assassino".
Em Belo Horizonte, populares revoltados entraram numa unidade do Carrefour. Em São Paulo, o interior de um supermercado da franquia francesa e produtos foram destruídos e incendiados.
Publicidade
"Black Lives Matter" no Brasil
A morte brutal ocorrida no supermercado em Porto Alegre repercutiu na imprensa internacional e sensibilizou o movimento "Black Lives Matter".
"Nos levantamos pela nossa família na Nigéria, vamos fazer o mesmo pelos nossos irmãos negros no Brasil! #VidasNegrasImportam", segundo sua publicação na rede social Twitter.
Criado em 2013, o movimento luta contra o racismo nos Estados Unidos e ganhou notoriedade internacional após o assassinato do cidadão norte-americano George Floyd,em circunstâncias apontadas como semelhantes à morte de João Alberto, no Brasil.
Deivison Faustino, doutor em Sociologia na Universidade Federal de São Paulo, salienta que "no Brasil, um jovem negro é assassinado a cada 23 minutos. Já nos EUA, não se chega - nem de perto - a esses números."
Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os negros no Brasil compõem cerca de 79% das vítimas de intervenções policiais que resultam em morte. Os números dizem respeito aos óbitos ocorridos em 2019, em todo o país - período que estatísticas apontavam cerca de 35 mil pessoas negras mortas.
O analista lembra que a violência contra pessoas negras no Brasil iniciou-se com a escravidão de negros africanos no país, abolida por lei no final do século XIX.
"O recente caso no [supermercado] Carrefour se torna um estopim. Num momento emblemático - o dia que antecede o Dia Consciência Negra - vemos mais um caso de uma pessoa negra morta desnecessariamente", lamentou o sociólogo.
Carrefour promete "Medidas cabíveis"
O grupo Carrefour, por sua vez, já informou que adotará "medidas cabíveis" para responsabilizar os envolvidos, e romperá seu contrato com a empresa que responde pelos seguranças que cometeram a agressão.
Já a empresa de segurança, o "Grupo Vector", disse ter iniciado procedimentos para apuração interna e informou, atarvés do seu advogado, que lamenta profundamente os factos ocorridos, mas garante que os seus colaboradores recebem treinamento adequado.
Protesto contra o racismo nos cinco cantos do mundo
A morte de George Floyd move pessoas em todo o mundo. Apesar das restrições devido à pandemia da Covid-19, centenas de milhares de manifestantes decidiram sair às ruas e protestar contra o racismo sistémico.
Foto: picture-alliance/AP Photo/T. Hadebe
Lisboa: Agir agora!
Embora a manifestação não tenha sido autorizada, a polícia permitiu que os participantes avançassem. Em Portugal, também há violência policial contra a população negra. Em janeiro de 2019, quando centenas de pessoas se manifestaram espontaneamente, após um incidente no bairro da Jamaica, a polícia disparou balas de borracha.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/J. Mantilla
Paris: Protesto no "Champ de Mars"
Nos últimos dias a polícia francesa tem dispersado manifestantes com gás lacrimogéneo nas manifestações nas proximidades da Torre Eiffel e em frente à embaixada dos EUA. No entanto, milhares de pessoas saíram à rua - mesmo para além de Paris - contra o racismo. A violência policial contra a população negra é particularmente generalizada nos subúrbios.
Foto: picture-alliance/Photoshot/A. Morissard
Manifestação apesar da proibição
A Bélgica, assim como a maioria dos países europeus, tem uma quota-parte na exploração e subjugação colonial de outros continentes. A atual República Democrática do Congo foi, em tempos, propriedade privada do Rei Leopoldo II, que estabeleceu um regime racista. Em Bruxelas, Antuérpia e Liège, houve manifestações contra o racismo, apesar das proibições impostas devido à Covid-19.
Foto: picture-alliance/abaca/B. Arnaud
Munique: Baviera colorida
Uma das maiores manifestações da Alemanha teve lugar em Munique, onde se reuniram 30.000 pessoas. Colónia, Frankfurt e Hamburgo também foram palcos de grandes manifestações. Em Berlim, a polícia teve de bloquear temporariamente as estradas de acesso à Alexanderplatz, porque havia demasiadas pessoas.
Foto: picture-alliance/Zumapress/S. Babbar
Viena: 50 mil contra o racismo
Na capital austríaca de Viena, reuniram-se 50 mil pessoas, segundo a polícia local. Esta foi uma das maiores manifestações dos últimos anos, incluindo o escândalo de Ibiza e a espetacular implosão da coligação de governo de direita em 2019.
Foto: picture-alliance/H. Punz
Sófia: Oposição ao racismo
Como a maioria dos países europeus, a Bulgária proíbe a realização de agrupamentos com mais de dez participantes. No entanto, centenas reuniram-se na capital da Bulgária, Sófia. Juntas, gritaram as últimas palavras de George Floyd antes de morrer: "Não consigo respirar", mas também chamaram a atenção para o racismo na sociedade búlgara.
Foto: picture-alliance/AA
Turim: Protesto com máscara
Esta mulher em Turim agrafou a sua preocupação política à mascára necessária num dos países mais afetados pela Covid-19: "As vidas negras também contam em Itália". As manifestações, incluindo em Roma e Milão, serão os maiores aglomerados registados desde o início das medidas de combate ao coronavírus. A Itália é um dos principais países de acolhimento de emigrantes africanos da União Europeia.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/M. Ujetto
Cidade do México: Floyd e Lopez
No México, não é apenas a morte de George Floyd que está a perturbar o país, mas também o destino semelhante do pedreiro Giovanni Lopez. Foi detido em maio, no estado ocidental de Jalisco, porque não estava a usar máscara. Presume-se que morreu vítima de violência policial. Após a publicação de um vídeo da operação, os manifestantes mexicanos intensificaram os protestos.
Foto: picture-alliance/Zumapress
Sydney: Racismo contra os aborígenes
O rali em Sydney começou com uma cerimónia tradicional de fumo. Aqui, a solidariedade dos pelo menos 20.000 participantes foi dirigida não só a George Floyd, mas também aos australianos da população aborígene, que também foram vítimas de violência policial racista. Os manifestantes exigem que ninguém continue a morrer sob custódia policial.
Foto: picture-alliance/NurPhoto/I. Khan
Pretória: Com o punho levantado
O punho levantado no ar é um símbolo do movimento "Black Lives Matter". Mas o gesto é muito mais antigo. Quando o regime do apartheid na África do Sul libertou Nelson Mandela da prisão, em fevereiro de 1990, ele levantou o punho no seu caminho para a liberdade, tal como este manifestante em Pretória. Na África do Sul, os brancos continuam a ser frequentemente favorecidos.