Ataques podem comprometer investimentos em Cabo Delgado?
Frejus Quenum | Lusa | tm
30 de março de 2021
Economista diz que ainda é cedo para saber se a violência em Palma vai levar as petrolíferas a abandonar a região permanentemente. Mas os atrasos no início das exportações de gás podem adiar os benefícios financeiros.
Publicidade
Milhares de pessoas deixam Palma para chegar à principal cidade da província de Cabo Delgado, Pemba, depois dos ataques ocorridos na passada quarta-feira (24.03), na vila que acolhe os projetos de gás do norte de Moçambique.
Os ataques à vila de Palma aconteceram no mesmo dia em que o Governo moçambicano e a petrolífera Total anunciaram a retoma gradual das obras do complexo industrial de Afungi, adjacente a Palma.
Nj Ayuk, diretor da Câmara Africana da Energia, está convencido de que se tratou de um ataque estratégico. "Palma é muito estratégica. É perto desta vila que Moçambique está a desenvolver o seu projeto energético. Há razão para se acreditar que o ataque vise este projeto, anunciado alguns dias antes. E existe uma grande reserva de gás na área", explica.
Já o economista Gerrit van Rooyen, da consultora NKC African Economics, diz que ainda é cedo para saber se a violência em Palma vai levar as companhias petrolíferas a abandonarem a região permanentemente. Concorda, porém, que atrasos no início das exportações de gás natural da bacia do Rovuma podem adiar os benefícios financeiros.
Garantir a segurança
O diretor da Câmara Africana da Energia, Nj Ayuk visitou a província de Cabo Delgado e encontrou-se com o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi. Garante que a preocupação não é apenas económica.
"Tive o privilégio de me encontrar com o Presidente e o ministro da Energia no início deste mês. Ambos afirmaram o compromisso do Governo em garantir a segurança, não é apenas por causa do projeto, mas pelo interesse da população em geral", assegura.
O analista aponta que oferecer oportunidades à população, e não apenas contar com uma resposta militar, seria uma opção eficaz para combater o terrorismo na região. "É preciso encontrar maneiras de dar oportunidades às comunidades. Empregos para os jovens e infraestruturas", diz.
Publicidade
Dividir meios militares de Maputo
Já do ponto de vista militar, o investigador do Instituto Universitário de Lisboa, Fernando Jorge Cardoso, diz que a ação em Palma visa dividir meios militares de Maputo.
"O grupo de terroristas, ao atacarem Palma, e ocuparem durante algum tempo essa vila e estarem presentes no local, isto é uma forma também de desviar efetivos daquilo que aparentemente tinha sido anunciado como um dos objetivos principais por parte das forças armadas moçambicanas", explica.
"Muito natural que, após três ou quatro meses em que o Estado Islâmico não faz pronunciamentos sobre aquilo que se está a passar no nordeste de Cabo Delgado, apareça agora a "dizer 'nós tomamos Palma'”, acrescenta o investigador.
Terrorismo em Cabo Delgado: As marcas da destruição e a crise humanitária
Edifícios vandalizados, presença de militares nas ruas e promessas de soluções por parte de políticos contrastam com a tentativa das populações de levar a vida adiante.
Foto: Roberto Paquete/DW
Infraestruturas vandalizadas
O conflito armado em Cabo Delgado deixou um número de infraestruturas destruídas na província nortenha de Moçambique. Em Macomia, os insurgentes não pouparam nem a Direção Nacional de Identificação Civil. Os danos no prédio do órgão deixaram milhares de pessoas sem documentos. E carro da polícia incendiado.
Foto: Roberto Paquete/DW
Feridas abertas até na sede da Polícia
O edifício da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Macomia ainda carrega as marcas de um ataque em 2020. O tanzaniano Abu Yasir Hassan – também conhecido como Yasser Hassan e Abur Qasim - é reconhecido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos e pelo Governo moçambicano como líder do Estado Islâmico em Cabo Delgado. Não está claro se o grupo é responsável pelos ataques na província.
Foto: Roberto Paquete/DW
"Eliminar todo o tipo de ameaça"
Joaquim Rivas Mangrasse (à esquerda) foi empossado chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas a 16 e março. "É missão das Forças Armadas eliminar todo o tipo de ameaça à nossa soberania, incluindo o terrorismo e os seus mentores, que não devem ter sossego e devem se arrepender de ter ousado atacar Moçambique", declarou o Presidente Filipe Nyusi (centro) na cerimónia de posse, em Maputo.
Foto: Roberto Paquete/DW
Missões constantes para conter os terroristas
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambique preparam-se para mais uma missão contra terroristas em Palma. A vila foi alvo de ataques, esta quarta-feira (24.03), segundo fontes ouvidas pela agência Lusa e segundo a imprensa moçambicana. Neste mesmo dia, as autoridades moçambicanas e a petrolífera Total anunciaram, para abril, o retorno das obras do projeto de gás, suspensas desde dezembro.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender o gás natural da península de Afungi
A península de Afungi, distrito de Palma, foi designada como área de segurança especial pelo Governo de Moçambique para proteger o projeto de exploração de gás da Total. O controlo é feito pelas forças de segurança designadas pelos ministérios da Defesa e do Interior. Esta quinta-feira (25.03), o Ministério da Defesa confirmou o ataque junto ao projeto de gás, na quarta-feira (24.03).
Foto: Roberto Paquete/DW
Proteger os deslocados
Soldados das FADM protegem um campo para os desolocados internos na vila de Palma. A violência armada está a provocar uma crise humanitária que já resultou em quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Apoiar os deslocados
De acordo com as agências humanitárias, mais de 90% dos deslocados estão hospedados "com familiares e amigos". Muitos refugiaram-se em Palma. Com as estradas bloqueadas pelos insurgentes em fevereiro e março deste ano, faltaram alimentos. A ajuda chegou de navio.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender a própria comunidade
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambqiue estão presentes também no distrito de Mueda. Entretanto, cansados de sofrer nas mãos dos teroristas, antigos militares decidiram proteger eles mesmos a sua comunidade e formaram uma milícia chamada "força local".
Foto: Roberto Paquete/DW
Levar a vida adiante
No mercado no centro da vida de Palma, a população tenta seguir com a vida normal quando a situação está calma. Apesar da ameaça constante imposta pela possibilidade de um novo ataque, quando "a poeira abaixa", a normalidade parece regressar pelo menos momentaneamente...
Foto: Roberto Paquete/DW
Aprender a ter esperança com as crianças
Apesar de todo o caos que se instalou um pouco por todo o lado em Cabo Delgado, a esperança por um vida normal continua entre as poulações. Na imagem, crianças de famílias deslocadas que deixaram as suas casas, fugindo dos terroristas, e foram para a cidade de Pemba. Vivem no bairro de Paquitequete e sonham com um futuro próspero, sem ter de depender da ajuda humanitária e longe da violência.