"Não podemos chamar desenvolvimento ao que estamos a ver"
11 de dezembro de 2024O trabalho da ativista moçambicana Anabela Lemos e da sua organização Justiça Ambiental! (JA!) contra projetos de exploração em Moçambique foi distinguido recentemente pela fundação sueca Right Livelihood Award.
Em comunicado, a fundação explica que "a organização expôs violações dos direitos humanos e crimes empresariais, atrasando, com êxito, o progresso do 'Mozambique LNG'". Nota ainda que, "tendo em conta o ambiente politicamente opressivo de Moçambique, a JA! é uma das poucas organizações no país que se atreve a contestar projetos tão prejudiciais".
À conversa com a DW, Anabela Lemos afirma que, nos encontros que manteve em Estocolmo, por ocasião da cerimónia de entrega da distinção, pôde sentir a solidariedade da sociedade civil e movimentos para com a atual situação pós-eleitoral em Moçambique e garante que o seu trabalho em prol das comunidades e do povo vai continuar.
DW África: Recebe este prémio numa altura de grande contestação política em Moçambique. Como é que vê a situação no país?
Anabela Lemos (AL): O prémio vai passar despercebido de um modo geral, mas acreditamos que é um reconhecimento do nosso trabalho e ficamos muito felizes por isso. O nosso trabalho vai continuar como sempre, porque acreditamos que não é este desenvolvimento que vai resolver o problema das pessoas.
No fundo, o que se está a passar agora [em Moçambique] mostra que aquilo que se chama desenvolvimento não tem trazido desenvolvimento nenhum para as pessoas. O povo está mais pobre, o sistema educacional quase não existe. O sistema de saúde é sempre um problema, transportes, tudo se está a desmantelar, por isso, não podemos chamar desenvolvimento ao que estamos a ver em Moçambique.
DW África: Qual foi a sua perceção da comunidade internacional perante esta crise pós-eleitoral em Moçambique?
AL: Na minha estadia, estive mais com a sociedade civil, alguns jornalistas e televisões. Não lidei propriamente com os governos. A sociedade civil, os movimentos, estão solidários com o povo moçambicano, principalmente quando o povo vai à rua exigir os seus direitos e os seus direitos são violados mais uma vez.
Quanto aos governos, eles têm sido muito cuidadosos nas suas declarações e acredito que estão a observar e ver no que é que isto vai dar. Não nos esqueçamos também que há muitos interesses de firmas estrangeiras, então há todo um cuidado de não dizer algo que possa mais tarde vir a afetar estes tais negócios.
DW África: Foi reconhecida com este Prémio Nobel Alternativo por se opor a projetos de exploração em Moçambique. No meio da crise pós-eleitoral, sente que esta questão acaba por passar mais despercebida?
AL: Sim, recebemos este prémio no meio de uma grande contestaçãoe conflitos em Moçambique. O povo foi à rua exigir justiça e não está a ser ouvido. O que pode acontecer? Não sei, mas a situação está-se a deteriorar.
Não vejo uma maneira pacífica de sair desta situação, se não for com calma e o Estado repor a justiça e aquilo que o povo está a exigir.