Com o mote #FORAFRELIMO, jovens ativistas em Moçambique chamam protesto pacífico através das redes sociais para o dia 15 de julho contra o reajuste das tarifas de transportes e o aumento no custo de vida.
A manifestação está a ser organizada por vários membros da sociedade civil que se dizem "fartos do governo" atual e que clamam por mudança no país. Isto numa altura em que também a Organização dos Trabalhadores de Moçambique - Central Sindical ameaça organizar uma manifestação ou greve à escala nacional como forma de mostrar o seu repúdio pelo elevado custo de vida.
Falámos com "Supleto", um dos jovens ativistas que conta juntar-se ao protesto da próxima semana, e que nos começou por explicar quais as razões que voltam a levar o povo às ruas.
DW África: Quais as razões para a realização deste protesto?
Supleto: A história é bem antiga, mas nós, jovens, decidimos mudar o destino do país. Senão, continuaremos na mesma miséria por mais 50 anos. Foram surgindo grupos isolados e nós nos identificamos com a causa que é libertar o país. Mas não do jeito como foi libertado há cinco décadas atrás, quando tivemos a independência. Conseguimos fazer isso de uma forma mais democrática, inicialmente com manifestações para nos rebelar. E mostramos ao governo e ao mundo o que se passa em Moçambique.
DW África: São protestos que surgem na sequência dos aumentos de preços no país?
Supleto: Essa é apenas a ponta do "iceberg". Nós estamos fartos, muito fartos. O custo de vida está muito alto e o salário mínimo não alcança nem para as refeições. Não dá. E mais de 70% do salário vai para o transporte, se for aumentar, do jeito que eles querem. Neste momento, estamos a falar de 50% a 60%.
DW África: O mote do protesto é #FORAFRELIMO. Ou seja, o que se pretende é pedir a demissão do governo ou exigir do governo novas medidas que possam melhorar a vida dos cidadãos?
60 anos da FRELIMO: A juventude e o futuro do partido
07:28
Supleto: O partido Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) não tem capacidade de melhorar a vida dos cidadãos. Há quase cinquenta anos, desde os nossos pais, nós que estudamos e conhecemos da qualidade de ensino no nosso país. Já tentamos conversar várias vezes, mas a FRELIMO não consegue. Os dirigentes do Comité Central são senhores de idade que lutaram pela libertação do país, mas são muito egoístas e não dão espaço para se ouvir novas ideias.
DW África: A redução do IVA, exigida por membros da sociedade civil e da oposição, mudaria alguma coisa?
Supleto: Seria uma das medidas para redução dos custos. O IVA é realmente benéfico para os cofres públicos. Mas pela situação que estamos a viver, está muito elevado. É muito para as nossas condições de vida. A redução seria o primeiro passo para o diálogo, se eles quisessem se mostrar abertos.
DW África: Como está a ser divulgado o protesto? Nas redes sociais?
Supleto: Até agora estamos nas redes sociais. Todo o povo pretende aderir, mas o nosso problema é a falta de segurança. Quando falo de segurança, estou a falar da reação da polícia. Já sabemos qual será a reação e realmente muitos jovens têm medo dos resultados. Estamos agora a fazer os pedidos à polícia. Mas acredito que será uma alerta para eles. Então logo estarão preparados. Acredito que no dia 14 [de julho], até o final de dia, em todos os terminais rodoviários, haverá mais gente com carros blindados e cães à espera do pessoal entrar na estrada, para começar a confusão.
60 anos da FRELIMO, alguns momentos históricos
A FRELIMO comemora 60 anos desde a sua criação, em 1962, na Tanzânia. Durante este período, já teve cinco presidentes. Só o primeiro não dirigiu o país – Eduardo Mondlane.
Foto: Marco Longari/AFP/Getty Images
Eduardo Mondlane (à direita), o primeiro presidente da FRELIMO
Eduardo Chivambo Mondlane, o primeiro presidente da FRELIMO, nasceu em Manjacaze, província de Gaza, sul de Moçambique, a 20 de junho de 1920 e morreu em 03 de fevereiro de 1969, na Tanzânia, vítima de uma encomenda armadilhada. Eduardo Mondlane é carinhosamente tratado como o "pai da unidade nacional", por ter conseguido unir os três movimentos que fundaram a FRELIMO (UDENAMO, MANU e UNAMI).
Foto: casacomum.org/ Documentos Mário Pinto de Andrade
Samora Machel , o primeiro Presidente de Moçambique independente
Nascido a 29 de setembro de 1933, também em Gaza. Após a morte de Eduardo Mondlane, Samora Machel dirigiu os destinos da FRELIMO e a luta de libertação nacional até à proclamação da independência de Moçambique, a 25 de junho de 1975.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Proclamação da independência nacional
A 25 de junho de 1975, em pleno Estádio da Machava, arredores da cidade de Matola, Samora Machel proclamou a independência nacional. Por essa via, viria a ser ele o primeiro Presidente da República Popular de Moçambique.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Sob liderança de Machel, foi lançada em 1983 a Operação Produção
Na visão de Machel, o país deveria ser autossuficiente na produção de comida. Mas a "Operação Produção" acabou forçando milhares de pessoas, consideradas improdutivas, marginais e prostitutas, das grandes cidades a deixarem as suas famílias, rumo a Niassa.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Samora Machel morre vítima de acidente aéreo em Mbuzini
A 19 de outubro de 1986, quando regressava de mais uma missão de Estado, o avião em que seguia despenhou-se na região de Mbuzini, na África do Sul. Calou-se a voz que marcou gerações em Moçambique. 36 anos depois, ainda não são conhecidos os autores morais e materiais da morte de Samora Machel.
Foto: DW/M. Maluleque
Joaquim Chissano - 2º Presidente de Moçambique e 3º da FRELIMO
Depois da morte de Machel, em 1986, coube a Joaquim Chissano a missão de tomar o remo do "barco" e navegar contra muitas turbulências. Encontrou o país mergulhado numa guerra civil e com alto índice de pobreza. Durante o seu reinado de 19 anos (1986-2005), assinou o acordo de Roma (1992) com a RENAMO, que pôs fim à guerra dos 16 anos. E liderou o processo de entrada no multipartidarismo.
Foto: Ismael Miquidade
Armando Guebuza – 4º Presidente da FRELIMO e 3º de Moçambique (2005-2015)
Sucedeu a Joaquim Chissano. Durante o seu reinado de 10 anos, Moçambique voltou a viver momentos de conflito militar com RENAMO. Também foi durante a governação de Guebuza que o país registou o pior escândalo financeiro na sua história - as "dívidas ocultas". Mas registou-se uma grande evolução em termos de infraestruturas públicas.
Foto: picture-alliance/dpa
Filipe Nyusi - o "homem" do momento (2015 até hoje)
Filipe Nyusi "levou" o poder político dentro da FRELIMO da região sul, onde sempre se concentrou desde o seu surgimento, para o "berço" da luta de libertação, Cabo Delgado. Encontrou o país mergulhado no escândalo das dívidas ocultas. Durante o seu consulado, lidou ainda com conflitos político-militares com a RENAMO, a "Junta Militar" e, atualmente, enfrenta os ataques terroristas de Cabo Delgado.