Aumento de guerras globais faz reduzir apoio a Cabo Delgado
7 de novembro de 2023Durante uma reunião do Comité Operativo de Emergência de Cabo Delgado, na semana passada, o chefe do escritório do Programa Alimentar Mundial (PAM) na região anunciou a redução, no próximo ano, do apoio às vítimas de terrorismo.
Maurício Burtet disse que o total de beneficiários do apoio prestado deverá cair entre 30% e 40% em comparação com os números atuais.
"Atualmente, estamos a assistir aproximadamente em torno de 600 mil pessoas. E para o ano que vem assistiremos no máximo 400 mil pessoas", explicou.
Muitas das vítimas do terrorismo já conseguiram regressar a casa, mas o corte no apoio alimentar não terá a ver com isso. Segundo o chefe do escritório do PAM, a medida deve-se à multiplicação dos conflitos armados no mundo, a exemplo da guerra de Israel contra o Hamas e da continuidade da invasão da Ucrânia.
É isso que, de acordo com Maurício Burtet, estará a desviar os recursos para a assistência humanitária nessas regiões. O responsável afirma que "o contexto global está muito mais preocupante em função dessas guerras. O número de conflitos aumenta cada vez mais e o PAM é solicitado a responder cada vez mais, com menos recursos. Estamos a ver aqui o impacto, na redução das operações em Cabo Delgado".
Porém, o representante da agência da ONU na região promete: "Vamos dar o nosso máximo para apoiar o Governo e continuar essa colaboração.”
A obrigação do Governo
O ativista social Aly Caetano diz que não ficou surpreendido com o anúncio. Entende que, para além do surgimento de novas emergências no mundo em consequência de novas guerras, o arrastamento da situação humanitária em Cabo Delgado desde 2017 tem desgastado a capacidade da organização de mobilizar novos fundos.
"Num cenário de emergência é muito mais fácil mobilizar fundos para um curto espaço de tempo. Para o caso específico de Cabo Delgado, o apoio estendeu-se por muitos e longos anos. E não é essa a ideia essencial de um apoio humanitário, principalmente num contexto de emergência", argumenta.
Para o ativista, "é natural que, primeiro, os fenómenos internacionais desviassem a atenção, mas o próprio desgaste dos doadores e das próprias organizações que estão a prover os fundos."
Quem também não vê surpresas na redução das operações do PAM em Moçambique é o economista Ali Abubacar, que lembra episódios anteriores em que o organismo das Nações Unidas suspendeu temporariamente os apoios aos deslocados.
"É nesse sentido que chegou a vez de o Governo ativar ações imediatas, como por exemplo, garantir a assistência humanitária à população afetada sem nenhum corte a partir de fundos próprios ou mesmo a partir da identificação de parceiros muito fortes além do PAM", diz o economista.
E sugere uma solução: "Não só isso, nós podemos ter, por exemplo, a sensibilização das famílias afetadas pelo terrorismo para a abertura das áreas agrícolas".
Riscos de aumento de assédio e prostituição
O ativista social Aly Caetano antevê consequências drásticas para a população dependente com a redução dos apoios.
"A escassez de alimentos - é uma hipótese, não estou a dizer que vai acontecer - pode levar grande parte das mulheres e raparigas a ter que aceitar assédios, até infelizmente se prostituirem, para garantir essa alimentação, mas isso deve-se à grande dependência que as pessoas têm desse apoio", afirma Aly Caetano.
É isso que já acontece em muitos casos, de acordo com as denúncias de várias organizações da sociedade civil.
Reagindo à notícia sobre os cortes no apoio do PAM, o secretário de Estado na província de Cabo Delgado, António Supeia, orientou as organizações ligadas à assistência humanitária a maximizarem os poucos recursos ainda existentes, priorizando as pessoas mais necessitadas.