"Aumento no preço da internet é para silenciar moçambicanos"
22 de maio de 2024Em Moçambique, continua a polémica sobre o aumento nos preços da internet. Centenas de jovens marcharam, em Maputo, no passado fim de semana, contra o aumento nas tarifas de comunicação, afirmando tratar-se de uma medida para limitar o acesso à informação e prometendo recorrer aos tribunais alegando que a decisão não tem sustentação legal.
O Instituto Nacional das Comunicações de Moçambique (INCM) publicou uma resolução em fevereiro que estabelece novas tarifas mínimas no setor das telecomunicações, de voz, mensagens e dados móveis. A sua adaptação pelas três operadoras, desde maio, levou ao aumento das tarifas e ao fim dos pacotes ilimitados.
Em entrevista à DW, a ativista Quitéria Guirengane descreve uma situação grave e caótica, não poupa críticas ao órgão regulador e promete protestos até a revogação da decisão.
DW África: Como está Moçambique no que diz respeito ao acesso à internet?
Quitéria Guirengane: Descreveria como uma situação grave e caótica. Moçambique é um país onde já falta internet, apesar de não ser na altura dos mais caros da região. Eram taxas, ainda assim, confortáveis, mesmo que o salário mínimo fosse muito distante da capacidade da cesta básica.
No entanto, com estas novas decisões do INCM, o país passou a se posicionar entre aqueles com as mais altas taxas de internet. Significa que passamos a lidar não só com o debate sobre segurança digital, mas voltamos a quase discutir, ao mais baixo nível, a questão do acesso.
DW África: E o preço de um gigabyte de dados equivale mais ou menos ao preço de um quilo de açúcar... Confirma?
QG: Sim, e mais do que isso. Estamos a dizer que o preço de um gigabyte, segundo a analogia que nós usamos, [equivale] a um quilo de açúcar. É um gigabyte que, nesta fase, a pessoa usa em menos de 24 horas. Ou seja, [com o valor] de um quilo de açúcar, conseguimos usar um gigabyte sem aceder a nenhum canal de televisão, ou filme. Além disso, com o uso das redes sociais de forma mais básica possível, [a internet] não dura mais do que 24 horas. É assustador numa economia em que o salário mínimo são, vamos dizer, 7 mil meticais, cerca de 100 dólares.
DW África: Organizaram uma marcha de protesto - essa manifestação teve algum impacto? Foi só em Maputo ou também teve repercussão noutras cidades?
QG: Teve repercussão em todo o país. É preciso dizer que o movimento que coordena é nacional – temos coordenadores em cada província do país e esses submeteram avisos de manifestação a escala nacional. Era posto que as manifestações teriam lugar em várias províncias do país, mas isso foi inviabilizado. Em alguns locais, pelo município, noutros, pela polícia.
DW África: Fala-se de uma petição a favor da revogação das novas tarifas mínimas lançadas pelo INCM para no setor das telecomunicações. O que é que pode dizer sobre essa petição?
QG: É preciso dizer que há uma série de ações e nós não acreditamos em um caminho único. Nós fizemos a ação de petição e um inquérito que colheu mais de dez mil usuários, que responderam ao mesmo. Nós estamos a nos reinventar constantemente, mas também a buscar evidências.
DW África: E estão com intenções de levar o protesto até onde?
QG: Até a decisão de revogação, porque já não é negociável. Nós adicionamos a cabeça do presidente do INCM, pois está efetivamente com uma postura arrogância. Primeiro, porque é preciso clarificar que a única pessoa que fala de borla é ele. Quer dizer, o INCM usa os nossos impostos e contribuições para comprar recargas para os dirigentes, mas nós, os cidadãos, compramos as nossas recargas usando o [dinheiro] do nosso próprio bolso. Somos milhões de moçambicanos, então não há porque cansarmos com a nossa ação.