Nunca a participação de editoras ou presença de escritores dos PALOP ficaram tão aquém das expetativas como este ano na Feira do Livro de Frankfurt, na Alemanha. Angola pagou um "stand", mas não está no certame.
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No pavilhão 5.1 da Feira do Livro de Frankfurt, que decorre de 11 a 15 de outubro, a placa informa que Angola tem lá um "stand". Mas na verdade não há "stand" nenhum, nem sombra. Mas ficamos a saber que o espaço foi pago, mas houve uma desistência no final.
Michael Kegler é tradutor de obras literárias do português para o alemão e marca presença na feira todos os anos. Ele conta: "Nós vemos aqui na placa que está escrito Angola, mas parece que esse "stand" foi adiado para o próximo ano, foram os rumores que ouvi."
Mas não foi pela ausência de um país africano de língua portuguesa na Feira que deixamos morrer o interesse pelo que se poduz nestes países. Estão no mesmo pavilhão outros países que igualmente falam o português: Brasil e Portugal.
Portugal e Brasil: que ligações com os PALOP?
Começamos pelo "stand" de Portugal onde encontramos Duarte Azinheira e uma colega a arrumarem livros na prateleira. Nenhum deles de autores dos PALOP, mas o diretor editorial da Imprensa Nacional Casa da Moeda, diz que tem no catálogo uma coleção que se chama escritores dos PALOP e que publica anualmente três a quatro títulos e não só.
"Temos um prémio em Moçambique, criado no ano passado, chamado Eugénio Lisboa. E brevemente, ainda este ano, anunciará o seu primeiro vencedor, com um júri de grande nível presidido pelo grande escritor moçambicano, chamado Ungulani Ba ka Khosa. E vamos criar um em São Tomé e Príncipe, que se vai chamar prémio IACM Almada Negreiros, que nasceu em São Tomé. E vamos criar também um prémio em Cabo Verde que ainda não tem nome", diz Azinheira.
Esta é a maior feira do livro do mundo, um evento mais focado para o mercado editorial, uma área ainda incipiente nos países africanos onde se fala português, como lembra Duarte Azinheira. Este queixa-se também de dificuldades na distribuição nos PALOP.
12.10.17. ONLINE Feira Livro Frankfurt 2017 - MP3-Mono
O diretor editorial da Impensa Nacional diz que "a presença editorial em Angola não é muito expressiva. Não encontramos muitas e boas livrarias em Luanda. Já em Moçambique é fácil encontrar livrarias, Maputo tem uma razoável rede de livrarias de média dimensão onde é possível encontrar livros de autores nacionais, mas também portugueses. Existem feiras do livro..."
Depois do "stand" de Portugal fomos ao do Brasil com representantes de dezenas de editoras. Com ligação aos PALOP não eram muitas. Mas como nem tudo corria mal apareceu-nos a frente justamente a representante da editora Pallas, que publica vários autores africanos e afro-brasileiros. A sua prateleira só tinha obras relacionadas com África.
Marina Warth garante que "os africanos de língua portuguesa são muito lidos [no Brasil], não somente Agualusa e Mia Couto e Pepetela, mas jovens autores estão a surgir."
Literatura dos PALOP é boa, mas...
A representante da Pallas diz também que "Ondjaki é um jovem autor com uma carreira bastante sólida" e por isso está convicta de uma coisa: "Estes autores acabam alavancando os outros que também acabam por ter mais condições de aparecer e mostrar que os países africanos produzem uma literatura tão boa e consistente quanto qualquer lugar do mundo."
Embora a literatura dos PALOP seja tão boa, como diz Marina Warth, ela não tem grande expressão numa feira desta envergadura. Facto que nos levou a concluir a reportagem por aqui.
Mas sempre há esperança de que para o ano as coisas melhorem, segundo Michael Kegler: "Podemos esperar para o próximo ano, que acho que vai haver [a presença de Angola]. Tomamos Angola aqui na placa como um anúncio. Se for verdade acho um bom sinal se finalmente um país participa por iniciativa própria e financiado por meios próprios. Seria muito bom, uma iniciativa que pode dar os seus frutos."
Cinemas únicos em Angola
São obras únicas vistas pela lente do fotógrafo angolano Walter Fernandes - cinemas e cine-esplanadas desconhecidos de muitos. As fotos foram reunidas em livro e estão em exposição em Lisboa, a partir desta semana.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
"Uma ficção da liberdade"
O Cine Estúdio do Namibe inspira-se nas obras do arquiteto Oscar Niemeyer. É um dos edifícios únicos de Angola destacados no livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade" e fotografados por Walter Fernandes. Esta é uma das imagens em exposição no Goethe-Institut de Lisboa que revelam uma arquitetura desconhecida por muitos de cinemas construídos antes do fim do domínio colonial português.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Património mal preservado
O Cine Tômbwa, também no Namibe, obedece a uma lógica de salas fechadas, mas já apresentava algumas linhas mais modernas. Segundo o fotógrafo Walter Fernandes, o edifício foi construído com materiais "sui generis". Mas o património herdado está muito mal preservado, lamenta o angolano.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Moçâmedes: A pérola do Namibe
No Cine-Teatro Namibe (antigo Moçâmedes) nota-se bastante a influência da arquitetura do regime ditatorial português, o Estado Novo. Este é considerado um dos cinemas angolanos mais antigos e também aparece no livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade", apadrinhado pelo Goethe-Institut em Luanda e pela editora alemã Steidl.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Conceito futurista
O arquiteto Botelho Pereira não só desenhou o Cine Estúdio do Namibe, como também o Cine Impala. Botelho Pereira inspirou-se no movimento deste antílope e planeou espaços abertos e arejados, de forma futurista. O livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade" também destaca estas cine-esplanadas, que ganharam popularidade a partir de 1960 por se adaptarem mais ao clima tropical do país.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Cinema-esplanada para as elites
Este é um dos cinemas preferidos de Miguel Hurst, um dos editores do livro "Angola Cinemas". Foi aqui, no Cine Kalunga, em Benguela, que se pensou em fazer a obra. Cine-esplanadas como esta adequavam-se mais ao clima, mas serviam também um propósito do regime português - criar locais de convívio entre as populações locais e os colonos. A elite branca e a pequena burguesia negra vinham aqui.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
A "grande sala"
A "grande sala" de Benguela era o Monumental - pelo menos, ganhou essa reputação. Os colonizadores portugueses construíram o Cine-Teatro nesta cidade costeira pois evitavam o interior do país - normalmente, as companhias portuguesas só atuavam nas grandes cidades da costa angolana.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Imperium: "Art decó" em Benguela
Aqui, são imediatamente visíveis traços da passagem da "art decó" (um estilo artístico de caráter decorativo que se popularizou na Europa nos anos 20) para o modernismo. O interior do Cine Imperium, fotografado por Walter Fernandes, representa bem essa mistura estética, com os cubos, retas, círculos e janelas. Benguela tinha várias salas, porque era das províncias mais populosas de Angola.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
O arquiteto que pensava as cidades
Este é o interior do Cine Flamingo: mais uma pérola da província de Benguela. A parte de trás é uma esplanada. Sentado, o espetador está em contacto com a natureza, mas não está exposto. Até hoje, a estrutura mantém-se, mas o espaço está um pouco vandalizado. Miguel Hurst sublinha a importância de manter obras como esta do arquiteto Francisco Castro Rodrigues, um homem que pensava cidades.
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Primeiro cine-teatro de Angola
"O Nacional" Cine-Teatro foi a primeira sala construída em Luanda, no início do Estado Novo, nos anos 40. Esta é uma das imagens patentes na exposição no Goethe-Institut em Lisboa. A mostra pretende ser "um testemunho do modo como estes edifícios constituíam um enquadramento elegante que sublinhava uma simples ida ao cinema, promovendo assim a reflexão sobre esta herança sociocultural e afetiva."
Foto: Walter Fernandes/Goethe-Institut Angola
Memória para gerações futuras
Os irmãos Castilho são os principais responsáveis pela introdução das cine-esplanadas em Angola. A primeira da sua autoria foi o Miramar, encostado a uma ribanceira virada para o mar em Luanda. Depois surgiu o Atlântico, na foto. Para os autores do livro "Angola Cinemas - Uma Ficção da Liberdade", este é um documento de memória que pode ser útil para as futuras gerações.