Avenidas Macky Sall e Buhari geram polémica em Bissau
Iancuba Dansó (Bissau)
30 de setembro de 2020
Decisão das autoridades de atribuir os nomes dos Presidentes do Senegal e da Nigéria a duas avenidas da capital guineense causa controvérsia. Ruas foram batizadas a 24 de setembro. Sociedade civil critica a iniciativa.
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As críticas sucedem-se desde que as duas avenidas foram inauguradas com os nomes dos Presidentes do Senegal, Macky Sall, e da Nigéria, Muhammadu Buhari, no dia 24 de setembro, por ocasião das celebrações dos 47 anos da independência da Guiné-Bissau.
Cidadãos comuns e várias figuras públicas e analistas políticos questionam como é que se pode ter nomeado duas avenidas em homenagem a pessoas que não têm uma ligação histórica com a Guiné-Bissau.
O analista político Rui Landim critica particularmente que se tenha atribuído a uma avenida o nome de Macky Sall, uma vez que, a seu ver, o chefe de Estado senegalês terá contribuído para a instabilidade recente no país.
"Não há avenida Luís Cabral, Umaro Djaló, Constantino Teixeira, Nino Vieira [todos combatentes da liberdade da pátria] e tantos outros", lembra o analista, que tece duras críticas a quem trouxe "alguém que tem tudo contra a Guiné-Bissau e é pago para ter conspirado e instigado o golpe de Estado no país."O que Macky Sall quer", conclui Rui Landim, é a "dominação da Guiné-Bissau pelo Senegal."
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Sissoco Embaló responde às críticas
Na última sexta-feira (25.09) o Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, apresentou os seus argumentos perante as críticas da sociedade.
"O Presidente Macky Sall, depois de inaugurar a sua avenida, mandou alcatroá-la de imediato. Perguntou à empresa Arezki quanto é, disseram-lhe e mandou iniciar os trabalhos. Mas será que o Presidente Macky Sall, os seus filhos ou os senegaleses é que vão andar lá? Não somos nós?", pergunta o chefe de Estado.
"As pessoas têm de ser inteligentes. E se você [jornalista] quer agora uma avenida, garante-me que vai alcatroá-la, vou atribuir-lhe o seu nome", prometeu Umaro Sissoco Embaló.
Ato do Presidente revela "ilegalidade e incapacidade"
Mas o presidente do Movimento dos Cidadãos Conscientes e Inconformados (MCCI), Sana Canté, reprova os argumentos apresentados pelo chefe de Estado.
"[O ato do Presidente] revela uma dupla combinação entre a ilegalidade e a incapacidade. Ilegalidade por ser autoproclamado e golpista Presidente da República da Guiné-Bissau. O mais chocante é ver que se baseou em quem dá mais, quem tiver dinheiro para investir no país, fica com o país e quem tiver dinheiro para investir na estrada, fica com estrada", critica Sana Canté.
Apesar do tema merecer debate nos órgãos de comunicação social, nem o Governo, nem a Assembleia Nacional Popular (ANP) reagiram à polémica.
Em silêncio estão também os partidos políticos guineenses, que, contactados pela DW África, não se quiseram pronunciar sobre a atribuição dos nomes Macky Sall e Muhammadu Buhari às duas avenidas inauguradas na semana passada.
Os aeroportos dos presidentes em África
São uma espécie de monumento auto-instituído: vários líderes africanos construíram os seus próprios aeroportos em locais remotos. Hoje, são estruturas esquecidas, paralisadas ou dão grandes prejuízos.
Foto: Getty Images/AFP/L. Bonaventure
O aeroporto esquecido de uma capital esquecida
Nos anos 60, o Presidente Félix Houphouët-Boigny decidiu fazer da sua cidade natal, Yamoussoukro, a capital da Costa do Marfim. Construiu avenidas imponentes, uma enorme igreja, vários edifícios e um aeroporto. Tanto a cidade como o Aeroporto Internacional de Yamoussoukro acabaram por cair na insignificância. Hoje em dia, o aeroporto está praticamente abandonado.
Foto: Getty Images/AFP/L. Bonaventure
Perdido na selva
Também Mobuto Sese Seko, ex-Presidente da RDC, se instalou com toda a pompa e circunstância na sua cidade natal, Gbadolite, com três palácios e edifícios representativos. Há também um aeroporto, rodeado por floresta tropical. Não há indústria nem turismo nas redondezas e a capital, Kinshasa, fica a 1400 quilómetros. Mobutu e a mulher gostavam de voar de Gbadolite para Paris – num Concorde alugado.
Foto: Getty Images/AFP/J. Wessels
O ditador com a sua própria pista de aterragem
Mobutu foi também recebido pelo ditador da vizinha República Centro-Africana, Jean-Bedel Bokassa (segundo à direita). Na residência de Bokassa, a cerca de 80 quilómetros de distância, havia também uma pista de aterragem para passageiros. Há muito que Bokassa morreu e a sua pista desintegra-se – tal como os seus palácios.
Foto: Getty Images/AFP/OFF
Boas-vindas a um convidado alemão
Mesmo antes de se tornar um aeroporto internacional - a mando do antigo Presidente Daniel Arap Moi - o aeródromo de Eldoret, no centro-oeste do Quénia, recebia o chanceler Helmut Kohl, em 1987. Eldoret é o centro económico dos Kalenjin – o grupo étnico do Presidente Moi. Apesar do nome, o aeroporto serve apenas para voos domésticos.
Foto: Imago Images/D. Bauer
O aeroporto inviável do ex-Presidente da Nigéria
O ex-Presidente da Nigéria, Umaru Yar'Adua, também converteu o aeroporto da sua cidade natal, Katsina, em aeroporto internacional durante o seu mandato (2007-2010). Mas o projeto preferido do antigo Presidente, que morreu em 2010, não é rentável. O Governo está a ponderar a entrada da autoridade aeronáutica nacional na equipa de gestão do aeroporto de Katsina.
Foto: Getty Images/AFP/P. Utomi Ekpei
Rumo a Chato?
A companhia aérea tanzaniana Precision Air poderá voar em breve para Chato, cidade natal do Presidente John Magufuli. O chefe de Estado quer expandir este aeroporto para impulsionar o turismo. Mas uma comissão parlamentar apela à renovação das infraestruturas já existentes em vez de novos projetos. Apenas 5 dos 58 aeroportos e pistas de aterragem do país contribuem para o PIB, dizem os deputados.