Biafra foi, durante muito tempo, sinónimo de uma guerra sangrenta, em que morreram centenas de milhares de pessoas, entre 1967 e 1970. Cinquenta anos depois, muitos habitantes da região ainda esperam um futuro melhor.
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Seja em garrafas de cerveja, em bandeiras ou em posters nas ruas: no sudeste da Nigéria, o sol nascente está um pouco por todo o lado. Este é o símbolo de um Estado que deixou de existir, a República do Biafra, que declarou a independência há 50 anos. Seguiu-se uma guerra civil sangrenta e, com a derrota dos separatistas, em 1970, falar no Biafra tornou-se tabu.
Mas, décadas depois, já se discute de novo o Biafra nas ruas. Na cidade de Enugu, Kingsley Okah fala apaixonadamente sobre o antigo Estado. O jovem de 27 anos estudou Ciências Políticas e cresceu no território da ex-República – e gostaria que o Biafra fosse independente.
Num país com mais de 185 milhões de habitantes pertencentes a 250 etnias, ele diz que se sente marginalizado, apesar do seu grupo étnico, os Igbo, ser um dos maiores na Nigéria. Okah culpa o Governo de Muhammadu Buhari, um muçulmano do norte: "No atual Governo, não há ninguém do Leste".
"O Biafra é a solução"
O jovem não se sente representado no Executivo e, mais do que isso, vê a composição governamental como ameaça: "Se eles quiserem matar o povo do leste, poderão fazê-lo sem problemas. Temos de lutar pelos nossos direitos. O Biafra é a solução."
Esta posição tem conquistado cada vez mais adeptos nos últimos anos, sobretudo entre os jovens. E ouve-se particularmente nesta altura, 50 anos depois da declaração de independência do Biafra, a 30 de maio de 1967, pelo então governador militar Chukwuemeka Odumegwu Ojukwu, após dois golpes de Estado e graves confrontos étnicos.
Biafra: O sonho de um Estado independente
Nnamdi Kanu tem sido um dos responsáveis pelo reavivar dos debates sobre o Biafra. O líder do movimento dos Povos Indígenas do Biafra (IPOB, da sigla em inglês) foi libertado sob fiança em abril – Kanu esteve mais de um ano na prisão, acusado de conspiração e de pertencer a uma organização criminosa. Organizações de defesa dos direitos humanos, incluindo a Amnistia Internacional, protestaram contra a detenção.
O medo do norte
Kanu encontrou agora refúgio em casa dos pais em Umuahia, no estado vizinho de Abia, e tem recebido inúmeras visitas. "A vida não tem sentido sem o Biafra. Tentámos a Nigéria durante 56 anos, mas não aconteceu nada. Queremos algo novo", afirma em entrevista à DW África. Os seus apoiantes gostam de o ouvir.
Segundo o líder do movimento dos Povos Indígenas do Biafra, hoje em dia, os cristãos do sul têm medo de praticar a sua religião no norte. E, ao nível da economia, a situação não é melhor, diz: "Quem governa a Nigéria são sobretudo os Haússa e os Fulani, do norte. Eles não dão espaço ao desenvolvimento económico."
Críticas
Estas acusações graves contra as duas etnias irritam Mu'asu Said, oriundo de Jigawa e que vive hoje na capital, Abuja.
"Quando se vai para o norte, os Igbo podem fazer os seus negócios de forma pacífica. Ninguém os assedia, nem a nível regional, nem a nível local. Mesmo nas aldeias mais remotas, vivem pacificamente nas suas comunidades. As crianças vão para a escola… não há diferença nenhuma", diz. Para Said, é falso afirmar que os Igbo são marginalizados.
"Luta intelectual"
Apesar das opiniões discordantes, uma coisa é clara para Kingsley Okah: "Não vou pegar em armas para lutar. O que precisamos mais na disputa pelo Biafra é uma luta intelectual. Pode-se despertar as consciências através de artigos em jornais. Quem sente que pode ajudar, pode organizar protestos nas ruas, mas sem recorrer a armas."
Não se sabe ao certo quantas pessoas apoiam realmente o Biafra, e, até agora, ninguém apresentou ideias ou um plano concreto sobre como a República se poderia organizar.
Ogoniland – O dia a dia após o derrame de petróleo
Apesar de gerar receitas, o petróleo também causa desilusão na região de Ogoniland, no Delta do Níger. A pesca tornou-se quase impossível nas águas contaminadas e o ar está poluído pelos gases tóxicos da queima de gás.
Foto: Katrin Gänsler
Pesca ineficaz
A aldeia de Bodo, na Nigéria, sempre viveu da pesca. Mas desde os derrames de petróleo no Delta do Níger, em 2008 e 2009, as redes dos pescadores estão vazias. Quem hoje em dia ainda pretende viver da pesca tem de ir para o mar, o que significa mais horas de trabalho e custos mais elevados.
Foto: Katrin Gänsler
Dependentes da água
Bodo fica na região de Ogoniland, no Delta do Níger, no extremo sudeste do país. Aqui, quase todos os canais do Níger estão contaminados por petróleo. E as pessoas sempre viveram na e com a água. Ainda hoje muitos vilarejos só são acessíveis por barco.
Foto: Katrin Gänsler
Manchas de petróleo por toda a parte
O caso do derrame de petróleo em Bodo e noutras partes de Ogoniland também foi abordado pelo Programa das Nações Unidas para Meio Ambiente (PNUMA). Num relatório publicado em agosto de 2011, o PNUMA recomendou que o governo e as petrolíferas disponibilizem mil milhões de dólares para trabalhos de limpeza. No entanto, as manchas de petróleo, que reluzem na água, continuam até agora.
Foto: Katrin Gänsler
O meio ambiente não tem interesse na Nigéria
Saint Emmah Pii, o chefe da aldeia de Bodo, está zangado. “Estamos todos a morrer aqui. Bebemos água contaminada. Inalamos fumos tóxicos. A culpa é do petróleo.” Fora de Bodo, no entanto, ninguém parece preocupado. “Até ao momento, nem o governo em Abuja nem mesmo as multinacionais se interessaram pelos nossos problemas”, lamenta o chefe da aldeia.
Foto: Katrin Gänsler
Nada funciona sem o ouro negro
Desde o início da produção de petróleo, em 1958, a Nigéria tornou-se no oitavo exportador de petróleo no mundo. O Estado depende fortemente do ouro negro, do qual advém 90% das receitas de exportação. Cerca de 80% dos impostos do país derivam da produção do crude. Oleodutos como estes no estado de Rivers têm, portanto, de ser tolerados.
Foto: Katrin Gänsler
Na sombra das chamas de gás
Em todo o Delta do Níger, chamas como estas aparecem de repente. E não importa se a aldeia mais próxima fica a poucas centenas de metros de distância. Aqui, a queima de gás é oficialmente proibida desde 1984. Porém, 28 anos depois, ninguém se preocupa com o cumprimento da lei.
Foto: Katrin Gänsler
Tão ricos, tão pobres
Furioso, Chukwuma Samuel mostra as chamas de metros de altura com as quais ele e toda a aldeia têm de viver perto da pequena cidade de Egbema. “Olhem para as pessoas aqui. Elas estão indignadas”, diz, apontando para o pequeno mercado em que se encontra. “Estamos a sofrer aqui. Temos de lutar. Para nós, não sobra nada da riqueza do petróleo.”
Foto: Katrin Gänsler
O povo deve decidir
As petrolíferas não gostam de ouvir que não se importam com as pessoas. Portanto, o Grupo Shell anunciou um programa chamado GMoU - "Memorando de Entendimento Global". Os municípios recebem o dinheiro e decidem eles mesmos o que fazer com ele. Na maior cidade do Delta do Níger, Port Harcourt, o Hospital de Obio Cottage foi renovado. Todos os pacientes elogiam o empenho da Shell.
Foto: Katrin Gänsler
Bodo sem qualquer apoio
Contudo, a Bodo não chegou qualquer apoio, critica Kentebe Ebiaridor da organização de defesa ambiental Environmental Rights Action (ERA). E a maior prova disso são as margens sujas de petróleo. "As pessoas estão desiludidas", diz.
Foto: Katrin Gänsler
Petróleo barato do governo
Que a Nigéria é um país produtor de petróleo, os nigerianos só o notam nos preços da gasolina subsidiados pelo Estado. Até o final de 2011, um litro de gasolina custava 65 nairas (32 cêntimos). No início de 2012, o governo acabou com uma parte dos subsídios. Isto causou uma onda de protestos. Atualmente o litro custa 97 nairas (50 cêntimos), bem menos do que em muitos outros países de África.
Foto: Katrin Gänsler
A sonhar com uma pequena loja
Franziska Zabbey nada sabe sobre os preços da gasolina barata. Vive da terra e raramente sai de Bodo. O dinheiro que ganha mal lhe chega para sobreviver. “Se a Shell nos pagar uma indemnização pelo derrame de petróleo, eu poderia abrir uma pequena loja”, espera. Tudo o resto teria pouco futuro em Bodo.
Foto: Katrin Gänsler
Pescadores para sempre
Apesar de ser quase impossível viver da pesca, os barcos de pesca de Bodo são bem preservados. Quando voltarão a poder ser usados como antigamente não se sabe bem. As Nações Unidas estimam que irá demorar entre 25 e 30 anos até Ogoniland ficar limpa do petróleo.