O Ministério Público guineense ordenou o arquivamento do processo aberto na sequência de denúncias do presidente da Liga dos Direitos Humanos em como doentes estavam a morrer por falhas no tratamento de hemodiálise.
Segundo a denúncia de Bubacar Turé, "todos os doentes em tratamento por hemodiálise" no Hospital Nacional Simão Mendes, "praticamente, acabaram por falecer".Foto: Gilberto Fontes
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A informação consta de uma nota de imprensa enviada à agência de notícias Lusa, na qual o Ministério Público da Guiné-Bissau informa que se decidiu pelo arquivamento dos autos por "inexistência de quaisquer outras diligências probatórias com aptidão para a descoberta da verdade".
De acordo com o presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Bubacar Turé, as informações na posse da organização indicavam que "todos os doentes em tratamento por hemodiálise" no Hospital Nacional Simão Mendes, "praticamente, acabaram por falecer".
Turé fez estas declarações no dia 10 de abril passado, em Dacar, Senegal, onde assistia a uma conferência internacional sobre as mulheres e raparigas, no passado mês de abril.
O ativista questionou sobre se as mortes poderiam ter que ver com a falta de preparação técnica dos profissionais colocados no centro de hemodiálise, o primeiro no país.
As autoridades sanitárias, políticas e judiciais consideraram as afirmações de Bubacar Turé como uma denúncia caluniosa.
A Liga Guineense dos Direitos Humanos denunciou, depois, que homens armados do Ministério do Interior teriam vandalizado a casa de Bubacar Turé em Bissau, numa altura em que aquele se encontrava em missão de serviço no interior do país.
O ativista esteve escondido durante alguns dias até se apresentar ao Ministério Público, acompanhado de advogados, no dia 23 de abril, tendo sido ouvido nos autos, na qualidade de denunciante.
O órgão judicial afirma que decidiu encerrar os inquéritos sobre o caso por falta de provas, apesar de várias diligências desencadeadas nesse sentido.
"Apesar de o denunciante se [ter] comprometido, em sede de inquirição, a apresentar, num prazo de três dias, os elementos probatórios que sustentam a sua denúncia, não o fez decorridos mais de noventa dias", refere a nota do Ministério Público.
O centro de hemodiálise entrou em funcionamento em fevereiro deste ano, graças ao pedido do Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, ao reino de Marrocos, que financiou o equipamento.
Carências do principal hospital de Bissau
O Hospital Nacional Simão Mendes é considerado a unidade hospitalar de referência na Guiné-Bissau. Mas falta quase tudo: pessoal especializado, medicamentos básicos, aparelhos de diagnóstico.
Foto: Gilberto Fontes
Crise política deixa hospital a meio gás
Com a instabilidade política agravaram-se as necessidades no principal hospital da Guiné-Bissau e caíram por terra as expectativas da equipa hospitalar que esperava mais atenção por parte das autoridades. A Cruz Vermelha e os Médicos Sem Fronteiras prestam apoio. Mas, mesmo assim, perdem-se muitas vidas por falta de condições básicas de assistência.
Foto: Gilberto Fontes
À espera da hemodiálise...
O país ainda não consegue tratar doentes com insuficiência renal. O hospital tem estas instalações novas para iniciar tratamentos. Só falta a máquina da hemodiálise. Curioso é que o equipamento está no hospital, fechado há anos numa sala, cuja chave está com o Ministério da Saúde, segundo fonte hospitalar. Um nefrologista e vários técnicos fizeram formação em diálise, que ainda não podem aplicar.
Foto: Gilberto Fontes
Enquanto isso a população sofre
Doentes, como esta senhora, só podem receber tratamentos de hemodiálise no Senegal. No entanto, cada sessão chega a custar 150 euros. O que é insustentável para muitos doentes que, normalmente, necessitam de várias sessões semanais. Quando a doença é detetada numa fase inicial, aciona-se a evacuação para Portugal. Mas o processo é moroso. Muitos doentes acabam por falecer por falta de tratamento.
Foto: Gilberto Fontes
Há equipamentos novos parados...
O técnico de radiologia Hécio Norberto Araújo lamenta que este aparelho novo de radiografias esteja praticamente parado. Só faz alguns exames, em casos de urgência. Também o equipamento de mamografia nunca funcionou devido à falta de acessórios, como o chassi e o aparelho de revelação. O hospital militar continua a ser o único no país a fazer mamografias e tomografias, que podem custar 100 euros.
Foto: Gilberto Fontes
E máquinas obsoletas em uso
Na falta de opções, este velho aparelho de raio x continua a ser muito requisitado. Ninguém sabe quantos anos tem o equipamento que funciona com arranjos improvisados de fita-cola. A pequena sala de diagnóstico está desprovida de qualquer proteção contra as radiações. O único avental de proteção está estragado. Os técnicos de radiologia estão diariamente expostos a radiações eletromagnéticas.
Foto: Gilberto Fontes
Sem mãos a medir na pediatria
Esta unidade costuma estar cheia, principalmente na época das chuvas, com o aumento de casos de malária ou paludismo e diarreia nas crianças. Neste serviço com 158 camas, há apenas nove médicos efetivos e quase 40 enfermeiros. Entre o pessoal médico, conta-se um único especializado em pediatria. A falta de um eletrocardiograma é responsável pelo diagnóstico tardio de cardiopatias entre os menores.
Foto: Gilberto Fontes
Nem medicamentos para emergências
Nos cuidados intensivos há apenas um cardiologista. A maioria do pessoal médico são clínicos gerais. Por vezes, em plena situação de paragem cardíaca, falta medicação de urgência que os familiares do doente têm de se apressar em providenciar. A equipa hospitalar quer mais investimento em formação e em condições de trabalho. Só assim pode salvar mais vidas e diminuir a evacuação para o exterior.
Foto: Gilberto Fontes
Faltam lençóis e comida
O Hospital Nacional Simão Mendes tem mais de 500 camas. Mas não tem lençóis que cheguem para fazer a cobertura de todas elas. Devido à falta de pijamas, muitos doentes ficam hospitalizados com a roupa que trazem no corpo. Além disso, não há como providenciar alimentação aos pacientes que, na maior parte das vezes, ficam dependentes da comida que os familiares conseguem fazer chegar.