Viagens de Sissoco ao exterior "sem resultados concretos"
11 de maio de 2021Com as visitas dos Presidentes de Portugal, São Tomé e Príncipe e do Sudão, todas previstas para este mês, 12 chefes de Estado terão visitado a Guiné-Bissau em 15 meses de presidência de Umaro Sissoco Embaló. Marcelo Rebelo de Sousa visita a Guiné-Bissau nos dias 17 e 18 de maio para avaliar o nível da parceria bilateral entre Portugal e a Guiné-Bissau.
O país exerce também uma forte diplomacia de proximidade junto dos seus parceiros sub-regionais nos domínios da migração, luta contra o terrorismo e combate ao crime organizado.
Através do que o próprio chama de "diplomacia agressiva", o chefe de Estado guineense fez mais de 70 viagens ao exterior e menos de cinco ao interior da Guiné-Bissau desde que tomou posse, em fevereiro de 2020.
Em contrapartida, o país recebeu a visita oficial de 18 ministros dos Negócios Estrangeiros e abriu três novas embaixadas, na Turquia, Qatar e Arábia Saudita. Entretanto também abriram embaixadas na Guiné-Bissau - Cabo Verde e Marrocos - e está prevista para breve a abertura das embaixadas da Índia, Turquia e Qatar, segundo um documento oficial do Estado guineense consultado pela DW África.
As viagens do Presidente guineense chamaram mais a atenção por ser em jato privado e em plena pandemia, quando o país se deparava com uma onda de greves na Função Pública. Os críticos dizem que o chefe de Estado deveria visitar também o interior do país para constatar "in loco" a situação em que se encontram as comunidades desfavorecidas.
"Tenho desenvolvido ações diplomáticas no sentido de reaproximar mais a Guiné-Bissau dos seus parceiros, no quadro dos princípios de respeito mútuo, com o propósito de construir um clima de confiança e de credibilidade recíproca entre os nossos países", defendeu o Presidente guineense em março. A sua intenção é "resgatar a soberania e mostrar que não há pequenos Estados" no concerto das nações.
A presidência alega que o chefe de Estado não tem ido ao interior do país devido às medidas restritivas impostas no contexto da pandemia, em cumprimento das recomendações do Alto Comissariado para a Covid-19.
Mas, em entrevista à DW África, o professor e ativista político Sumaila Jaló diz que a tal diplomacia agressiva não está a mudar a vida dos guineenses e assinala que o país está a viver uma grande crise social.
DW África: O que pensa sobre esta "diplomacia agressiva" de Sissoco Embaló?
Sumaila Jaló (SJ): É preciso que os guineenses saibam que, entre as estratégias populistas de Umaro Sissoco Embaló e seu Governo, é usado dinheiro dos impostos do povo da Guiné-Bissau para estas visitas e viagens ao exterior. Não basta que os presidentes de outros países visitem a Guiné-Bissau, assim como não basta que o Presidente guineense visite outros países. É verdade que a diplomacia e a relação entre os Estados e os povos é importante para o desenvolvimento de qualquer país do mundo, mas é preciso haver uma relação concreta entre estas viagens e políticas para o desenvolvimento da Guiné-Bissau.
DW África: Estas viagens não têm impacto direto na melhoria das condições de vida das populações?
SJ: Quando temos um Orçamento Geral com um défice que é financiado pela ajuda externa, com as despesas do Estado a serem financiadas pela ajuda externa e com cada uma destas viagens do Presidente da República a custar milhões aos cofres do Estado, quais são as consequências para a vida dos guineenses? Isso é que nos interessa. O que é que essas cooperações trazem de benéfico para o processo de desenvolvimento do país? Não encontramos neste momento uma resposta para isso.
DW África: Mas estas visitas não mostrarão que o país tem estabilidade e é credível, ajudando a atrair investimento externo?
SJ: Para quem acha que há estabilidade no país, basta olhar para o número de jornalistas sequestrados e espancados em apenas um ano de presidência de Umaro Sissoco Embaló e da [nova] governação. Olhemos também para quantos ativistas e cidadãos comuns foram sequestrados e espancados por polícias e agentes de segurança do Presidente da República. Pensemos também em quantas manifestações pela educação e saúde pública foram dispersadas violentamente, com manifestantes e cidadãos agredidos pelas forças de segurança. Pensemos igualmente nos deputados espancados e sequestrados.
Não estamos num país estável. Estamos num país em que o populismo ganha terreno todos os dias, em que se fala muito, em que se viaja muito e em que se gasta muito dinheiro do erário público, mas na prática não vemos qualquer mudança na vida do povo. As escolas não funcionam, há hospitais sem oxigénio, a Função Pública está paralisada há mais de cinco meses, com salários em atraso. Quando não encontramos essa tal 'diplomacia agressiva' ligada a um plano 'macro' para o desenvolvimento do nosso país, estamos apenas a falar de viagens de turismo. Estamos a falar de viagens em que se gastam milhões e não temos resultados concretos.