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Manifestantes pedem justiça por congolês morto à pauladas

Vivian Mannheimer (Rio de Janeiro)
5 de fevereiro de 2022

Moïse Kabagambe trabalhava em um quiosque na praia e foi espancado até a morte. Imigrantes negros que moram na cidade dizem que sofrem com o racismo.

Brasilien | Demonstration gegen Rassismus
Foto: Vivian Mannheimer/DW

Movimentos pelos direitos dos negros, imigrantes e moradores do Rio de Janeiro foram esse sábado (05.02) à praia da Barra da Tijuca mostrar sua indignação pela morte do congolês Moïse Kabagambe, de 24 anos, assassinado na noite do dia 24 de janeiro no quiosque Tropicália, nessa mesma praia.

Protestos semelhantes também foram realizados ao mesmo tempo em outras cidades brasileiras, como São Paulo e Salvador, na Bahia.

A família de Moïse também estava presente na manifestação. Muito emocionada, a mãe do malogrado, Lotsove Lolo Lavy Ivone, agradeceu o carinho de todos e pediu "justiça até o final”.

Por seu turno, Serge Kabagambe, tio de Moïse disse que os dois jogavam bola no parque de Madureira, perto de onde a família mora e acrescentou que o sobrinho era um ótimo churrasqueiro.

Brutalidade

Um grupo mais exaltado ameaçou destruir o quiosque, mas foi contido pelos outros manifestantes, que pediram um ato pacífico.

A morte de Moïse Kabagambe chocou todo o BrasilFoto: Vivian Mannheimer/DW

Moïse era um trabalhador informal. Servia bebidas na areia da praia em troca de diárias. A família diz que na noite em que foi morto, o congolês tinha ido até o local cobrar o pagamento atrasado. Os investigadores dizem que ele se envolveu em uma confusão com um funcionário de outro quiosque.

As imagens chocantes captadas pelas câmeras de segurança mostram que o congolês foi morto a pauladas por três homens.

Ele foi espancado por 15 minutos e continuou apanhando mesmo já desacordado. Essa semana, a polícia prendeu os três homens identificados pelas câmeras de segurança, mas ainda não esclareceu a motivação do crime.

 A brutalidade do caso chamou a atenção da opinião pública no país e teve repercussão internacional e entre organizações de direitos humanos, como a Anistia Internacional.

O caso também expôs as feridas sobre a forma como os imigrantes são tratados no Brasil.

Moïse chegou ao Brasil, especificamente ao Rio de Janeiro, em 2011 com mais quatro irmãos, fugindo da Guerra e da fome no Congo.

A mãe chegou anos mais tarde, em 2014. A família recebeu ajuda do programa de assistência a refugiados da Cáritas, entidade filantrópica ligada à Igreja Católica, e se estabeleceu na periferia da cidade.

Manifestantes apelam para o fim do racismo Foto: Vivian Mannheimer/DW

No Rio de Janeiro, o Programa de assistência a refugiados e solicitantes de refúgios, o Pares Cáritas, informou que em 2021 atendeu 2.524 pessoas de 71 países, e a maioria dos pedidos de refúgio, 52%, vinha de venezuelanos, 11% de angolanos e em terceiro lugar, correspondendo a 10% dos solicitantes de refúgio estão os congoleses.

No entanto, em 2016, segundo informações da Acnur, a agência da ONU para refugiados, os congoleses correspondiam ao maior grupo entre os refugiados na cidade.

Racismo e o mito do país acolhedor

A fama do Brasil de país acolhedor e miscigenado é refutada pela grande maioria dos imigrantes que moram aqui e pelos movimentos de direitos dos negros.

O haitiano Bob Montinard veio para o Brasil em 2010, logo depois do terremoto em seu país. Após uma passagem pela França, veio para o Brasil, identificou-se com a cultura e resolveu ficar.

"Esse Brasil de hoje não é o país que me acolheu. Eu não reconheço esse Brasil, quero saber quem é esse país que quer matar todo mundo”, lamentou Montinard.

O refugiado entende que, "é preciso acabar com todo esse pacote que inclui racismo, xenofobia e desigualdade social, onde uma pessoa, como Moïse trabalha para ganhar só 100 reais por dia.”

O senagalês Mamour Sop Ndiaye não é um trabalhador informal como Moïse, mas também sente o racismo todos os dias.

Também houve protestos em Berlim contra a morte de Moïse KabagambeFoto: Cristine Ramalho/DW

Mamour Ndiaye é professor de engenharia elétrica no Cefet, Centro Federal de Educação Tecnológica e no ano passado teve que tirar a filha de um colégio tradicional carioca por conta de um caso de racismo, pois, segundo ele, "os colegas de classe achavam que o lugar dela não era lá”.

O senegalês disse que tinha uma falsa imagem do Brasil por conta do futebol, já nos jogos da seleção brasileira via jogadores brancos e negros comemorando juntos.

"Quando cheguei eu era o único negro da minha turma. Assim foi na graduação, no mestrado e no doutorado. Hoje como professor, sinto preconceito por parte dos meus colegas e por parte dos meus alunos. E percebo que aqui no Brasil os crimes contra os negros, cada dia ficam mais violentos”, contou Ndiaye.

Adelia Azevedo, militante do movimento negro e arterapeuta trabalhou em 2018 com refugiados congoleses:

"Trabalhei com pessoas que vieram para o país em busca de paz e gostavam muito do Brasil, como essa família do Moïse, que fugiu de uma desgraça para ter o filho morto aqui. O Brasil não é amigável para os negros nem nunca foi”, lamenta Adelia Azevedo. 

Brasil revoltado com assassinato

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