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Liberdade de imprensaBurkina Faso

Burkina Faso amordaça meios de comunicação social

Kate Hairsine
1 de maio de 2024

A junta militar do Burkina Faso suspendeu mais meios de comunicação, incluindo a DW. Essa repressão acontece numa altura em que a luta contra o terrorismo causa um elevado número de vítimas civis no país.

Num mural em Ouagadougou, Burkina Faso, lê-se "fique vigilante e mobilize-se"
Num mural em Ouagadougou, Burkina Faso, lê-se "fique vigilante e mobilize-se"Foto: AP/picture alliance

O Burkina Faso suspendeu várias outras organizações noticiosas internacionais pela cobertura de um relatório da Human Rights Watch que acusa o exército de matar civis na sua luta contra grupos armados islâmicos.

Os últimos meios de comunicação a serem suspensos incluem a DW, TV5 Monde e Le Monde, bem como o canal britânico The Guardian. A medida segue a suspensão temporária da BBC e da emissora norte-americana Voice of America na semana passada.

"Não estamos realmente surpreendidos com esta escalada porque segue um padrão de repressão e hostilidade contra os meios de comunicação em geral, e em particular os meios de comunicação estrangeiros”, disse Muheeb Saeed, gestor do programa de liberdade de expressão da Media Foundation for West Africa (MFWA).

Desde que a liderança militar do Burkina Faso tomou o poder num golpe de Estado em setembro de 2022 — o segundo nesse ano — suspendeu vários meios de comunicação social, incluindo France 24, Radio France International e Jeune Afrique. Também expulsou dois jornalistas franceses em abril de 2023 e não resta nenhum jornalista estrangeiro naquele país da África Ocidental segundo dados oficiais.

Têm chegado à imprensa vários relatos da violência perpetrada pelas forças da Junta Militar do Burkina FasoFoto: AP/picture alliance

Os média locais também foram um alvo. Por exemplo, a Rádio Omega, uma das estações de rádio mais populares do país, foi retirada do ar no ano passado depois de ter transmitido uma entrevista considerada "insultosa" aos novos líderes militares do vizinho Níger.

Os analistas apresentam várias razões para a repressão da junta à liberdade de imprensa. Um dos principais objetivos é reprimir as críticas sobre a sua incapacidade de conter o terrorismo, dizem.

Burkina Faso lidera o índice de terrorismo

Tal como vários países do Sahel, o Burkina Faso está a lutar para conter grupos terroristas ligados à Al-Qaeda e ao grupo extremista Estado Islâmico.

O Presidente do Burkina Faso, Ibrahim Traoré, capitão do exército, derrubou a junta militar anterior, dizendo que esta não conseguiu conter a violência. Prometendo reprimir a insurgência, promoveu uma maior cooperação com a Rússia e pôs fim a um acordo com os militares franceses que viu essas forças especiais abandonarem o Burkina Faso no início de 2023.

Soldados franceses (nesta foto de 2019) foram convidados a partir em 2023 numa altura em que se viveu um aumento do sentimento anti-francêsFoto: Philippe De Poulpiquet/MAXPPP/dpa/picture alliance

Mas desde que Traoré assumiu o poder, o Burkina Faso subiu para o primeiro lugar no Índice Global de Terrorismo. As mortes devido ao terrorismo aumentaram mais de dois terços em 2023 em comparação com o ano anterior, com quase 2.000 pessoas mortas, de acordo com o índice. A nação da África Ocidental é agora responsável por quase um quarto de todas as mortes terroristas a nível mundial.

"A guerra que está a ser travada contra os insurgentes no Burkina Faso está a ser travada tanto no campo de batalha como também a nível ideológico”, disse Saeed à DW. "A nível ideológico, tem havido muita propaganda que visa colocar todos os cidadãos na linha, por isso qualquer crítica à administração foi recebida com alguma forma de repressão”.

Exército acusado de abusos de direitos

A junta também está a utilizar a repressão dos meios de comunicação social para encobrir violações dos direitos humanos cometidas pelo exército nas suas operações antiterroristas, afirma a Repórteres Sem Fronteiras (RSF).

"Na maioria das vezes, quando tentam combater os grupos terroristas armados, o seu exército regular também comete muitas violações dos direitos humanos e [a junta] não quer que os meios de comunicação independentes revelem estas terríveis violações dos direitos humanos”. disse Sadibou Marong, diretor do escritório da RSF na África Ocidental.

O relatório da Human Rights Watch que desencadeou as últimas suspensões dos meios de comunicação social acusou o exército do Burkina Faso de levar a cabo assassinatos em massa de pelo menos 223 aldeões em fevereiro de 2024.

Massacres semelhantes foram documentados por outras organizações de direitos humanos e meios de comunicação. Sob a junta liderada por Traoré, os assassinatos de civis pelas forças de segurança saltaram de 430 em 2022 para 735 em 2023, de acordo com dados do Armed Conflict Location and Event Data Project, uma organização sem fins lucrativos sediada nos EUA.

Mordaça total

A repressão aos meios de comunicação internacionais tornará ainda mais difícil para os meios de comunicação locais, afirmam tanto os Repórteres Sem Fronteiras como a Media Foundation for West Africa.

Ibrahim Traoré, agora presidente do Burkina Faso, é recebido por apoiantes logo após chegar ao poderFoto: Vincent Bado/REUTERS

"As organizações internacionais de comunicação social são geralmente mais influentes e têm um certo nível de força diplomática”, disse Saeed, da MFWA, à DW. "E assim, se os próprios meios de comunicação internacionais estão a ser atacados, expulsos e suspensos, isso envia claramente um sinal assustador aos meios de comunicação locais para se alinharem ou sofrerem um destino semelhante."

Os jornalistas locais tornaram-se extremamente cautelosos e a autocensura é galopante, dizem tanto Saeed como Marong da RSF, com os meios de comunicação social a utilizarem as declarações oficiais da junta à imprensa como base para as suas reportagens sobre a crise de segurança.

"Os jornalistas preferem esperar pela narrativa oficial, pela declaração oficial à imprensa, vinda do Governo”, disse Marong. "Isto não é jornalismo independente."

Na semana passada, a MFWA notou que pelo menos quatro jornais locais cobriram a mesma história "palavra por palavra”, disse Saeed.

"Isto alimenta a teoria de que o regime militar dita aos meios de comunicação social o que devem escrever e, de facto, os meios de comunicação social nem sequer têm o direito de fazer quaisquer alterações a qualquer comunicado que recebam dos militares, nem mesmo uma vírgula", concluiu.

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