Autoridades temem que o surto de cólera que surgiu após o ciclone Kenneth atinja mais regiões da província de Cabo Delgado. Até agora, a doença já afetou 74 pessoas nos distritos de Mecúfi e Pemba, a capital provincial.
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Desde que o surto foi declarado em Cabo Delgado, no norte de Moçambique, a 1 de maio, o número total de casos registados ascende a 74, de acordo com a mais recente atualização oficial, feita esta segunda-feira (06.05).
Alto Gingone, Paquitequete, Muxara e Cariacó são os bairros de Pemba de onde provém a maioria dos casos. Na cidade estão também internados no Centro de Tratamento de Doenças Diarreicas (CTD) outros 11 pacientes. Segundo as autoridades, até ao momento não há registo de óbitos.
Apesar de o surto se restringir, para já, aos distritos de Pemba e Mecúfi, as autoridades temem que o restabelecimento da circulação rodoviária entre os distritos possa propiciar o alastramento da cólera a mais pontos devido à movimentação das populações.
Setor da saúde em alerta
Por isso, o setor da saúde está em alerta e definiu já um cinturão dos distritos considerados críticos, além de ter colocado equipas em prontidão, anunciou Ussene Isse, diretor nacional da Assistência Médica, que monitoriza a situação em Cabo Delgado.
Cólera pode alastrar-se em Cabo Delgado
"Ibo, Quissanga, Macomia e Metuge são áreas críticas onde pode aparecer a cólera. Já estamos a montar uma estrutura, que é para quando aparecer a cólera estarmos lá e ativar", explicou Ussene Isse, acrescentando que uma equipa de vigilância também está a investigar casos de diarreias.
Além dos quatro distritos classificados como propensos a um eventual surto da cólera, o alerta foi ativado para toda a província. "Aqui na província de Cabo Delgado, a cólera é um problema crónico. Às vezes podemos estar concentrados aqui e depois o caso aparece noutro lado. Ao mínimo sinal de diarreias e vómitos, [as pessoas] tem que correr para o hospital", recomenda Ussene Isse.
A chegada das vacinas contra a cólera à província deverá acontecer dentro de duas semanas. Segundo o diretor nacional da Assistência Médica, no terreno já está a ser tudo preparado para a administração das vacinas.
Assistência em tendas e contentores
O ciclone Kenneth destruiu diversas unidades sanitárias em Cabo Delgado. Neste momento há distritos que estão a assistir os doentes em tendas e contentores improvisados. É o caso da Ilha do Ibo e Quissanga, onde o setor está a instalar hospitais campanha.
"Vamos estender as atividades de reposição dos serviços de saúde com muita urgência para Quissanga, através de hospitais móveis, porque o hospital local foi totalmente destruído, mas também no Ibo", explica António Mapure, secretário permanente provincial de Cabo Delgado.
"Estamos a fazer tudo ao nosso alcance para tornar normal a vida das nossas populações afetadas pelo ciclone, para aliviar o sofrimento", afirma António Mapure, que no terreno conta com o apoio de parceiros como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e os Médicos Sem Fronteiras (MSF), além das equipas de gestão provincial e central.
Ilha do Ibo: de paraíso turístico ao caos
O ciclone Kenneth devastou partes de Moçambique no final de abril. Devido às fortes chuvas, muitas áreas ficaram isoladas, entre as quais, a ilha do Ibo, uma das mais afetadas. A ajuda começa a chegar, mas lentamente.
Foto: DW/A. Kriesch
Destruição maciça
O Ibo, no norte de Moçambique, é o lar de milhares de pessoas e foi também uma das áreas mais afetadas pela passagem do ciclone Kenneth em Moçambique. Quase todas as casas da ilha foram destruídas ou severamente danificadas pelo ciclone.
Foto: DW/A. Kriesch
Casas destruídas, vida em pedaços
"Eu perdi tudo", conta Njamu Shabani à DW África, enquanto pendura os seus lençóis para secar entre os escombros. "Minha geladeira, TV, tudo," enumerou.
Ela e a sua família não sabem o que virá a seguir. "Eu não tenho sequer o que comer. Eu não sei como posso continuar," lamentou.
Foto: DW/A. Kriesch
Abrigos de emergência improvisados
Shabani e sua família agora vivem nesta cabana improvisada. À DW, esta habitante diz esperar que o Governo forneça em breve alguma compensação. O Presidente Filipe Nyusi visitou o Ibo na passada quarta-feira (01.05), mas a chegada da ajuda à ilha tem sido lenta.
Foto: DW/A. Kriesch
Culpa do mau tempo
A ajuda está a chegar muito lentamente ao pequeno aeroporto do Ibo. A entrega de alimentos só começou na quinta-feira (02.05), devido ao mau tempo. Tem chovido todos os dias desde que o ciclone passou pela região, o que muitas vezes impossibilita a deslocação dos voos de socorro da parte continental de Moçambique, que fica apenas a cerca de oito quilómetros da ilha.
Foto: DW/A. Kriesch
Sem plantações não há colheita
O ciclone Kenneth e as fortes chuvas que se seguiram destruíram os campos da ilha. Alguns ainda estão inundados. O Ibo está com sorte - a água está a recuar na ilha, no entanto, o continente moçambicano ainda corre o risco de sofrer mais inundações.
Foto: DW/A. Kriesch
Meios de subsistência destruídos
Desde a passagem do ciclone Kenneth, os 6.000 habitantes da ilha têm que se defender contra a fome. Muitos aqui dependem da pesca, mas o ciclone levou ou destruiu muitos dos seus barcos de pesca. Os manguezais também foram assolados e os peixes expulsos, disseram os pescadores do Ibo.
Foto: DW/A. Kriesch
Consertar barcos danificados
"A tempestade levou o meu barco para longe no mar", disse o pescador Yusuf Abedi. "Acabei por encontrá-lo há dois dias com a ajuda amigos e trouxe-o de volta", revelou. Yusuf disse que está a tentar consertar o barco. "Espero que funcione para que possa ir pescar novamente," acrescentou.
Foto: DW/A. Kriesch
Destino de férias sem turistas
O Hotel Miti Miwiri fica mesmo ao lado da praia. Era considerado um excelente destino de férias, mas foi também afetado, tendo, atualmente, várias mangueiras caídas pela propriedade. Uma palmeira desabou mesmo sobre o seu telhado. "O turismo vai ficar de fora nos próximos meses", disse o proprietário Jörg Salzer à DW África.
Foto: DW/A. Kriesch
Alguma normalidade
Salzer vive na ilha há mais de 10 anos. "Ainda estou um pouco chocado. A minha casa também colapsou. Quase não tenho o que vestir", disse o dono do hotel, acrescentando estar a fazer o seu melhor para transmitir ao seu pessoal que a vida continua. Salzer e a sua equipa conseguiram assistir à semifinal da Liga dos Campeões na quarta-feira (01.05) - um pouco de normalidade na sequência do ciclone.