Há três meses que a falta de combustível cria numerosos constrangimentos na província angolana de Cabinda. Os automobilistas dizem que a "situação está fora de controlo". Multiplicam-se as acusações de corrupção.
Publicidade
Apensar de ser a maior produtora do petróleo em Angola, a província de Cabinda, no norte do país, depara-se com falta de combustível há cerca de três meses. A crise tem criado vários transtornos aos populares, incluindo longas filas nos postos de abastecimento, preços especulativos e falta de transporte.
Os consumidores dizem que ainda aguardam por um pronunciamento da petrolífera estatal Sonangol. Alguns postos da Sonangol e Pumangol, vão sendo abastecidos de forma intermitente. Há várias denúncias anónimas, segundo as quais a quantidade de combustível disponibilizado nesses postos não é suficiente, porque grande parte do produto tem sido levado para as fronteiras para ser vendido aos estrangeiros.
Um taxista lamenta a dificuldade para encontrar gasolina em Cabinda. "Só de saber que estamos numa província de grande descontinuidade do Estado e agora afetado por este problema é triste", disse o taxista, que pediu para não ser identificado.
O motorista profissional pede às entidades competentes que se pronunciem rapidamente, porque a "situação está fora de controlo".
A falta do produto nos postos de abastecimento autorizados está a impedir os taxistas de oferecerem os seus serviços nas principais paragens. Oficialmente, um litro de gasóleo custa 120 kwanzas equivalente (0,16 euro) e a gasolina 160 kwanzas (0,21 euro). Mas o preço por litro no mercado informal atinge os 500 Kwanzas (cerca de 1 euro), segundo relatos dos consumidores.
"É uma vergonha"
Os taxistas queixam-se que nas filas de espera são preteridos a favor de cidadãos com bidões, porque supostamente pagam o direito da mangueira, um valor adicional além do preço normal do combustível.
Publicidade
"Temos constatado que priorizam os terceiros que fazem contrabando de combustíveis", denunciou a automobilista Joseane Lembe.
O que foi secundado por Joel Bumba, outro jovem taxista, que afirmou que comprar combustível "está a ser um caos", porque só vendem às pessoas com bidões.
O sacerdote da diocese de Cabinda, Félix Liberal, não entende como é que um dos pontos mais fortes do petróleo em Angola passa por eatas dificuldades. Segundo Liberal, a situação demonstra que a província foi tomada de assalto por uma elite bem identificada.
"A maneira como se explora e se empobrece Cabinda é uma vergonha. E até o próprio diabo se entristece. Não é possível que os homens sejam capazes de maltratar deste modo um povo assim", disse o sacerdote.
A DW África tentou contactar a direção da Sonangol, mas sem sucesso.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.