Um projeto governamental de reinserção social de famílias carenciadas em Cabinda previa a entrega de habitações condignas. Mas em casas para cinco pessoas vivem até três famílias, algumas com membros deficientes físicos.
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Em 2019, cerca de 30 famílias que viviam no bairro Povo Grande, em Cabinda, foram cadastradas no âmbito do Projeto Habitacional Social gizado pelo Governo provincial em parceria com o Ministério da Reinserção Social. As famílias residiam em casas erguidas pela petrolífera Chevron para pessoas com deficiência.
Porém, segundo informações a que a DW África teve acesso, as casas construídas pela Chevron em Povo Grande estavam no terreno de uma outra empresa. As famílias foram então obrigadas a abandonar as residências. Diante do impasse, segundo o presidente da Associação dos Deficientes Físicos unidos de Cabinda, João Baptista Muanda, o Governo da província prometeu um realojamento digno a todos e sugeriu um armazém público como abrigo provisório.
Crianças não vão à escola
Passado dois anos, o Governo de Cabinda alojou as famílias em onze residências. Segundo Muamba, a indignação da comunidade persiste porque há situações em que três famílias estão a ser abrigadas em casas projetadas para receber apenas cinco pessoas. Algumas famílias têm integrantes deficientes físicos, que exigem atenção e cuidado especiais. Muamba diz que falta o básico para a sobrevivência das pessoas. "Somos todos humanos, por sermos homens, há quem vai aguentar os hábitos do outro, mas há que não vai", disse referindo-se à situação de sobrelotação das habitações.
Muanda adianta que alguns alunos da comunidade não frequentam escolas por falta de documentos básicos, que deveriam ser providenciados pelo Ministério da Assistência e Reinserção Social (MINARS). Garante que os documentos foram solicitados a partir de 2019, em vão.
"Algumas crianças estudam, mas outras por falta da documentação, no caso a cédula, não estudam. Nós já fizemos vários pedidos ao MINARS. Prometeram que iriam ter com a delegação da justiça a fim de enviar os seus homens, mas até agora nada. Aqui estão quinze crianças fora do sistema do ensino", explicou.
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Governo local promete solução
Outro morador da comunidade do Zóngolo, Feliciano Toco, apela para que o governo provincial apoie as famílias com formação e equipamentos profissionais, como máquinas de costuras e instrumentos de carpintaria e mecânica, para o trabalho diário: "Pedimos para que nos ajudem porque necessitamos bastante. Não temos mecanismos para encontrar o material que nos possa auxiliar".
A administradora de Cabinda, Berta Marciano, não teceu muitos comentários a respeito do caso das famílias do Zóngolo mas garantiu que está ciente da situação. "A administração local tomou boa nota e nos próximos dias mandaremos para lá uma equipa para resolver o problema dos registos", adiantou.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.