Em conversa com a DW África, no lançamento do seu mais recente livro, Raul Tati não comenta as nomeações da sua mulher e do Padre Congo para o governo provincial. Já Raul Danda fala em "orientações" do Governo do MPLA.
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O deputado independente apoiado pela bancada parlamentar da UNITA, Raul Tati, considera que o sentimento "autonomista em Cabinda está cada vez mais forte e resiliente". Para Raul Tati, a província que produz o petróleo de Angola continua a registar um conflito que classifica como um "passivo da descolonização" que está a arrastar Cabinda.
"Foram cometidos erros atrás de erros para abafar o problema", diz Raul Tati, afirmando que a região precisa de soluções com urgência, tendo em conta a pressão que os cabindenses tem estado a fazer.
O deputado - que é uma das vozes críticas do Governo do MPLA - publicou esta sexta-feira, 23 de fevereiro, o livro "Cabinda - Órfã da descolonização do Ultramar Português".
Em conversa com a DW África, o autor afirma que a obra traz cenários, mais do que soluções. "No ponto de vista da ciência, não traz já uma solução fabricada por mim. No entanto, através das minhas análises, apresento alguns cenários que podem ajudar aqueles que são os decisores políticos a encontrarem uma solução para Cabinda", sublinha.
Sem comentários
Recentemente, o ativista e ex-padre católico Jorge Casimiro Congo assumiu as funções de secretário provincial da Educação, Ciência e Tecnologia de Cabinda, depois de ser nomeado pelo governador Eugénio Laborinho. Uma decisão que gerou críticas em vários sectores da sociedade, que acusam o Padre Congo de estar a deixar de lado a sua luta pela independência de Cabinda.
Questionado sobre o assunto, Raul Tati - cuja esposa Maria Carlota Ngombe Victor Tati está agora a dirigir a secretaria provincial da Saúde no governo do MPLA - não comenta: "Prefiro não fazer críticas nem abençoar. Ela é quem deve falar por si”.
Raul Danda: Quando o Governo quiser, fará algo por Cabinda
Já o vice-presidente da UNITA, Raul Danda, que fez a apresentação do livro de Raul Tati,considera que a decisão "seguramente, não terá sido apenas do governador, que deverá ter recebido uma orientação do topo, do Governo do MPLA".
"As razões, não sei. E só o Governo do MPLA poderá responder”, sublinha.
Raul Danda reitera que além das questões "da absorção de algumas pessoas para o Governo ou a solução das prisões e dos tiros”, não viu "mais nada” da parte do Governo em relação a Cabinda. "Quando o Governo quiser fazer alguma coisa em Cabinda, para Cabinda, por Cabinda, há de fazer e nem precisa de publicitar. Desde 1975, julgo que as promessas já não colhem", diz Raul Danda.
O Orçamento Geral do Estado aprovado a 14 de fevereiro, na Assembleia Nacional, e a dotação orçamental para a Cabinda, que produz o maior suporte financeiro de Angola, foi, mais uma vez, irrisório, segundo os deputados Raul Danda e Raul Tati.
"O petróleo de Cabinda parece que nasce na Cidade Alta e morre na Cidade Alta. Uma zona como aquela, que produz, em qualquer parte do mundo, devia merecer uma atenção”, considera o vice-presidente da UNITA.
"É muita pena, porque o tratamento que o governo do MPLA dá a Cabinda é pior que o tratamento que os portugueses davam à Cabinda. E os portugueses é que eram os colonos”, ironiza.
Promessas desmentidas
Já o ex-padre católico, hoje deputado do maior partido da oposição em Angola, Raul Tati, afirma que Cabinda está em décimo sexto lugar na distribuição do orçamento para as províncias.
"Isto vem desmentir as promessas do presidente João Lourenço, em novembro, quando visitou Cabinda, quando realizou a reunião da Comissão Económica do Executivo”, acusa.
"O Presidente disse que ia fazer de Cabinda um caso particular, e o próprio novo governador disse que devia haver um aumento financeiro para Cabinda e Cabinda nunca precisou tanto desse dinheiro. Infelizmente, o Orçamento do Estado, que foi proposta do próprio Executivo, não deu a dotação financeira robusta necessária para a província. E isso contraria as promessas do Presidente”, conclui Raul Tati.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.