Aprovação do envio de forças da SADC e equipamento militar para Cabo Delgado é o que se espera da cimeira regional desta quinta-feira. Mas a discórdia poderá dominar o encontro quando o tema for o comando operacional.
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Depois de meses de discussões sem resultados, finalmente uma proposta concreta da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) para apoiar Moçambique a combater os terroristas no norte do país deve estar em cima da mesa do grupo esta quinta-feira (29.04). A missão técnica de avaliação da organização deverá propôr o envio de cerca de 3.000 militares e também de dois navios de patrulha, um submarino, um avião de vigilância marítima, seis helicópteros, dois drones e quatro aviões de transporte.
Com o aval de Moçambique e da SADC, a ativista política e social Quitéria Guirengane espera que a proposta seja carimbada na cimeira. "A ser considerada a proposta, para nós é um passo importante no combate ao terrorismo. É uma decisão acertada e importante porque apesar das suas limitações olha para dimensões diferentes: militar, de inteligência e da assistência humanitária, [esta última] não na profundidade que esperamos, mas provavelmente é uma fase inicial", considera.
Comando militar: o calcanhar de Aquiles
Tudo consensual até aqui. Mas quando o tema é comando militar e soberania relativamente às forças externas, o campo para a divergência pode ser vasto. "O envolvimento de tropas estrangeiras em Moçambique tem de ser feito na base de elas aceitarem que o comando das operações é moçambicano", alerta o especialista em assuntos africanos Fernando Cardoso.
"Uma força multilateral não tem esses princípios de atuação. Se avançar com uma força dessas, quer seja da ONU quer seja da SADC, ou mesmo uma coligação internacional, não estou a ver nenhum país que contribua com tropas que aceite as suas forças militares sejam comandadas por outras forças militares", sublinha.
Desse modo, a ativista política e social moçambicana Quitéria Guirengane antevê que este venha a ser o calcanhar de Aquiles da cimeira da África Austral: "Esta será sem dúvida a decisão mais polémica desta decisão e que vai levantar debate aceso ao nível da cimeira porque Moçambique sempre mostrou resistência a uma intervenção externa. Sempre deixou claro que da UA [União Africana], da SADC espera apenas apoio em termos de formação, equipamento e de serviços de inteligência."
Uma das questões colocadas, segundo a ativista, "é que Moçambique devia ter o comando da intervenção, uma posição que tem os seus prós e contras. Moçambique já teve no passado intervenções militares externas. É preciso garantir que Moçambique continua a ter o controle, mínimo que seja, sobre o que está a acontecer no teatro operacional. Há que haver bom senso por parte da SADC para assegurar que esta força conjunta esteja consciente que está a atuar num território soberano."
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Riscos assombram sonhos de paz
De qualquer modo, a aprovação do apoio deverá fazer renascer as esperanças dos moçambicanos de um retorno aos dias de paz, uma vez que as forças moçambicanas mostram-se incapazes, sozinhas, de vencer o terrorismo que se torna a cada dia mais sofisticado.
Contudo, é necessário mais do que mãos e balas para disparar para cantar vitória. A experiência em combater o terrorismo não é um forte das forças da SADC e, por isso, já se advinham alguns riscos, segundo o investigador da ONG Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), Adriano Nuvunga:
"Não somente isso, olhe para a região do Sahel [palco de ataques terroristas], o apoio militar tem resvalado em situações em que essas armas caíram em mãos erradas e exacerbarem o conflito".
Terrorismo em Cabo Delgado: As marcas da destruição e a crise humanitária
Edifícios vandalizados, presença de militares nas ruas e promessas de soluções por parte de políticos contrastam com a tentativa das populações de levar a vida adiante.
Foto: Roberto Paquete/DW
Infraestruturas vandalizadas
O conflito armado em Cabo Delgado deixou um número de infraestruturas destruídas na província nortenha de Moçambique. Em Macomia, os insurgentes não pouparam nem a Direção Nacional de Identificação Civil. Os danos no prédio do órgão deixaram milhares de pessoas sem documentos. E carro da polícia incendiado.
Foto: Roberto Paquete/DW
Feridas abertas até na sede da Polícia
O edifício da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Macomia ainda carrega as marcas de um ataque em 2020. O tanzaniano Abu Yasir Hassan – também conhecido como Yasser Hassan e Abur Qasim - é reconhecido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos e pelo Governo moçambicano como líder do Estado Islâmico em Cabo Delgado. Não está claro se o grupo é responsável pelos ataques na província.
Foto: Roberto Paquete/DW
"Eliminar todo o tipo de ameaça"
Joaquim Rivas Mangrasse (à esquerda) foi empossado chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas a 16 e março. "É missão das Forças Armadas eliminar todo o tipo de ameaça à nossa soberania, incluindo o terrorismo e os seus mentores, que não devem ter sossego e devem se arrepender de ter ousado atacar Moçambique", declarou o Presidente Filipe Nyusi (centro) na cerimónia de posse, em Maputo.
Foto: Roberto Paquete/DW
Missões constantes para conter os terroristas
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambique preparam-se para mais uma missão contra terroristas em Palma. A vila foi alvo de ataques, esta quarta-feira (24.03), segundo fontes ouvidas pela agência Lusa e segundo a imprensa moçambicana. Neste mesmo dia, as autoridades moçambicanas e a petrolífera Total anunciaram, para abril, o retorno das obras do projeto de gás, suspensas desde dezembro.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender o gás natural da península de Afungi
A península de Afungi, distrito de Palma, foi designada como área de segurança especial pelo Governo de Moçambique para proteger o projeto de exploração de gás da Total. O controlo é feito pelas forças de segurança designadas pelos ministérios da Defesa e do Interior. Esta quinta-feira (25.03), o Ministério da Defesa confirmou o ataque junto ao projeto de gás, na quarta-feira (24.03).
Foto: Roberto Paquete/DW
Proteger os deslocados
Soldados das FADM protegem um campo para os desolocados internos na vila de Palma. A violência armada está a provocar uma crise humanitária que já resultou em quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Apoiar os deslocados
De acordo com as agências humanitárias, mais de 90% dos deslocados estão hospedados "com familiares e amigos". Muitos refugiaram-se em Palma. Com as estradas bloqueadas pelos insurgentes em fevereiro e março deste ano, faltaram alimentos. A ajuda chegou de navio.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender a própria comunidade
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambqiue estão presentes também no distrito de Mueda. Entretanto, cansados de sofrer nas mãos dos teroristas, antigos militares decidiram proteger eles mesmos a sua comunidade e formaram uma milícia chamada "força local".
Foto: Roberto Paquete/DW
Levar a vida adiante
No mercado no centro da vida de Palma, a população tenta seguir com a vida normal quando a situação está calma. Apesar da ameaça constante imposta pela possibilidade de um novo ataque, quando "a poeira abaixa", a normalidade parece regressar pelo menos momentaneamente...
Foto: Roberto Paquete/DW
Aprender a ter esperança com as crianças
Apesar de todo o caos que se instalou um pouco por todo o lado em Cabo Delgado, a esperança por um vida normal continua entre as poulações. Na imagem, crianças de famílias deslocadas que deixaram as suas casas, fugindo dos terroristas, e foram para a cidade de Pemba. Vivem no bairro de Paquitequete e sonham com um futuro próspero, sem ter de depender da ajuda humanitária e longe da violência.