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Cabo Delgado: Direitos humanos no centro das preocupações

29 de julho de 2021

Académicos e políticos estão reticentes com a presença de uma força multinacional no norte de Moçambique. Temem os efeitos na comunidade local e frisam que os direitos humanos devem estar no centro das prioridades. 

Foto: Roberto Paquete/DW

Políticos, académicos e sociedade civil querem saber qual é o plano da força multinacional de combate ao terrorismo que partirá para Cabo Delgado, norte de Moçambique. No terreno, segundo alguns analistas, há fatores que podem facilitar a violação dos direitos humanos - como o eventual fraco conhecimento sobre tradições, práticas culturais e idiomas.

Luís Bitone, presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos de Moçambique, teme falhas de comunicação entre a força multinacional e a população local. "Porque, se esta comunicação falhar, vamos começar a ter comportamentos de intolerância entre as duas partes", alerta.

Luís Bitone, presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos de MoçambiqueFoto: Romeu da Silva/DW

"Há que tomar medidas para que a comunicação não seja um obstáculo para a boa realização desta missão", advertiu ainda Luís Bitone durante uma mesa redonda em Maputo, Moçambique, esta quinta-feira (29.07), que juntou políticos, académicos e sociedade civil a convite do Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD).

Risco de assédio e violação

Luís Bitone teme que os direitos humanos das crianças e mulheres sejam sistematicamente violados. "Estamos a falar de uma força que ainda não tem tempo definido para a sua estadia cá. Estamos a falar de uma força que na sua maioria é constituída por homens, e isto nas comunidades pode causar problemas de assédio e violação sexual", acrescenta.

Por outro lado, o diretor executivo do IMD, Hermenegildo Munjovo, enfatiza a necessidade de uma coabitação pacífica entre a força multinacional e as comunidades locais.

"Nós percebemos que a violação desses elementos que nós aqui elencamos pode trazer um ambiente hostil para as comunidades, um ambiente de rejeição em relação às tropas. Nós sentimos que é necessário entrarmos na dianteira, levantarmos esses aspetos de risco para reforçarmos também a capacidade desses intervenientes", referiu.

Pedro Guiliche, membro da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO)Foto: Romeu da Silva/DW

Pedro Guiliche, da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO, no poder), sugere a utilização de uma plataforma de diálogo, cujo objetivo é defender os direitos humanos.

"Já existe o estabelecimento de uma plataforma de diálogo que conta com a participação do setor da defesa nacional e do Ministério da Justiça, conta também com as organizações da sociedade civil e do setor privado. É uma plataforma tripartida que envolve também as comunidades", descreve.

Risco de mais refugiados

Para a académica Egna Sidumo, uma das prováveis consequências da presença militar estrangeira em Cabo Delgado é o "alastramento do conflito a outras províncias".

"É uma possibilidade de que devemos ser conscientes. A outra é o número crescente de deslocados que vai crescendo à medida que os combates aumentarem", acrescenta. "Teremos muitos mais deslocados e haverá necessidade de haver maior assistência humanitária", alerta.

Mesa redonda em Maputo sobre o conflito em Cabo DelgadoFoto: Romeu da Silva/DW

A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o maior partido da oposição, critica a forma como as forças estrangeiras foram chamadas a atuar em Moçambique, sem consultar o Parlamento.

"Se nós temos forças estrangeiras no país sem a mesma perspetiva, sem as mesmas obrigações, corremos o risco de ver direitos dos cidadãos violados e postos em causa por essas forças externas", teme o deputado da RENAMO José Manteigas.

Já o deputado Renato Muelegue, do segundo maior partido da oposição, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), diz que a população de Cabo Delgado não sabe como vai lidar com as forças estrangeiras porque a sua presença não foi comunicada.

"Ficamos preocupados quando a notícia da presença de forças estrangerias vem de fora para dentro. Há uma clara demonstração que nós, com o Presidente Nyusi, estamos num ciclo de governação mais fechado, que acredita que deve descartar outras forças de soberania", frisou o opositor.

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