Moçambique: Papa apoia deslocados com 100 mil euros
Lusa
6 de dezembro de 2020
O Papa Francisco doou 100 mil euros para apoiar deslocados da violência, no norte de Moçambique. O dinheiro servirá para erguer dois postos de saúde, que dentro de dois a três meses deverão começar a atender deslocados.
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Em declarações à agência Lusa, o bispo de Pemba, Luiz Fernando Lisboa, disse que num gesto de caridade pastoral, "o Papa Francisco ofereceu 100 mil euros para podermos aplicar no atendimento aos deslocados", detalhando ser um gesto frequente do líder da igreja católica face a situações complicadas em todo o mundo.
Segundo Luiz Fernando Lisboa, após algumas conversas a nível local, concluiu-se que o donativo devia servir para construir "dois postos de saúde, um em Chiúre, o distrito mais populoso de Cabo Delgado, e outro em Montepuez", sudoeste da província, longe dos ataques de rebeldes e um dos locais seguros que os deslocados em fuga tentam alcançar.
Após perderem tudo, sujeitos à fome e a longos dias de fuga no mato, os cuidados de saúde estão entre as principais necessidades das famílias que fogem da guerra - sendo metade crianças.
"Com certeza, como homenagem, vamos dar o nome de Papa Francisco" aos novos postos de saúde, referiu Luiz Fernando Lisboa, explicando que já há desenho e orçamento para brevemente começar a construção.
Tudo apostos para o início das obras
Dentro de dois a três meses as duas unidades deverão começar a atender deslocados.
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O bispo de Pemba considera importante o apoio de figuras mobilizadoras como o Papa Francisco para que mais doações possam chegar a Cabo Delgado, onde persiste um défice de ajuda humanitária face à dimensão da crise.
"Se a guerra terminasse hoje, íamos precisar ainda de vários anos para reconstruir" o tecido social da província, destacou.
Francisco tem mostrado proximidade com o drama que se vive no norte de Moçambique "desde há muitos meses" e mais explicitamente "no dia de Páscoa, em que falou da crise humanitária".
Depois de o Papa começar a falar de Cabo Delgado "houve uma maior abertura por parte de muitos grupos, organizações e inclusive de vários países. Acredito que a figura dele, muito emblemática, forte, tenha dado essa ajuda para tornar esta crise não apenas nossa, de Cabo Delgado, mas uma crise em que o mundo todo tem de ser responsável", detalhou o bispo.
Cabo Delgado precisa de mais apoios
"Todos somos irmãos, somos corresponsáveis uns pelos outros", acrescentou.
O Programa Alimentar Mundial (PAM) anunciou em novembro que teria de reduzir o apoio alimentar devido ao subfinanciamento da sua atividade.
Luiz Fernando Lisboa destaca esse alerta como um sinal da necessidade de "intensificar a campanha" de apoio a Cabo Delgado, "no sentido de se conseguirem mais apoios".
A violência armada em Cabo Delgado, norte de Moçambique, está a provocar uma crise humanitária com cerca de duas mil mortes e 500 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos, concentrando-se sobretudo na capital provincial, Pemba.
A província onde avança o maior investimento privado de África, para exploração de gás natural, está desde há três anos sob ataque de insurgentes e algumas das incursões passaram a ser reivindicadas pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico desde 2019.
Exposição: "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado"
A Galeria do Núcleo de Arte, em Maputo, inaugurou uma exposição coletiva de artes plásticas inspirada no conflito de Cabo Delgado. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas dos ataques na província.
Foto: DW
Artistas plásticos aderiram à iniciativa
Os artistas que participaram nesta exposição procuraram se expressar através de obras de pintura, escultura ou cerâmica. A exposição inaugurada a 20 de novembro foi organizada pela "Nós Arte" e estará aberta ao público em geral até 10 de dezembro de 2020. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas do conflito em Cabo Delgado.
Foto: DW
Apoio às vítimas de Cabo Delgado
"O nosso intuito é direcionar o que vamos render de cada obra, 50% vai para as necessidades que há em Cabo Delgado e as necessidades são muitas neste momento. Vamos tentar delinear as prioridades: máscaras, desinfetantes, material de higiene para as senhoras, fraldas para as crianças, capulanas, arroz e feijão", esclarece o artista plástico "Chicken", promotor da iniciativa.
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Sensibilização social
"Chicken", o coordenador do Projeto "Nós Arte", explicou que o propósito desta mostra é converter as estatísticas de mortes e refugiados em estética. A expetativa é atingir o âmago da sensibilidade social para que se questione a violência e se solidarize com os moçambicanos vítimas do terrorismo.
Foto: DW
Artistas de Cabo Delgado
"Quando ligamos os noticiários, vemos o que está a acontecer: é a pandemia [da Covid-19], a guerra, a cólera, a malária... Cabo Delgado está a ser afetado por essas coisas", alertou "Chicken" que, como os outros artistas, é de lá oriundo: "O meu sentimento é de muita tristeza porque infelizmente tenho visto amigos e familiares a viverem momentos dramáticos." Obra na foto de Júlia.
Foto: DW
"Esperança da Província" de João Paulo Qhea
"Eu preferi que cada um de nós representasse como se sente no momento no coração e como está de espírito. Não podemos também estar a representar a guerra enquanto queremos paz. Então, cada artista trouxe aquilo que tem e aquilo que sentiu e se inspirou para fazer a sua obra. Não é linear", explicou "Chicken".
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"Artimisia" de Sandra Pizura
Esta pintura de Sandra Pizura representa um grito de silêncio de qualquer coisa como fúria, vingança, inconsciência moral, guerra. André Macie, João Fornasini e Julia são outros dos artistas que participam na exposição "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado".
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"O Jardim da vida" de Samuel Djive
Samuel Djive pretendeu trazer uma ideia daquilo que é o paraíso: "Se o paraíso é um espaço onde temos o bem estar, temos a paz, o amor, temos um progresso, temos uma construção positiva, então é isso que nós queremos para Moçambique. É o que eu quero para Moçambique, um país onde os meus netos e bisnetos se possam sentir orgulhosos de serem moçambicanos", comentou.
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Uma conclusão
Samuel Djive acrescentou que "a mensagem é tentar fazer com que as pessoas tenham a capacidade de dialogar sempre na busca de soluções. Nós, como artistas, faremos a nossa parte, mas existem entidades que são responsáveis por isso. Talvez possamos criar um movimento em que criemos também uma reflexão por parte das entidades responsáveis pela segurança e governação do país."