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Projeto de gás pode não retomar em 2023, alerta consultora

Nelson Camuto (São Paulo)
26 de maio de 2022

Em entrevista à DW África, a pesquisadora Fátima Mimbire considera que este atraso "afeta toda uma perspetiva de crescimento a longo prazo que o país tem desenhado para si", porque não pode receber as receitas.

Força Local em Cabo Delgado
Foto: DW

A consultora Eurasia considera que é improvável que as companhias energéticas internacionais voltem a recomeçar os trabalhos no norte de Moçambique nos próximos 12 meses, devido à insegurança persistente e reorganização dos terroristas.

"O potencial para o Estado Islâmico providenciar financiamento e recursos aos insurgentes e a possível chegada de reforços da Tanzânia vai provavelmente fortalecer a insurgência, tornando o recomeço do projeto de exploração de gás natural liquefeito nos próximos 12 anos improvável", lê-se num comentário aos principais acontecimentos em várias economias africanas, a que a agência Lusa teve acesso.

Em entrevista à DW África, Fátima Mimbire, investigadora e ativista, diz que Moçambique pode "aproveitar" o conflito na Ucrânia para exportar mais gás natural para a Europa.

DW África: Estão reunidas as condições necessárias para recomeçarem os trabalhos nas petrolíferas em Moçambique?

Fátima Mimbire (FM): Eu penso que não estão ainda criadas as condições para iniciarem até 2023. A razão pela qual as empresas saíram foi a ausência de segurança naquela região causada pelos terroristas. Obviamente que uma das condições ou a condição principal para eles retornarem será a estabilidade. Ter condições criadas significa termos uma situação de estabilidade generalizada na província de Cabo Delgado e, em particular, naquele distrito de Palma, onde o projeto está localizado e não apenas ali na península de Afunge, naquele perímetro dos vinte e cinco mil hectares ou dos sete mil hectares. Se não for assim, o risco das comunidades tenderem a invadir a área de concessão, por ser mais segura, vai ser alta e isso também desestabiliza ou cria uma situação de instabilidade social. 

Fátima Mimbire, ativista e investigadora moçambicanaFoto: Privat

DW África: Que impactos é que o regresso aos trabalhos nas petrolíferas traz a Moçambique?

FM: Moçambique fez toda a sua projeção de receitas e de crescimento a longo prazo a contar com as receitas provenientes dos hidrocarbonetos, em particular, da Bacia do Rovuma. Estes atrasos têm implicações significativas porque o Estado não vai receber receitas que estava a contar receber. Uma das questões que eu acho que é importantíssima fazer neste momento, é o governo olhar para o contexto, para os seus dados, e refazer esses dados, de modo a termos uma situação mais realista. É preciso relembrar que nós estamos a idealizar a criação de um fundo soberano que deverá ser financiado por essas receitas. Como temos estado a acompanhar, a nível do mercado internacional o preço dos produtos tem estado a aumentar, então os materiais que são necessários para a indústria obviamente que também estão a aumentar. E ao aumentar esta estrutura de custos, existem implicações contra aquilo que são as receitas que o Estado prevê.

DW África: Moçambique depende muito das receitas de gás natural. Como é que o país se vai financiar agora?

FM: Como se vai financiar agora, penso que vai ser na base de como tem estado a financiar-se. É preciso relembrar que os projetos da Bacia do Rovuma ainda não começaram efetivamente a gerar receitas para o Estado porque ainda não estão na fase de produção. Neste momento, o governo financia-se através dos recursos minerais e hidrocarbonetos, tanto do carvão, das areias pesadas, dos rubis, um pouco dos grafites e também do gás natural que é explorado na província de Inhambane. A questão do atraso dos projetos da Bacia do Rovuma é que afetam toda uma perspectiva de crescimento a longo prazo que o país tem desenhado para si.  

DW África: Com a guerra na Ucrânia, a Europa procura alternativas à fonte de energia russa. Poderá isto significar que os trabalhos nas petrolíferas, por parte das companhias energéticas internacionais, poderão retornar ainda este ano?

FM: Podem até retomar este ano. Mas o que é preciso saber é que existe uma diferença entre infraestruturas de exploração ou de produção de Gás Natural Liquefeito (LNG) e infraestruturas, por exemplo, de extração de petróleo. Se se tratasse de petróleo descoberto na Bacia do Rovuma nós já estaríamos a extrair nessa fase, no entanto trata-se de gás natural que está localizado em águas ultra profundas e cujos mercados estão muito distantes de onde se localizam as reservas. Se estamos a pensar aproveitar as oportunidades que a crise da Ucrânia e da Rússia nos oferecem, então é importante que saibamos a quantas é que nós estamos a andar em termos das infraestruturas. Por aquilo que eu sei, ainda falta muito para podermos começar a produzir, pelo menos em relação ao projeto Coral Sul e o projeto Mamba.

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