Administrador de Quissanga, em Cabo Delgado, afirma que "terroristas deitaram abaixo todas as infraestruturas" do Estado, não havendo uma única em condições de funcionamento no distrito.
Ataque ao posto policial de Macomia, em Cabo Delgado, março de 2021 [Foto ilustrativa]Foto: Roberto Paquete/DW
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"O distrito não tem sequer uma infraestrutura para funcionar. Não tem", disse Sidónio Lindo aos jornalistas, em Pemba, à margem da IV sessão do Observatório de Desenvolvimento de Cabo Delgado, tendo lamentado a atual situação vivida no distrito.
"Os terroristas deitaram abaixo todas as infraestruturas (...) e isto impacta negativamente no funcionamento da administração pública no distrito. E como consequência estamos a trabalhar na cidade de Pembahá sensivelmente um ano. Mas os esforços estão a ser desenvolvidos na perspetiva de voltarmos a breve trecho, mesmo que seja com base em tendas", apontou.
O objetivo passa por tentar reabilitar algum espaço para progressivamente ter os serviços do Estado a funcionar de novo no distrito: "É esta a aposta que nós temos este ano para ver se conseguimos, pelo menos, reabilitar uma infraestrutura, para voltarmos a ter o distrito sob controlo. Sobretudo, para a retoma da máquina administrativa".
Sidónio Lindo garante que até já contactou o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para tentar ter contentores no distrito, que permitam instalar alguns serviços do Estado.
Como então? Luta antiterrorismo em Cabo Delgado corre bem?
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Só em 2024, pelo menos 349 pessoas morreram em ataques de grupos extremistas islâmicos no norte de Moçambique, um aumento de 36% face ao ano anterior, segundo estudo divulgado pelo Centro de Estudos Estratégicos de África (ACSS), uma instituição académica do Departamento de Defesa do Governo norte-americano.
Duas aldeias abandonadas
Atualmente, explicou o administrador de Quissanga, há apenas duas aldeias totalmente abandonadas, em ambos os casos pela proximidade ao vizinho distrito de Macomia, como é o caso de Namaluco.
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"É o local de entrada dos terroristas quando saem do vizinho distrito de Macomia. Então é uma aldeia que não temos nenhum habitante. E depois também temos outra aldeia próxima também a Namaluco, que também não temos lá nenhum habitante por força da movimentação de terroristas exatamente naqueles dois locais. E por ser próximo ao limite entre Macomia e Quissanga", detalhou.
Garantiu que os responsáveis e trabalhadores do Estado têm estado no terreno, mas deslocando-se a Quissanga "em equipas".
"Vamos lá, trabalhamos e voltamos [para Pemba]. Tanto é que as organizações governamentais, nacionais e estrangeiras também estão a operar em toda a dimensão territorial do nosso distrito. O que estamos à espera é da criação de condições, sobretudo na reabilitação de infraestruturas", disse.
A expectativa é avançar com algumas infraestruturas este ano, face à melhoria das condições de segurança.
"Pensamos que este ano, com o mudar da situação, provavelmente poderemos retomar a reconstrução das infraestruturas do Estado", concluiu.
O rasto do terrorismo em Macomia teima em não desaparecer
O rasto do terrorismo em Macomia teima em não desaparecer
Foto: DW
Quarta invasão
No dia 10 de maio de 2024, um grupo de terroristas invadiu Macomia, naquela que foi a quarta vez consecutiva que aquela vila de Cabo Delgado se viu entregue aos terroristas. Permaneceram na sede distrital por cerca de dois dias. Após confrontos com as tropas moçambicanas e aliados, o grupo armado abandonou a vila. Mas a destruição permanece.
Foto: DW
Rasto de destruição
Ao abandonarem o local, os terroristas deixaram edifícios públicos como registo civil, a direção de infraestruturas e a secretaria distrital completamente vandalizados. Alguns desses locais continuam de porta fechadas. O comércio vai reabrindo a conta-gotas e a medo.
Foto: DW
Agências humanitárias não escaparam
Também os escritórios e infraestruturas que albergam organizações humanitárias como a Médicos Sem Fronteiras, Cruz Vermelha, entre outras, foram arrasados pelos terroristas. Desses locais, foram subtraídos medicamentos, viaturas e outros bens.
Foto: DW
Reconstrução é urgente
Autoridades governamentais de Cabo Delgado visitaram Macomia no início de junho para avaliar os danos causados pela presença terrorista. Apesar de admitirem que é uma "prioridade repor aquelas infraestruturas para gradualmente os funcionários prestarem os serviços necessários à população", os serviços continuam a funcionar a meio-gás.
Foto: DW
Paz e medo entre os habitantes
A vila tenta regressar à normalidade, mas o clima ainda é de medo. Os residentes reativaram as atividades de autossuficiência, mas não escondem o receio de um novo ataque, preocupação que paira a todo o instante.
Foto: DW
Chitunda, em Muidumbe, sem serviços públicos
Os cerca de 11 mil habitantes que tinham saído do posto administrativo de Chitunda, em Muidumbe, devido à insegurança, voltaram a casa. Mas nenhuma escola ou hospital está neste momento a funcionar, deixando milhares de crianças fora das salas de aula e os residentes sem acesso a cuidados de saúde.
Foto: DW
Governo promete reabrir escolas e hospitais
Para aceder a cuidados de saúde, a população da aldeia de Miangaleua, no posto administrativo de Chitunda, em Muidumbe, recorre ao distrito de Macomia. Mas o governo local garante que em breve os centros de saúde e as escolas na região voltarão a funcionar.
Foto: DW
Chuvas intensas agravaram a fome
A população de Miangaleua, em Muidumbe, que regressa paulatinamente a casa está a dedicar-se à produção agrícola. Porém, as chuvas intensas que caíram entre finais de 2023 e princípios deste ano arrastaram vários hectares de campos agrícolas junto ao rio Messalo. A produção de arroz e de outras culturas perdeu-se, aumentando a fome na região.
Foto: DW
Autoridades exortam população a produzir comida
O governo local ofereceu sementes de milho e feijões, enxadas, catanas e outros materiais de produção para que os camponeses voltem a semear.
Foto: DW
Corrente elétrica em falta
Os habitantes expressam também o desejo de ver restabelecida a corrente elétrica em Macomia, uma vez que as instalações elétricas também foram afetadas pelos ataques terroristas dos últimos anos. Pequenos painéis solares garantem serviços mínimos, mas não permitem a conservação do peixe que é retirado do rio, por exemplo.
Foto: DW
Mais segurança
Os residentes da aldeia de Miangaleua, em Muidumbe, pedem o reforço da presença das Forças de Defesa e Segurança, para que nunca mais tenham de fugir das próprias terras devido ao terrorismo. Mas a ajuda tarda em chegar.