Cabo Delgado: Save the Children horrorizada com decapitações
Lusa
18 de junho de 2021
A ONG Save the Children manifestou-se hoje chocada com a notícia da decapitação de dois rapazes, de 15 anos, no passado domingo, em Palma. "Os perpetradores desta violência devem ser responsabilizados", diz.
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Os rapazes foram mortos juntamente com dois adultos, de acordo com um relatório na edição de quinta-feira (17.06) do jornal independente "Carta de Moçambique".
De acordo com as fontes do jornal, as crianças faziam parte de um grupo de 15 pessoas que tinham partido da cidade de Quitunda, a cerca de 15 quilómetros de Palma, em busca de alimentos.
"Estamos horrorizados e revoltados com este crime sem sentido. As crianças nunca devem ser um alvo em conflito. Estes eram dois adolescentes com as suas vidas pela frente e, mesmo assim, foram mortos enquanto tentavam satisfazer as suas necessidades mais básicas, à procura de comida", afirmou Chance Briggs, diretor da Save the Children's em Moçambique.
E prosseguiu: "Mais uma vez somos lembrados, da forma mais brutal, que o conflito em Cabo Delgado é uma guerra contra as crianças. Está a ter um impacto contínuo, horrendo e mortal sobre as crianças".
Os apelos da Save the Children
Segundo Chance Briggs, "graves violações estão a ser cometidas contra as crianças - estão a ser mortas, estão a ser raptadas, estão a ser recrutadas para serem utilizadas por grupos armados".
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"Os perpetradores desta violência devem ser responsabilizados", salientou.
De acordo com o responsável, pelo menos 364.000 crianças foram "forçadas a fugir dos seus lares e a procurar abrigo em campos de deslocados ou em lares cheios de gente", na parte sul da região.
Estas crianças, adiantou, "não têm acesso a cuidados de saúde e a água potável, o que as torna mais expostas a doenças mortais como a cólera e a malária".
Chance Briggs deixou um apelo: "O mundo precisa de se chegar à frente e ajudar as crianças de Cabo Delgado. Apelamos à comunidade de doadores para assegurar que seja dada prioridade ao financiamento das necessidades das crianças. São urgentemente necessários fundos para a proteção, para a saúde, para a educação, para a saúde mental".
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Responsabilidades
"Todas as partes envolvidas neste conflito devem assegurar que as crianças nunca sejam alvo" e "devem fazer tudo o que estiver ao seu alcance para minimizar os danos civis, incluindo o fim dos ataques indiscriminados e desproporcionados contra as crianças", defendeu.
Para Chance Briggs, deve haver "um maior controlo destas violações, inclusive através do Gabinete do Representante Especial do Secretário-Geral da ONU para as Crianças em Conflitos Armados, para que os perpetradores de violência contra crianças possam ser responsabilizados".
Grupos armados aterrorizam Cabo Delgado desde 2017. Alguns ataques são reivindicados pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico, num conflito que já fez mais de 2.800 mortes segundo o projeto de registo de conflitos ACLED e 732.000 deslocados de acordo com as Nações Unidas.
Exposição: "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado"
A Galeria do Núcleo de Arte, em Maputo, inaugurou uma exposição coletiva de artes plásticas inspirada no conflito de Cabo Delgado. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas dos ataques na província.
Foto: DW
Artistas plásticos aderiram à iniciativa
Os artistas que participaram nesta exposição procuraram se expressar através de obras de pintura, escultura ou cerâmica. A exposição inaugurada a 20 de novembro foi organizada pela "Nós Arte" e estará aberta ao público em geral até 10 de dezembro de 2020. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas do conflito em Cabo Delgado.
Foto: DW
Apoio às vítimas de Cabo Delgado
"O nosso intuito é direcionar o que vamos render de cada obra, 50% vai para as necessidades que há em Cabo Delgado e as necessidades são muitas neste momento. Vamos tentar delinear as prioridades: máscaras, desinfetantes, material de higiene para as senhoras, fraldas para as crianças, capulanas, arroz e feijão", esclarece o artista plástico "Chicken", promotor da iniciativa.
Foto: DW
Sensibilização social
"Chicken", o coordenador do Projeto "Nós Arte", explicou que o propósito desta mostra é converter as estatísticas de mortes e refugiados em estética. A expetativa é atingir o âmago da sensibilidade social para que se questione a violência e se solidarize com os moçambicanos vítimas do terrorismo.
Foto: DW
Artistas de Cabo Delgado
"Quando ligamos os noticiários, vemos o que está a acontecer: é a pandemia [da Covid-19], a guerra, a cólera, a malária... Cabo Delgado está a ser afetado por essas coisas", alertou "Chicken" que, como os outros artistas, é de lá oriundo: "O meu sentimento é de muita tristeza porque infelizmente tenho visto amigos e familiares a viverem momentos dramáticos." Obra na foto de Júlia.
Foto: DW
"Esperança da Província" de João Paulo Qhea
"Eu preferi que cada um de nós representasse como se sente no momento no coração e como está de espírito. Não podemos também estar a representar a guerra enquanto queremos paz. Então, cada artista trouxe aquilo que tem e aquilo que sentiu e se inspirou para fazer a sua obra. Não é linear", explicou "Chicken".
Foto: DW
"Artimisia" de Sandra Pizura
Esta pintura de Sandra Pizura representa um grito de silêncio de qualquer coisa como fúria, vingança, inconsciência moral, guerra. André Macie, João Fornasini e Julia são outros dos artistas que participam na exposição "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado".
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"O Jardim da vida" de Samuel Djive
Samuel Djive pretendeu trazer uma ideia daquilo que é o paraíso: "Se o paraíso é um espaço onde temos o bem estar, temos a paz, o amor, temos um progresso, temos uma construção positiva, então é isso que nós queremos para Moçambique. É o que eu quero para Moçambique, um país onde os meus netos e bisnetos se possam sentir orgulhosos de serem moçambicanos", comentou.
Foto: DW
Uma conclusão
Samuel Djive acrescentou que "a mensagem é tentar fazer com que as pessoas tenham a capacidade de dialogar sempre na busca de soluções. Nós, como artistas, faremos a nossa parte, mas existem entidades que são responsáveis por isso. Talvez possamos criar um movimento em que criemos também uma reflexão por parte das entidades responsáveis pela segurança e governação do país."