Terroristas atacam aldeia próxima de projetos de gás
Lusa
8 de dezembro de 2020
Insurgentes invadiram segunda-feira (07.12), a aldeia de Mute, próxima do megaprojeto de gás de Cabo Delgado e atiraram sobre a população. Enquanto isso, o número de deslocados que chegam a Pemba não para de aumentar.
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A aldeia de Mute, na província nortenha de Cabo Delgado, é atravessada pela única estrada asfaltada da zona, fica situada 25 quilómetros a sul de Palma, vila costeira sede de distrito, e a uma distância pouco menor das obras que decorrem na península de Afungi.
Segundo residentes ouvidos pela Lusa, a invasão de Mute ocorreu ao meio da tarde quando rebeldes se misturaram com a população na zona do mercado, sem disparar. Pouco depois, outros insurgentes começaram a atacar as posições das Forças de Defesa e Segurança (FDS) e, ao mesmo tempo, os que se encontravam no mercado dispararam sobre a população.
Não há relatos fidedignos sobre o número de vítimas, dado que toda a população se refugiou no mato, onde pernoitou.
Viaturas com elementos das FDS saíram de Palma para enfrentar os insurgentes com o auxílio de helicópteros, disse outra fonte na sede de distrito, segundo a qual Mute está sob controlo das forças moçambicanas.
Cabo Delgado: O relato de um sobrevivente do terrorismo
02:18
A violência armada em Cabo Delgado está a provocar uma crise humanitária com cerca de duas mil mortes e 500 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos, concentrando-se sobretudo na capital provincial, Pemba.
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Aumento do número de deslocados internos
O secretário de Estado de Cabo Delgado, a norte de Moçambique, voltou esta terça-feira (08.12) a alertar para o crescente número de deslocados que chegam à capital provincial, Pemba, em busca de refúgio, considerando que a cidade está a sofrer "muita pressão".
"Hoje, 75% da população em Pemba é deslocada. Há muita pressão sobre os serviços básicos, água e saneamento. As coisas não estão a andar e então estamos a tentar descongestionar", disse Armindo Ngunga, em declarações à comunicação social em Cabo Delgado, momentos após um grupo de deslocados se instalar num novo centro de acolhimento nos arredores de Pemba.
Segundo a mesma fonte, o Governo moçambicano está a abrir novos centros de acolhimento nos distritos de Metuge, Chiure, Acuabe e Montepuez, próximos de Pemba, para fazer face à pressão que a capital da província está a sofrer.
"Agora estamos com uma equipa do Ministério das Obras Públicas para ver se trabalhamos de perto [na urbanização] com os deslocados que estão a construir as suas novas casas", acrescentou o secretário de Estado de Cabo Delgado.
A capital provincial, que até o censo populacional de 2017 tinha pouco mais de 200 mil habitantes, tem sido o principal refúgio para as pessoas que fogem dos distritos afetados pela violência, mas há quem prefira fugir para outros lugares, incluindo Nampula, província vizinha.
Exposição: "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado"
A Galeria do Núcleo de Arte, em Maputo, inaugurou uma exposição coletiva de artes plásticas inspirada no conflito de Cabo Delgado. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas dos ataques na província.
Foto: DW
Artistas plásticos aderiram à iniciativa
Os artistas que participaram nesta exposição procuraram se expressar através de obras de pintura, escultura ou cerâmica. A exposição inaugurada a 20 de novembro foi organizada pela "Nós Arte" e estará aberta ao público em geral até 10 de dezembro de 2020. Metade do valor das obras será revertido para as vítimas do conflito em Cabo Delgado.
Foto: DW
Apoio às vítimas de Cabo Delgado
"O nosso intuito é direcionar o que vamos render de cada obra, 50% vai para as necessidades que há em Cabo Delgado e as necessidades são muitas neste momento. Vamos tentar delinear as prioridades: máscaras, desinfetantes, material de higiene para as senhoras, fraldas para as crianças, capulanas, arroz e feijão", esclarece o artista plástico "Chicken", promotor da iniciativa.
Foto: DW
Sensibilização social
"Chicken", o coordenador do Projeto "Nós Arte", explicou que o propósito desta mostra é converter as estatísticas de mortes e refugiados em estética. A expetativa é atingir o âmago da sensibilidade social para que se questione a violência e se solidarize com os moçambicanos vítimas do terrorismo.
Foto: DW
Artistas de Cabo Delgado
"Quando ligamos os noticiários, vemos o que está a acontecer: é a pandemia [da Covid-19], a guerra, a cólera, a malária... Cabo Delgado está a ser afetado por essas coisas", alertou "Chicken" que, como os outros artistas, é de lá oriundo: "O meu sentimento é de muita tristeza porque infelizmente tenho visto amigos e familiares a viverem momentos dramáticos." Obra na foto de Júlia.
Foto: DW
"Esperança da Província" de João Paulo Qhea
"Eu preferi que cada um de nós representasse como se sente no momento no coração e como está de espírito. Não podemos também estar a representar a guerra enquanto queremos paz. Então, cada artista trouxe aquilo que tem e aquilo que sentiu e se inspirou para fazer a sua obra. Não é linear", explicou "Chicken".
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"Artimisia" de Sandra Pizura
Esta pintura de Sandra Pizura representa um grito de silêncio de qualquer coisa como fúria, vingança, inconsciência moral, guerra. André Macie, João Fornasini e Julia são outros dos artistas que participam na exposição "Cabo Delgado é Moçambique, Moçambique é Cabo Delgado".
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"O Jardim da vida" de Samuel Djive
Samuel Djive pretendeu trazer uma ideia daquilo que é o paraíso: "Se o paraíso é um espaço onde temos o bem estar, temos a paz, o amor, temos um progresso, temos uma construção positiva, então é isso que nós queremos para Moçambique. É o que eu quero para Moçambique, um país onde os meus netos e bisnetos se possam sentir orgulhosos de serem moçambicanos", comentou.
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Uma conclusão
Samuel Djive acrescentou que "a mensagem é tentar fazer com que as pessoas tenham a capacidade de dialogar sempre na busca de soluções. Nós, como artistas, faremos a nossa parte, mas existem entidades que são responsáveis por isso. Talvez possamos criar um movimento em que criemos também uma reflexão por parte das entidades responsáveis pela segurança e governação do país."