Cabo Delgado vai ter centros de reabilitação de terroristas?
DW (Deutsche Welle)
9 de julho de 2024
Autoridades moçambicanas poderão criar centros para reabilitação e reinserção social de ex-membros do grupo que aterroriza Cabo Delgado. Objetivo: desradicalizar e devolver à vida civil os que abandonem a insurgência.
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O secretário de Estado na província nortenha de Cabo Delgado afirmou que existem membros do grupo terrorista que atua na região que estão a abandonar as matas e o extremismo violento para voltar às suas comunidades de origem.
"De uma ou de outra maneira, existem pessoas [membros do grupo armado não estatal] que estão a regressar e estas pessoas, por um lado, devem merecer algum tratamento, não de forma discriminatória, mas também integrá-las de forma mais sustentável para evitar que muitas delas voltem [às fileiras terroristas]", declarou António Supeia.
O governante não avançou o número nem para quais comunidades estão a regressar, mas acrescentou que alguns terroristas arrependidos enfrentam receios de voltar à comunidade por medo de represálias.
"Algumas pessoas não regressavam porque não encontravam um interlocutor a partir do qual podiam regressar. Uns tinham receio de se apresentar às Forças de Defesa e Segurança", disse.
Centros transitórios para reabilitação
Para permitir a quebra do receio quando regressados à vida civil, uma das possibilidades em cima da mesa é a criação de centros transitórios para pessoas envolvidas no terrorismo. Uma espécie de centros de reabilitação para terroristas que tenham abandonado voluntariamente o extremismo violento.
Em princípio, os centros transitórios para pessoas envolvidas com o terrorismo seriam instalados em Mocímboa da Praia, Macomia e Muidumbe.
A DW África ouviu a opinião de alguns residentes de Cabo Delgado sobre essa possibilidade. Joaquim José, residente em Macomia, acolhe com satisfação a ideia dos centros de reabilitação para terroristas arrependidos. "Acho que fazem bem ao permitir que essa gente volte para casa. Espero que ao voltarem, os antigos terroristas se arrependam definitivamente do que faziam e venham ficar connosco", diz.
Feliciano Pedro, residente de Chiúre, um distrito também assolado pelos ataques armados, não vê problemas em perdoar os terroristas que decidirem deixar tudo para trás e voltar à vida civil.
"Os terroristas que estão a criar-nos sofrimento, decapitando-nos, quando saírem das matas e abandonarem a maldade, precisam vir em público jurar o seu divórcio total com os extremistas", argumenta. "Precisamos incutir-lhes a ideia de que estavam errados e precisam redimir-se."
O rasto do terrorismo em Macomia teima em não desaparecer
O rasto do terrorismo em Macomia teima em não desaparecer
Foto: DW
Quarta invasão
No dia 10 de maio de 2024, um grupo de terroristas invadiu Macomia, naquela que foi a quarta vez consecutiva que aquela vila de Cabo Delgado se viu entregue aos terroristas. Permaneceram na sede distrital por cerca de dois dias. Após confrontos com as tropas moçambicanas e aliados, o grupo armado abandonou a vila. Mas a destruição permanece.
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Rasto de destruição
Ao abandonarem o local, os terroristas deixaram edifícios públicos como registo civil, a direção de infraestruturas e a secretaria distrital completamente vandalizados. Alguns desses locais continuam de porta fechadas. O comércio vai reabrindo a conta-gotas e a medo.
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Agências humanitárias não escaparam
Também os escritórios e infraestruturas que albergam organizações humanitárias como a Médicos Sem Fronteiras, Cruz Vermelha, entre outras, foram arrasados pelos terroristas. Desses locais, foram subtraídos medicamentos, viaturas e outros bens.
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Reconstrução é urgente
Autoridades governamentais de Cabo Delgado visitaram Macomia no início de junho para avaliar os danos causados pela presença terrorista. Apesar de admitirem que é uma "prioridade repor aquelas infraestruturas para gradualmente os funcionários prestarem os serviços necessários à população", os serviços continuam a funcionar a meio-gás.
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Paz e medo entre os habitantes
A vila tenta regressar à normalidade, mas o clima ainda é de medo. Os residentes reativaram as atividades de autossuficiência, mas não escondem o receio de um novo ataque, preocupação que paira a todo o instante.
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Chitunda, em Muidumbe, sem serviços públicos
Os cerca de 11 mil habitantes que tinham saído do posto administrativo de Chitunda, em Muidumbe, devido à insegurança, voltaram a casa. Mas nenhuma escola ou hospital está neste momento a funcionar, deixando milhares de crianças fora das salas de aula e os residentes sem acesso a cuidados de saúde.
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Governo promete reabrir escolas e hospitais
Para aceder a cuidados de saúde, a população da aldeia de Miangaleua, no posto administrativo de Chitunda, em Muidumbe, recorre ao distrito de Macomia. Mas o governo local garante que em breve os centros de saúde e as escolas na região voltarão a funcionar.
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Chuvas intensas agravaram a fome
A população de Miangaleua, em Muidumbe, que regressa paulatinamente a casa está a dedicar-se à produção agrícola. Porém, as chuvas intensas que caíram entre finais de 2023 e princípios deste ano arrastaram vários hectares de campos agrícolas junto ao rio Messalo. A produção de arroz e de outras culturas perdeu-se, aumentando a fome na região.
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Autoridades exortam população a produzir comida
O governo local ofereceu sementes de milho e feijões, enxadas, catanas e outros materiais de produção para que os camponeses voltem a semear.
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Corrente elétrica em falta
Os habitantes expressam também o desejo de ver restabelecida a corrente elétrica em Macomia, uma vez que as instalações elétricas também foram afetadas pelos ataques terroristas dos últimos anos. Pequenos painéis solares garantem serviços mínimos, mas não permitem a conservação do peixe que é retirado do rio, por exemplo.
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Mais segurança
Os residentes da aldeia de Miangaleua, em Muidumbe, pedem o reforço da presença das Forças de Defesa e Segurança, para que nunca mais tenham de fugir das próprias terras devido ao terrorismo. Mas a ajuda tarda em chegar.