1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Camarões, Colômbia, Canadá: As novas rotas dos refugiados

Sandra Weiss (Cidade do México) | gcs
11 de agosto de 2019

Cresce a fila de refugiados na cidade mexicana de Tijuana, na fronteira com os EUA. Não são só migrantes da América Latina e das Caraíbas que tentam ir para norte - há também refugiados africanos.

Um grupo de migrantes africanos espera ser ouvido pelos serviços de migração dos EUA, em TijuanaFoto: AFP/O. Martinez

Samuel fugiu dos Camarões em janeiro - fugiu do regime do Presidente Paul Biya, no poder desde 1982.

O camaronês, de 42 anos, conta que percorreu meio mundo até chegar à fronteira em Tijuana. "Foi uma odisseia", diz numa entrevista por telefone à DW.

Samuel passou pela Nigéria e pela Turquia. Daí foi para o Equador. Andou de autocarro, a cavalo, de barco e a pé pela selva de Darién, entre a Colômbia e o Panamá. Pelo caminho, foi assaltado e, por todo o lado, excepto na Costa Rica, pediram-lhe subornos.

Aprofundam-se as divisões nos Camarões

01:35

This browser does not support the video element.

Contra vozes contrárias

A viagem custou a Samuel cerca de 6.500 dólares norte-americanos. "A 31 de maio, quando cheguei a Tijuana, pensei que o pior já tinha passado e que o resto seria uma brincadeira", afirma.

"Em vez disso, encalhei num mar de burocracias", diz Samuel, que pede para não divulgarmos o seu apelido por motivos de segurança.

Agora, o camaronês já esgotou as poupanças, enquanto, em casa, os seus três filhos continuam à espera que ele envie dinheiro para comprar material e uniformes para a escola.

Samuel pertence à minoria anglófona dos Camarões. Estudou contabilidade, trabalhou num banco e teve até uma formação na Coreia do Sul. Quando regressou, vinha com ideias novas para desenvolver a terra onde nasceu, no sul do país. Participou nos protestos da minoria anglófona contra Biya, que começaram em 2016, e usou os seus contactos internacionais para ajudar deslocados internos com alimentos, roupa e medicamentos.

A 5 de janeiro foi detido por militares. Só saiu da prisão graças a um oficial, antigo colega de escola, e à sua família, que pagou uma caução de 1.000 dólares. Samuel fugiu para a Nigéria, mas aí também não se sentia seguro, porque as autoridades do país cooperavam com o regime de Biya. "Desaparecem cada vez mais opositores camaroneses", afirma.

Fim de linha? Refugiados africanos protestam em TijuanaFoto: AFP/G. Arias

Odisseia na América Latina

A seguir, através de traficantes, comprou um bilhete de avião para o Equador, passando pela Turquia, Panamá e Colômbia. O Equador é um dos poucos países em que os camaroneses não precisam de visto para entrar. Samuel tinha recebido a indicação de que, quando chegasse, devia comprar um bilhete de autocarro para a Colômbia numa empresa específica. Sentados nesse autocarro iam outros camaroneses.

Durante a odisseia pela América Latina, Samuel encontrou refugiados de outros países africanos e migrantes vindos de Cuba e do Haiti. Por vezes, andava em pequenos grupos; outras vezes, integrava séquitos de até 200 pessoas. Com frequência, andava dinheiro de mão em mão.

"Houve funcionários públicos que chegaram a acompanhar-nos até ao balcão da Western Union mais próximo para levantar o dinheiro que os nossos familiares nos mandaram", diz Samuel. Quem não tinha dinheiro era preso - se necessário, durante semanas. "A Nicarágua foi onde nos pediram mais dinheiro. Tivemos de pagar à polícia 150 dólares para continuar a viagem", diz o camaronês. "E nem sequer recebemos um salvo-conduto".

Samuel conta que foi roubado no Panamá e na Colômbia - primeiro por ladrões na estrada, depois pela própria polícia. Precisou de cinco dias para atravessar a selva de Darién, seguindo sempre as pistas deixadas no caminho por outros migrantes - roupa usada pendurada em árvores.

À espera de passagem

Ao todo, na fronteira mexicana, há cerca de 2.000 refugiados dos Camarões, Eritreia, Etiópia, Gana e Somália que esperam ser ouvidos pelas autoridades de migração dos EUA em relação aos seus pedidos de asilo, de acordo com a ativista de direitos humanos Soraya Vasquez.

Migrantes na fronteira entre o México e os EUAFoto: Getty Images/AFP/P. Pardo

Mas a lista de espera é muito maior, é gerida por migrantes da América Central, e "os africanos são particularmente prejudicados, porque não falam a língua e não conhecem as práticas", afirma Vasquez, da organização "Families belong together".

Todos os dias Samuel vai ao posto fronteiriço e volta desanimado. Há muito que expirou o visto de trânsito que recebeu das autoridades mexicanas. Sem papéis, não pode trabalhar enquanto espera por uma audiência com os serviços de migração norte-americanos. Os poucos centros de acomodação em Tijuana estão totalmente ocupados, sobretudo por mulheres e famílias com crianças. E as filas nos locais de distribuição de comida são longas.

"Rezo por um milagre"

Há três semanas, Samuel e outros refugiados africanos protestaram nas ruas de Tijuana, denunciando a sua situação. As autoridades prometeram analisar o problema. Mas "de lá para cá, nada mudou", queixa-se o camaronês.

Os EUA continuam a ser um destino de sonho para Samuel. Mas, entretanto, ele já pensa em ir para o Canadá, embora aí, apesar de garantias oficiais em contrário, as portas continuem fechadas para requerentes de asilo, até agora.

Para Samuel, o México ou a Guatemala - países que, segundo o Presidente norte-americano Donald Trump, devem acolher a maior parte dos migrantes - não são uma opção. Samuel diz que até poderia aprender a língua, mas a cultura é muito diferente e ou não há trabalho ou o trabalho é mal pago. O camaronês refere ainda que não gostaria de levar os seus filhos para esses países, pois florescem aí drogas e prostituição. "Não sei o que vai acontecer a seguir. Rezo por um milagre."

Saltar a secção Mais sobre este tema

Mais sobre este tema

Ver mais artigos