Camarões: Escalada de violência nas regiões anglófonas
Adrian Kriesch | ac
22 de outubro de 2018
A violência está a aumentar nas regiões separatistas dos Camarões, onde um religioso foi morto a tiros por soldados na frente de uma igreja. Arcebispo exige o fim dos conflitos.
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As eleições presidenciais nos Camarões tiveram lugar no dia 7 de outubro, mas até à data ainda não foram divulgados os resultados oficiais. Tudo indica que Paul Biya, de 85 anos de idade, e que governa o país há 36 anos, será novamente indicado como vencedor.
Enquanto isso, o país está mergulhado em várias crises e ameaças. Por um lado os ataques terroristas perpetrados por jihadistas como os Boko Haram da Nigéria, por outro os separatistas nas regiões anglófonas, que em grande número boicotaram as eleições.
O repórter da DW, Adrian Kriesch, visitou recentemente a região à volta da cidade de Bamenda, onde se vive uma autêntica guerra civil entre grupos independentistas e soldados camaroneses, confrontos que já resultaram em mais de 400 mortes desde o início do ano.
Camarões: Escalada de violência nas regiões anglófonas
Execução
Uma das vítimas mais recentes é o jovem Gerard de 19 anos. Ele foi morto a tiros por soldados camaroneses. A mãe do morto - Comfort Akiata - exprime a sua angústia: "A forma como ele morreu é inexplicável. Não sei o que dizer. Ele era o meu único filho".
Várias testemunhas relatam a forma atroz como o jovem foi executado. Os soldados apontaram na sua direção e mataram o rapaz indefeso, apesar de estar claro que o jovem não estava armado e acabava de sair da igreja católica de Bamenda, segundos os testemunhos. O arcebispo de Bamenda, Cornelius Fontem Esua, relatou que vários enfermeiros em uma clínica vizinha observaram a situação.
O arcebispo, em entrevista à DW, confirma que as pessoas nesta região se sentem aterrorizadas. "As pessoas têm medo dos militares. Ninguém se sente seguro quando os soldados aparecem. Qualquer um pode ser atingido, qualquer um pode ser considerado culpado de qualquer crime. Nem sequer dão a oportunidade às pessoas de explicarem quem são. Justiça no sentido da palavra aqui não existe".
Regiões separatistas
De facto as regiões de língua inglesa - a oeste e noroeste do país - encontram-se completamente militarizadas. Não é aconselhável filmar os soldados nem desobedecer às suas ordens. Os soldados podem disparar contra qualquer pessoa considerada separatista a qualquer momento.
O governador da região noroeste, Deben Tchoffo, é um estreito aliado do Governo central e do Presidente Paul Biya. Tchoffo não confirma que a violência exercida pelos militares seja excessiva.
"As pessoas que se queixam de falta de segurança mentem. A situação está perfeitamente sob controlo. Isso se aplica a toda à região. Existem alguns pequenos focos de violência, mas de um modo geral a situação está controlada", assegurou o Tchoffo.
Uma coisa é certa: na região atuam vários grupos separatistas, compostos por jovens armados que tentam combater os soldados que consideram forças de ocupação. Um dos jovens separatistas afirmou à DW que "os soldados andam a matar pessoas inocentes". "É por isso que andamos aqui a patrulhar a zona. Quando os podemos atacar, atacamo-los com armas caseiras. Mas quando eles são muitos nós preferimos recuar, fugindo para a selva".
A situação na região noroeste dos Camarões está tensa. E muitos observadores questionam se o presidente Paul Biya e os seus soldados têm condições para apaziguar os ânimos ou - pelo contrário - se são parte do problema.
Presidentes africanos para sempre
Vários presidentes africanos governam há tanto tempo, que muitos cidadãos não conhecem outro líder do seu país. Teodoro Obiang Nguema é o líder africano há mais tempo no poder: governa a Guiné Equatorial desde 1979.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Alamba
Guiné Equatorial: Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é atualmente o líder africano há mais tempo no poder, depois de, em 2017, José Eduardo dos Santos ter deixado o cargo de Presidente de Angola, que ocupava também desde 1979. Neste ano, Obiang chegou ao poder através de um golpe de estado contra o seu tio, Francisco Macías. Nas últimas eleições no país, em 2016, Obiang afirmou que não voltaria a concorrer em 2020.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Lecocq
Camarões: Paul Biya
Com o seu nascimento no ano de 1933, Paul Biya é o Presidente mais idoso do continente africano e apenas ultrapassado em anos no poder pelo líder da vizinha Guiné Equatorial. Biya chegou ao poder em 1982. Em 2008, uma revisão à Constituição retirou os limites aos mandatos. Em 2018, Biya, foi declarado vencedor das eleições. Os Camarões atravessam uma crise com a rebelião na parte anglófona.
Foto: picture-alliance/AA/J.-P. Kepseu
Uganda: Yoweri Museveni
Com mais de 30 anos no poder, Yoweri Museveni é, para uma grande parte dos ugandeses, o único Presidente que conhecem. 75% dos atuais 35 milhões de habitantes nasceram depois de Museveni ter subido ao poder em 1986. Em 2017, foi aprovada a lei que retira o limite de idade (75 anos) para concorrer à Presidência. Assim sendo, Museveni já pode concorrer ao sexto mandado, nas eleições de 2021.
Foto: picture alliance/AP Photo/B. Chol
República do Congo: Denis Sassou Nguesso
Foi também uma alteração à Constituição que permitiu que Denis Sassou Nguesso voltasse a candidatar-se e a vencer as eleições em 2016 na República do Congo (Brazzaville). Já são mais de 30 anos à frente do país, com uma pequena interrupção entre 1992 e 1997. Denis Sassou Nguesso nasceu no ano de 1943.
Foto: picture-alliance/AA/A. Landoulsi
Ruanda: Paul Kagame
Paul Kagame lidera o Ruanda desde 2000. Antes, já teve outros cargos influentes e foi líder da Frente Patrifótica Ruandesa (FPR), a força que venceu a guerra civil no Ruanda. Em 2017, Kagame ganhou as eleições com 98,8% dos votos. Assim poderá continuar no poder até, pelo menos, 2034. Assim ditou a consulta popular realizada em 2015 que acabou com o limite de dois mandatos presidenciais.
Foto: Imago/Zumapress/M. Brochstein
Burundi: Pierre Nkurunziza
Em 2005, Pierre Nkurunziza chegou ao poder no Burundi. Em 2015, o terceiro mandato de Nkurunziza gerou uma onda de protestos entre a população que, de acordo com o Tribunal Penal Internacional, terá causado cerca de 1.200 mortos e 400.000 refugiados. Em maio de 2018, teve lugar um referendo para alterar a Constituição, que permitiu ao Presidente continuar no cargo até 2034.
Foto: Reuters/E. Ngendakumana
Gabão: Ali Bongo Ondimba
Ali Bongo ainda está longe de quebrar o recorde do pai, que esteve 41 anos no poder, mas já vai no terceiro mandato, ganho em 2017, no meio de muita contestação. Em 2018, a Constituição do Gabão foi revista para acabar com o limite de mandatos. A nova versão da Constituição também aumentou os poderes do Presidente para tomar decisões unilateralmente.
Foto: Reuters/Reuters TV
Togo: Faure Gnassingbé
Em 2005, Faure Gnassingbé substituiu o pai, que liderou o país durante 38 anos. Ao contrário de outros países, o Togo não impunha um limite aos mandatos. Em 2017, após protestos da população contra a "dinastia" Gnassingbé, foi aprovada a lei que impõe um limite de mandatos. No entanto, a lei não tem efeitos retroativos, pelo que o ainda Presidente poderá disputar as próximas eleições, em 2020.
Foto: DW/N. Tadegnon
Argélia: Abdelaziz Bouteflika
Abdelaziz Bouteflika esteve 20 anos no poder na Argélia (1999-2019). Em 2013, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), mas nem a idade, nem o estado de saúde travaram o Presidente de anunciar que iria procurar um quinto mandato em 2019. Em abril de 2019, face a protestos públicos, anunciou a sua renúncia ao cargo. Nesta altura, já teve 82 anos de idade.