Campanha do caju arranca com novas regras na Guiné-Bissau
Lusa | mjp
1 de abril de 2017
Governo proíbe operadores internacionais de comprarem diretamente ao produtor e críticos falam em “protecionismo desnecessário”. Associação de agricultores espera “boa campanha”.
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O Governo da Guiné-Bissau abriu oficialmente esta sexta-feira (31.03) a campanha de comercialização da castanha do caju, principal produto de exportação, perante novas regras impostas pelo ministro do Comércio, Vítor Mandinga.
Segundo o Governo, apenas comerciantes com a nacionalidade guineense poderão comprar a castanha diretamente ao produtor. Os críticos da medida entendem que se trata de um "protecionismo desnecessário", mas o ministro do Comércio e Promoção Empresarial, Vítor Mandinga, autor da lei, sublinha que "comércio livre não significa ausência de regras".
Segundo Mandinga, a qualidade do caju da Guiné-Bissau faz com que haja muita procura do produto no mercado internacional, onde o país é cotado como o quinto maior produtor mundial e segundo africano.
Aumento dos preços e do controlo
O ministro do Comércio afirma que a qualidade permite à Guiné-Bissau praticar um preço "relativamente mais alto" em comparação com países africanos ou asiáticos.
Um quilograma da castanha passa a ser comprado ao produtor por 500 francos CFA (cerca de 0,76 cêntimos), em vez de 350 francos CFA. O presidente da associação dos agricultores da Guiné-Bissau, Jaime Gomes, considera que "o preço é justo" e que os camponeses esperam ter uma boa campanha.
O ministro Vítor Mandinga acredita que se o país mantiver o nível de "boa qualidade" do seu caju estará sempre em condições de pedir melhores preços aos compradores internacionais, pelo que, afirma, se justificam as regras impostas este ano pelo Governo.
O ministro guineense, um conhecido operador do setor do caju, classifica como corajosas as medidas adotadas pelo Executivo guineense. Mandinga defende que as novas regras vão contribuir para o aumento do controlo ao fisco, proporcionar maior arrecadação de receitas ao Estado e promover o emprego dos jovens e das mulheres guineenses.
Só em taxas alfandegárias com a exportação do caju, estima o ministro, o Governo irá receber cerca de 11,2 milhões de euros.
As novas regras no setor do caju, considera ainda Vítor Mandinga, irão apertar ainda mais o circuito do branqueamento de capitais, ao obrigarem os operadores económicos a realizarem as suas transações através dos bancos.
"Made in Guiné-Bissau”
Segundo o ministro do Comércio, parte do caju do país será transformado localmente em amêndoa para ser exportada, pela primeira vez, com o selo "made in Guiné-Bissau".
Vítor Mandinga indicou que o laboratório de certificação de qualidade de origem já se encontra montado na capital guineense e que técnicos vietnamitas vão prestar apoio aos guineenses no trabalho com as máquinas.
"Tolerância zero à saída clandestina do caju guineense para o exterior" é o lema da campanha que decorre até setembro.
O Governo estima que 50 mil toneladas de castanha do caju saem da Guiné-Bissau através do circuito do contrabando para países vizinhos. O Executivo quer exportar pelo menos 200 mil toneladas de caju.
Sumos, bolachas e até "bifes" para diversificar rendimento do caju
O caju é a principal fonte de rendimento dos produtores guineenses. A fim de estimular a economia, os produtores de Ingoré uniram-se na cooperativa Buwondena, onde produzem sumo, bolachas e até "bife" de caju.
Foto: Gilberto Fontes
O fruto da economia
Sendo um dos símbolos da Guiné-Bissau, o caju é a principal fonte de receita dos camponeses. A castanha de caju representa cerca de 90% das exportações do país. Este ano, foram exportadas 200 toneladas de castanha de caju, um encaixe de mais de 250 mil euros. A Índia é o principal comprador. O caju poderá trazer ainda mais riqueza ao país, se houver maior aposta no processamento local do produto.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no processamento
Em Ingoré, no norte da Guiné-Bissau, produtores de caju uniram-se na cooperativa Buwondena - juntamos, em dialeto local balanta - para apostar no processamento do caju. Antes, aproveitava-se apenas a castanha, desperdiçando o chamado pedúnculo, que representa cerca de 80% do fruto. Na cooperativa produzem-se agora vários produtos derivados do caju.
Foto: Gilberto Fontes
“Bife” de caju
Depois de devidamente preparado, o pedúnculo, que é a parte mais fibrosa do caju, pode ser cozinhado com cebola, alho e vários temperos. O resultado final é o chamado “bife” de caju.
A partir das fibras, produz-se também chá, mel, geleia, bolacha, entre outros. Ao desenvolverem novos produtos, os produtores diversificam a dieta e aumentam os seus rendimentos.
Foto: Gilberto Fontes
Néctar de caju
Depois de prensadas as fibras do caju, obtém-se um suco que é filtrado várias vezes, a fim de se produzir néctar e sumo. Com 50% desse suco e 50% de água com açúcar diluído, obtem-se o néctar de caju. Este ano, a cooperativa Buwondena produziu quase 400 litros desta bebida.
Foto: Gilberto Fontes
Sumo de caju
O sumo resulta da pasteurização do suco que foi filtrado do fruto, sem qualquer adicionante. Cada garrafa destas de 33cl de sumo de caju custa quase 0.40€. Ou seja, um litro de sumo pode render até 1.20€. O que é bem mais rentável que vinho de caju, produzido vulgarmente na Guiné-Bissau, que custa apenas 0.15€ o litro. Em 2016, foram produzidos na cooperativa quase 600 litros de sumo de caju.
Foto: Gilberto Fontes
Mel de caju
Clode N'dafa é um dos principais especialistas de transformação de fruta da cooperativa. Sabe de cor todas as receitas da cooperativa e só ele faz alguns produtos, como o mel. Mas devido à falta de recipientes, este produziu-se pouco mel de caju. Desde que se começou a dedicar ao processamento de fruta, Clode N'dafa conseguiu aumentar os seus rendimentos e melhorar a vida da sua família.
Foto: Gilberto Fontes
Castanha de caju
Este continua a ser o produto mais vendido pela cooperativa. O processamento passa por várias etapas: seleção das melhores castanhas, que depois vão a cozer, passam à secagem, ao corte e vão à estufa. As castanhas partidas são aproveitadas para a produção de bolacha de caju. Este ano, a cooperativa conseguiu fixar preço da castanha de caju em 1€ o quilo, protegendo os rendimentos dos produtores.
Foto: Gilberto Fontes
Potencial para aumentar produção
A maior parte dos produtos são vendidos localmente, mas alguns são comercializados também em Bissau e exportados para o Senegal. A produção decorre sobretudo entre os meses de março e junho, período da campanha do caju. No pico de produção, chegam a trabalhar cerca de 60 pessoas. Se a cooperativa conseguisse uma arca frigorífica para armazenar o caju, continuaria a produção depois da campanha.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no empreendedorismo
A cooperativa Buwondena aposta na formação a nível de empreendedorismo, para que os produtores possam aumentar o potencial do seu negócio. A cooperativa pretende criar uma caixa de poupança e crédito. O objetivo é que, através de juros, os produtores possam rentabilizar as suas poupanças e apostar noutros negócios.
Foto: Gilberto Fontes
É urgente reordenar as plantações
A plantação de cajueiros é outra das preocupações da cooperativa: uma plantação organizada, com ventilação é fundamental para aumentar a rentabilidade.
Devido ao peso do sector do caju na economia da Guiné-Bissau, todos os anos são destruídos entre 30 e 80 mil hectares de floresta para a plantação de cajueiros. Especialistas defendem uma reordenação urgente das plantações.