Forças Armadas dizem que Palma "está totalmente protegida"
29 de abril de 2021"O que tivemos foram algumas casas incendiadas na terça-feira (27.04) nos arredores de Palma por dois supostos insurgentes", disse Chongo Vidigal, porta-voz das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) no Teatro Operacional Norte.
O responsável falava hoje à Lusa a partir de Afungi, cerca de seis quilómetros a sul da vila, junto às instalações do projeto de gás do norte de Moçambique e junto à aldeia de Quitunda, recém-criada pelos investidores.
Os supostos agressores, os mesmos responsáveis pelo ataque de 24 de março, regressaram a Palma procurando "vingança", alegou. "Pensamos que foi por vingança contra membros da população que os insurgentes acham que colaboram com as Forças de Defesa e Segurança (FDS)", declarou.
Fontes na vila terem relatado a presença de desconhecidos que têm atacado pessoas e destruído propriedades desde a noite de terça-feira.
Palma "completamente sob domínio das FDS"
O porta-voz confirmou a existência de fogo posto em algumas casas e reiterou: "A informação verdadeira é que Palma está completamente sob domínio das FDS, a vila está totalmente protegida".
Vidigal reconheceu ainda o receio da maioria da população de Palma em voltar à vila, porque "as estruturas administrativas" ainda não se reinstalaram, após a fuga em massa provocada pelos ataques de 24 de março. "É como numa casa: se o chefe de família não volta, os outros elementos do agregado familiar ficam receosos", declarou o porta-voz.
Grupos armados aterrorizam Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reclamados pelo grupo jihadista Estado Islâmico, numa onda de violência que já provocou mais de 2.500 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e 714.000 deslocados, de acordo com o Governo moçambicano.
O mais recente ataque ocorreu em 24 de março contra a vila de Palma, provocando dezenas de mortos e feridos. As autoridades moçambicanas recuperaram o controlo da vila, mas o ataque levou a petrolífera Total a abandonar por tempo indeterminado o recinto do projeto de gás com início de produção previsto para 2024, avaliado em 20 mil milhões de euros, e no qual estão ancoradas muitas das expectativas de crescimento económico de Moçambique na próxima década.
Governo mantém abordagem
A consultora Eurasia considerou hoje que a declaração de "força maior" pela Total relativamente à sua operação no norte de Moçambique não vai levar o Executivo a mudar significativamente de abordagem ao conflito. "A abordagem do Governo relativamente à insurgência tem sido tratar o problema como uma questão de segurança, em vez de uma questão de desenvolvimento, e essa mantém-se a questão fundamental", escrevem os analistas num comentário à decisão da petrolífera francesa.
"Apesar de a Total não dever abandonar completamente o projeto, declarar 'força maior' significa que é pouco provável que o trabalho recomece pelo menos durante mais um ano", apontam os analistas, que escrevem ainda que "consequentemente, o esperado impulso às receitas governamentais do projeto de gás natural liquefeito vai ser atrasado pelo menos dois anos, piorando a perspetiva de evolução da economia moçambicana".
Além disso, apontam, o Presidente Filipe Nyusi "continua a resistir a uma intervenção externo no conflito que vá além de treino e partilha de informações secretas", apesar de a colocação de tropas da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral "ser cada vez mais provável, ainda que não deva apoiar o suficiente para mudar o rumo do conflito".
Para estes analistas, a abordagem do Governo é o principal impedimento à resolução da insurgência no norte do país, que ameaça adiar as perspetivas de desenvolvimento económico do país. "O descontentamento local fomentado pelo subdesenvolvimento, principalmente entre a minoria étnica dos Mwani em Cabo Delgado, deu gás à insurgência e mesmo assim o Governo tem falhado em colocar as iniciativas de desenvolvimento como uma prioridade", argumentam os analistas, exemplificando com a suborçamentação e a lentidão nas operações da Agência de Desenvolvimento Integrado do Norte (ADIN).
"O Governo não deverá mudar a abordagem já que não quer parecer fraco perante os seus opositores dentro do partido, que são maioritariamente militares da linha dura", concluem os analistas da Eurasia.