Analistas moçambicanos congratulam-se com extradição do ex-ministro das Finanças Manuel Chang para os Estados Unidos da América. Mas avisam ser irrealista esperar novas grandes revelações no caso das dívidas ocultas.
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O antigo ministro das Finanças de Moçambique, Manuel Chang, já está a caminho dos Estados Unidos da América (EUA), onde deverá ser julgado por envolvimento no escândalo das dividas ocultas.
O analista político Dércio Alfazema avisa que o antigo ministro pode não ter muitas revelações novas para fazer quando for a julgamento em Nova York. Para Alfazema, o essencial já foi dito no julgamento em Moçambique. "Tenho muitas dúvidas que Manuel Chang possa ter algum mistério por revelar que ainda não tenha sido revelado por outros,” disse Alfazema à DW África.
Onde estão os milhões desaparecidos?
O analista Wilker Dias considera que Chang poderá também querermanter a lealdade aos principais atores envolvidos no caso.
"Acredito que ele seja um dos maiores responsáveis nesta história. Mas existem outros atores relevantes para o contexto nacional que deveriam estar em conluio com ele. Por isso abre-se essa possibilidade de guardar a lealdade e levar as culpas para si.”
A sociedade civil moçambicana sempre deixou claro que preferia ver o ex-ministro julgado nos EUA, por não confiar inteiramente na independência da Justiça nacional. A esperança é que Chang revele em Nova York o paradeiro de centenas de milhões desaparecidos, assim como o nome da pessoa que o autorizou a assinar os títulos de dívida ilegais.
Dias disse à DW África que tudo dependerá de Chang querer ou não cooperar com a justiça americana. Reconhece que a maioria dos moçambicanos saúda a extradição para os EUA, mas adverte: "Eu acredito que poderemos fragilizar um pouco a nossa justiça”.
Moçambique: Propriedades e instituições ligadas às "dívidas ocultas"
O processo denominado "dívidas ocultas" envolve não apenas pessoas de muitos quadrantes políticos e sociais, mas também empresas, propriedades e instituições.
Foto: Romeu da Silva/DW
O julgamento das "dívidas ocultas" decorre no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo
O processo decorre no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo desde 23 de Agosto de 2021. A sexta sessão revelou que arguidos e declarantes adquiriram residências luxuosas e criaram empresas de lavagem de dinheiro. A sociedade moçambicana ficou a conhecer a extensão da lesão que sofreu por causa das dividas ocultas.
Foto: Romeu da Silva/DW
Tudo começou no bairro de Sommerschield
Tudo começou no bairro de elite da Sommerschield, onde fica a sede do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE). Não se trata do edifício na foto, já que é proibido fotografar o edifício do SISE. Mas foi nas suas instalações que foi desenvolvido o projeto de proteção da Zona Económica Exclusiva (ZEE), que acabou endividando o Estado em cerca de 2,2 mil milhões de dólares.
Foto: Romeu da Silva/DW
Lavagem de dinheiro
No julgamento, o Ministério Público (MP) acusou o réu António Carlos do Rosário de ser proprietário de vários apartamentos neste edifício chamado Deco Residence. O MP refere que do Rosário comprou, em 2013, três apartamentos, no valor de 500 mil dólares cada. O valor foi transferido pela IRS para a Txopela Investiments, de que era administrador.
Foto: Romeu da Silva/DW
Tribunal confisca apartamentos
Alexandre Chivale, advogado do réu António Carlos do Rosário, ocupava um apartamento aqui na Deco Assos. Foi obrigado a abandonar a unidade e a entregar a chave ao Tribunal de Maputo. A área residencial está a ser construída ao longo da marginal, uma zona que passou a ser muito concorrida.
Foto: Romeu da Silva/DW
Apartamento Xenon
António Carlos do Rosário também terá "metido a mão" neste imóvel. Na acusação consta que, em 2015, a Txopela transferiu 2,9 milhões de dólares para a Imobiliária ImoMoz para a compra de apartamentos neste edifício, que antes funcionava como cinema Xenon.
Foto: Romeu da Silva/DW
Alerta lançado pela INAMAR foi ignorado
A INAMAR é uma empresa que se dedica à inspeção naval. No processo da contratação das dívidas, a INAMAR avisou que os barcos da empresa pública EMATUM, que custaram 600 milhões de dólares, foram construídos à revelia das normas. Por causa das irregularidades, a INAMAR chumbou as embarcações. E alertou as autoridades relevantes, que ignoraram o relatório.
Foto: Romeu da Silva/DW
Casa de câmbios transformada em "lavandaria"
A Africâmbios transformou-se numa casa na lavagem de dinheiro. Alguns funcionários foram obrigados a abrir contas, usadas pelos seus superiores para a transferência de dinheiro da empresa Privinvest, igualmente envolvida no escândalo. O proprietário da Africâmbios, Taquir Wahaj, fugiu e é procurado pela justiça moçambicana.
Foto: Romeu da Silva/DW
Presidência e reuniões do comando conjunto
A presidência da República, perto da edifício da secreta moçambicana, acolheu algumas reuniões do Comando Conjunto e Operativo onde estiveram os ministros da Defesa, Filipe Nyusi, atual Presidente da República, Alberto Mondlane, ministro do Interior e elementos do SISE. Há muita pressão para que o antigo Presidente Guebuza e Nyusi sejam ouvidos como réus e não como declarantes no caso.
Foto: Romeu da Silva/DW
MINT fazia para do Comando Conjunto
O Ministério do Interior, assim como o Ministério da Defesa, eram considerados cruciais no projeto de Proteção da Zona Económica Exclusiva. O tribunal tem na lista de declarantes o antigo ministro Alberto Mondlane para prestar declarações e o papel que este Ministério teve na contratação das dívidas ocultas.
Foto: Romeu da Silva/DW
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Prestar contas à Justiça em Moçambique
O analista Alfazema lembra que o interesse dos americanos em Manuel Chang não anula as acusações de que é alvo pela Justiça moçambicana. "Chang vai ser julgado nos Estados Unidos face às acusações que recaem sobre ele perante as leis americanas. Mais ainda vai ter que responder às acusações levantadas contra ele em Moçambique”, diz Alfazema, que acredita que "a maior responsabilização poderá acontecer em Moçambique”.
Para o analista Wilker Dias, os moçambicanos só ficarão a ganhar com o julgamento caso haja alguma nova revelação: "Se não houver nenhuma revelação, não creio muito que isto venha a trazer algum benefício para o povo moçambicano”.