Em entrevista à DW, o Fórum de Monitoria do Orçamento comemora a medida do tribunal sul-africano, que anulou decisão sobre a extradição de Manuel Chang para Moçambique. Atual ministro da Justiça vai decidir o caso.
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O Tribunal Superior da África do Sul decidiu anular a decisão do antigo ministro da Justiça sul-africano, Michael Masutha, de extraditar Manuel Chang para Moçambique. Esta anulação é o resultado de um recurso apresentado pelo Fórum de Monitoria do Orçamento de Moçambique (FMO).
Com a decisão, o novo ministro da Justiça do país, Ronald Lamola, será o responsável por decidir se o ex-ministro das Finanças moçambicano será extraditado para Moçambique ou para os Estados Unidos da América.
Em entrevista à DW África, a coordenadora do Fórum de Monitoria do Orçamento, Denise Namburete, fez uma avaliação da decisão tomada pela Corte sul-africana.
Caso Chang: "Chance de um julgamento em Moçambique ser justo é nula"
DW África: Como a senhora avalia a decisão do Tribunal sulafricano?
Denise Namburete (DN): Bastante positiva. Ficamos bastante satisfeitos com o facto de o Tribunal Superior sul-africano ter acolhido a petição do FMO ao solicitar o anulamento da decisão do ex-ministro da Justiça sul-africana. Então, estamos bastante esperançosos para perceber qual será a decisão do atual ministro da Justiça, Ronald Lamola.
DW África: O Fórum de Monitoria do Orçamento tinha apresentado um recurso ao Tribunal em julho de 2019. Qual foi o motivo desse pedido?
DN: Foi um pedido de anulação da decisão do antigo ministro, solicitando ao tribunal para que tome uma decisão informada pela lei e não por influência política. A nossa expetativa é que, agora, o ministro possa tomar uma decisão alinhada à Lei da Extradição.
DW África: E quais são agora as expetativas?
DN: A lei é bastante clara em relação a isso. No caso Chang, o que nós percebemos, e o nosso argumento no recurso é que, na verdade, o pedido de extradição da Procuradoria-Geral da República [PGR] de Moçambique é o pedido de extradição de um suspeito e não de um acusado. Isso não tem cabimento legal. A Lei da Extradição é bastante clara e faz referência a indivíduos que tenham sido, efetivamente, acusados. E no caso de Manuel Chang não existe nenhuma acusação em Moçambique. Portanto, o pedido de extradição é para um suspeito e não para uma pessoa acusada. Daí que achamos que a ilegalidade no pedido da PGR fica cada vez mais evidente ao não apresentar aos moçambicanos uma acusação a respeito das violações de que Chang é acusado.
DW África:O FMO acredita que um eventual julgamento nos EUA seria mais neutro e credível?
DN: Acreditamos que sim. Principalmente agora, diante das evidências apresentadas no tribunal em Nova Iorque, que mostram claramente que altos níveis do Governo moçambicano, portanto, do partido FRELIMO, receberam suborno nessa fraude. Isto indica, claramente, que as chances de um julgamento em Moçambique ser justo e a favor do povo moçambicano são bastante nulas.
DW África: Se a decisão do ministro da Justiça sulafricano for pela extradição de Chang a Moçambique, que medidas devem ser tomadas pelo Fórum de Monitoria do Orçamento?
DN: O FMO não decidiu ainda que medidas irá tomar na eventualidade de Manuel Chang ser extraditado para Moçambique. É uma decisão que nós precisamos discutir.
Moçambique: O abecedário das dívidas ocultas
A auditoria independente de 2017 às dívidas ocultas não revela nomes. As letras do abecedário foram usadas para os substituir. Mas pelas funções chega-se aos possíveis nomes. Apresentamos parte deles e as suas ações.
Foto: Fotolia/Africa Studio
Indivíduo "A"
Supõe-se que Carlos Rosário seja o indivíduo "A" do relatório da Kroll. Na altura um alto quadro da secreta moçambicana que se teria recusado a fornecer as informações solicitadas pelos auditores da Kroll alegando que eram "confidenciais" e não estavam disponíveis. Rosário foi detido em meados de fevereiro no âmbito das dívidas ocultas. Há inconsistências nas informações fornecidas pelo indivíduo.
Foto: L. Meneses
Indivíduo "B"
Andrew Pearse é ex-diretor do banco Credit Suisse, um dos dois bancos que concedeu os empréstimos. No relatório da Kroll é apontado como um dos envolvidos nos contratos de empréstimos originais entre a ProIndicus e o Credit Suisse. De acordo com a justiça dos EUA, terá recebido, juntamente com outros dois ex-colegas, mais de 50 milhões de dólares em subornos e comissões irregulares.
Foto: dw
Indivíduo "C"
Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, assinou as garantias de empréstimo em nome do Governo moçambicano. Admitiu à auditoria que violou conscientemente as leis do orçamento ao aprovar as garantias para as empresas moçambicanas. Alega que funcionários do SISE convenceram-no a fazê-lo, alegando razões de segurança nacional. Hoje é acusado pela justiça dos EUA de ter cometido crimes financeiros.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
Indivíduo "D"
Maria Isaltina de Sales Lucas, na altura diretora nacional do Tesouro, terá coadjuvado o ministro das Finanças Manuel Chang, ou indivíduo "C", na arquitetura das dívidas ocultas. No Governo de Filipe Nyusi foi vice-ministra da Economia e Finanças, mas exonerada em fevereiro de 2019. Segundo o relatório, terá recebido 95 mil dólares pelo seu papel entre agosto de 2013 e julho de 2014 pela Ematum.
Foto: P. Manjate
Indivíduo "E"
Gregório Leão foi o número um do SISE, os Serviços de Informação e Segurança do Estado. O seu nome é apontado no relatório da Kroll e foi detido em fevereiro passado em conexão com o caso das dívidas ocultas.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "F"
Acredita-se que Lagos Lidimo, diretor do SISE, Serviços de Informação e Segurança do Estado, desde janeiro de 2017, seja o indivíduo "F". Substituiu Gregório Leão, o indivíduo "E". Na altura disse que não tinha recebido "qualquer registo relacionado as empresas de Moçambique desde que assumiu o cargo." A ONG CIP acredita que assumiu essa posição para proteger Filipe Nyusi, hoje chefe de Estado.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "K"
Salvador Ntumuke é ministro da Defesa desde de 2015. Diz que não recebeu qualquer registo relacionado com as empresas moçambicanas desde que assumiu o cargo. O relatório da Kroll diz que informações fornecidas pelo Ministério da Defesa, Ematum e a fornecedores de material militar não coincidem. Em jogo estariam 500 milhões de dólares. O ministro garante que não recebeu dinheiro nem equipamento.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "L"
Víctor Bernardo foi vice-ministro da Planificação e Desenvolvimento no Governo de Armando Guebuza. E na qualidade de presidente do conselho de administração da ProIndicus, terá assinado os termos e condições financeiras para a contratação do primeiro empréstimo da ProIndicus ao banco Credit Suisse, juntamente com Maria Isaltina de Sales Lucas.
Foto: Ferhat Momade
Indivíduo "R"
Alberto Ricardo Mondlane, ex-ministro do Interior, terá assinado em nome do Estado o contrato de concessão da ProIndicus, juntamente com Nyusi, Chang e Rosário. Um email citado pela justiça dos EUA deixa a entender que titulares de alguns ministérios moçambicanos envolvidos no caso, entre eles o do Interior, iriam querer a sua "fatia de bolo" enquanto estivessem no Governo.
Foto: DW/B . Jaquete
Indivíduo "Q"
Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa, seria identificado como indivíduo "Q" no relatório. Uma carta publicada em 2019 pela imprensa moçambicana revela que Nyusi terá instruído os responsáveis da Ematum, MAM e ProIndicus a fazerem o empréstimo. Afinal, parte dessas empresas estavam sob tutela do seu ministério. Hoje Presidente da República, Nyusi nunca esclareceu a sua participação no caso.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/M. Yalcin
Indivíduo "U"
Supõe-se que Ernesto Gove, ex-governador do Banco de Moçambique, seja o indivíduo "U". Terá sido uma das entidades que autorizou a contração dos empréstimos. E neste contexto, em abril de 2019 foi constituído arguido no processo judicial sobre as dívidas ocultas. Entretanto, em 2016 Gove terá dito que não tinha conhecimento do caso das dívidas. (galeria em atualização)