Caso Chang: Maputo recorre de sentença na África do Sul
Lusa | ms
6 de novembro de 2019
Moçambique vai recorrer contra a sentença que confere ao governo sul-africano o poder de extraditar para os Estados Unidos da América o ex-ministro das Finanças Manuel Chang, acusado de fraude e corrupção.
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"Temos instruções do nosso cliente para apelar da sentença e ordem do coletivo de juízes do Tribunal Superior (divisão de Gauteng)" relativa ao caso de Manuel Chang, "diretamente ao Tribunal Constitucional", le-se nota enviada esta terça-feira (05.11) ao ministro da Justiça da África do Sul pelo escritório de advogados Mabunda Incorporated.
De acordo com o documento assinado pelo advogado Samuel Modiba, a que a DW África teve acesso, os documentos para recorrer da sentença já estão a ser preparados.
Na passada sexta-feira (01.11), o Tribunal Superior de Gauteng, em Joanesburgo, ordenou ao atual ministro da Justiça da África do Sul, Ronald Lamola que decida se o ex-governante moçambicano e político da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), deve ser extraditado para os Estados Unidos ou para Moçambique.
Decisão sobre extradição de Chang "não surpreendeu"
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A decisão do Tribunal Superior de Gauteng foi comunicada no próprio dia ao atual ministro Lamola e as partes têm 15 dias para recorrer, disse à Lusa fonte da Justiça sul-africana.
Ronald Lamola solicitou em 13 de julho, após a sua nomeação pelo Presidente Cyril Ramaphosa, que a decisão do anterior ministro da Justiça fosse analisada e anulada por ser contrária às disposições da Lei de Extradição sul-africana e ao protocolo de extradição da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC).
Ex-ministro a favor da extradição de Chang para Moçambique
O anterior ministro Michael Masutha, que foi nomeado pelo ex-Presidente Jacob Zuma, por sua vez afastado do poder pelo seu partido, o Congresso Nacional Africano (ANC) em fevereiro, anunciou em 21 de maio, o seu último dia no Governo, a extradição de Manuel Chang para Moçambique. "O interesse da Justiça será mais bem servido ao atender ao pedido de extradição de Moçambique", disse então o ex-governante sul-africano.
No mandato de Masutha, o ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang enfrentou, no âmbito do caso das dívidas ocultas, dois pedidos de extradição - dos EUA e de Moçambique - quando gozava de imunidade parlamentar em Maputo. Desde então, o ex-governante renunciou ao lugar de deputado à Assembleia da República e perdeu a imunidade inerente ao cargo.
Manuel Chang encontra-se detido na África do Sul desde 29 de dezembro de 2018, a pedido da Justiça dos EUA, por fraude, corrupção e lavagem de dinheiro numa burla internacional de 2,2 mil milhões de dólares (cerca de dois mil milhões de euros), no chamado caso das dívidas ocultas.
Moçambique: O abecedário das dívidas ocultas
A auditoria independente de 2017 às dívidas ocultas não revela nomes. As letras do abecedário foram usadas para os substituir. Mas pelas funções chega-se aos possíveis nomes. Apresentamos parte deles e as suas ações.
Foto: Fotolia/Africa Studio
Indivíduo "A"
Supõe-se que Carlos Rosário seja o indivíduo "A" do relatório da Kroll. Na altura um alto quadro da secreta moçambicana que se teria recusado a fornecer as informações solicitadas pelos auditores da Kroll alegando que eram "confidenciais" e não estavam disponíveis. Rosário foi detido em meados de fevereiro no âmbito das dívidas ocultas. Há inconsistências nas informações fornecidas pelo indivíduo.
Foto: L. Meneses
Indivíduo "B"
Andrew Pearse é ex-diretor do banco Credit Suisse, um dos dois bancos que concedeu os empréstimos. No relatório da Kroll é apontado como um dos envolvidos nos contratos de empréstimos originais entre a ProIndicus e o Credit Suisse. De acordo com a justiça dos EUA, terá recebido, juntamente com outros dois ex-colegas, mais de 50 milhões de dólares em subornos e comissões irregulares.
Foto: dw
Indivíduo "C"
Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, assinou as garantias de empréstimo em nome do Governo moçambicano. Admitiu à auditoria que violou conscientemente as leis do orçamento ao aprovar as garantias para as empresas moçambicanas. Alega que funcionários do SISE convenceram-no a fazê-lo, alegando razões de segurança nacional. Hoje é acusado pela justiça dos EUA de ter cometido crimes financeiros.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
Indivíduo "D"
Maria Isaltina de Sales Lucas, na altura diretora nacional do Tesouro, terá coadjuvado o ministro das Finanças Manuel Chang, ou indivíduo "C", na arquitetura das dívidas ocultas. No Governo de Filipe Nyusi foi vice-ministra da Economia e Finanças, mas exonerada em fevereiro de 2019. Segundo o relatório, terá recebido 95 mil dólares pelo seu papel entre agosto de 2013 e julho de 2014 pela Ematum.
Foto: P. Manjate
Indivíduo "E"
Gregório Leão foi o número um do SISE, os Serviços de Informação e Segurança do Estado. O seu nome é apontado no relatório da Kroll e foi detido em fevereiro passado em conexão com o caso das dívidas ocultas.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "F"
Acredita-se que Lagos Lidimo, diretor do SISE, Serviços de Informação e Segurança do Estado, desde janeiro de 2017, seja o indivíduo "F". Substituiu Gregório Leão, o indivíduo "E". Na altura disse que não tinha recebido "qualquer registo relacionado as empresas de Moçambique desde que assumiu o cargo." A ONG CIP acredita que assumiu essa posição para proteger Filipe Nyusi, hoje chefe de Estado.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "K"
Salvador Ntumuke é ministro da Defesa desde de 2015. Diz que não recebeu qualquer registo relacionado com as empresas moçambicanas desde que assumiu o cargo. O relatório da Kroll diz que informações fornecidas pelo Ministério da Defesa, Ematum e a fornecedores de material militar não coincidem. Em jogo estariam 500 milhões de dólares. O ministro garante que não recebeu dinheiro nem equipamento.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "L"
Víctor Bernardo foi vice-ministro da Planificação e Desenvolvimento no Governo de Armando Guebuza. E na qualidade de presidente do conselho de administração da ProIndicus, terá assinado os termos e condições financeiras para a contratação do primeiro empréstimo da ProIndicus ao banco Credit Suisse, juntamente com Maria Isaltina de Sales Lucas.
Foto: Ferhat Momade
Indivíduo "R"
Alberto Ricardo Mondlane, ex-ministro do Interior, terá assinado em nome do Estado o contrato de concessão da ProIndicus, juntamente com Nyusi, Chang e Rosário. Um email citado pela justiça dos EUA deixa a entender que titulares de alguns ministérios moçambicanos envolvidos no caso, entre eles o do Interior, iriam querer a sua "fatia de bolo" enquanto estivessem no Governo.
Foto: DW/B . Jaquete
Indivíduo "Q"
Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa, seria identificado como indivíduo "Q" no relatório. Uma carta publicada em 2019 pela imprensa moçambicana revela que Nyusi terá instruído os responsáveis da Ematum, MAM e ProIndicus a fazerem o empréstimo. Afinal, parte dessas empresas estavam sob tutela do seu ministério. Hoje Presidente da República, Nyusi nunca esclareceu a sua participação no caso.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/M. Yalcin
Indivíduo "U"
Supõe-se que Ernesto Gove, ex-governador do Banco de Moçambique, seja o indivíduo "U". Terá sido uma das entidades que autorizou a contração dos empréstimos. E neste contexto, em abril de 2019 foi constituído arguido no processo judicial sobre as dívidas ocultas. Entretanto, em 2016 Gove terá dito que não tinha conhecimento do caso das dívidas. (galeria em atualização)