Caso Rufino: Angola julgará militares acusados do homicídio
Lusa | tms
25 de novembro de 2017
Rufino António foi morto durante protesto contra a demolição da casa dos pais, em Luanda, segundo testemunhas. O crime ocorreu em agosto de 2016. O julgamento ainda será marcado.
Familiares e conehcidos do menino Rufino prestaram homenagens a ele em agosto de 2016Foto: DW/P. Borralho
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O Ministério Público de Angola vai levar a tribunal pelo menos quatro militares das Forças Armadas Angolanas, um dos quais em prisão preventiva, acusados do homicídio de Rufino António, de 14 anos, que protestava contra a demolição da casa dos pais, em Luanda. O crime ocorreu em agosto de 2016.
A informação sobre a detenção do militar que está em prisão preventiva foi prestada esta sexta-feira (24.11) pelo procurador-geral da República, João Maria de Sousa, depois de uma reunião do Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público.
"Era ele [militar em prisão preventiva] o detentor da arma que efetuou o disparo que causou a morte do jovem Rufino. Os outros encontram-se em liberdade provisória", explicou o procurador.
João Maria de Sousa, que até 2 de dezembro deverá ser substituído no cargo de procurador-geral da República, acrescentou que o processo sobre este caso já foi remetido pelo Ministério Público para o Tribunal Provincial de Luanda, que deverá marcar uma data para o julgamento.
Demolições: área seria utilizada para a construção do novo Aeroporto Internacional de Luanda (foto de arquivo/2016)Foto: DW/P. Borralho
Homicídio indignou a sociedade
A 12 de agosto de 2016, centenas de populares juntaram-se, em Viana, arredores de Luanda, no funeral do "menino Rufino”. Rufino António foi morto com uma bala na cabeça.
"Nem no tempo da guerra se via isto, queremos Justiça", desabafava então, à agência de notícias Lusa, Ana Maria, uma das moradoras do bairro Walale, no Zango II, enquanto assistia às cerimónias fúnebres de Rufino Marciano António.
Caso Rufino não foi esquecido
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Por ali apontavam-se então responsabilidades aos militares, que já teriam demolido mais de 1.500 casas, alegando que foram construídas em terrenos do novo Aeroporto Internacional de Luanda.
"Era humilde, bom rapaz, social e um bom aluno. Tinha um grande futuro, mas que lhe foi cortado", contou à Lusa o avô, Gonçalves Canda.
"Vamos agora enterrá-lo sem saber o que aconteceu e porquê. Quem matou devia aparecer, para se fazer justiça, mas até agora nada", lamentou.
"População deve evitar afrontar os militares"
Tudo aconteceu na tarde de 5 de agosto de 2016, quando Rufino e outros moradores do bairro se juntaram para contestar as demolições – que deixaram milhares de pessoas desalojadas e que afetariam também a casa dos seus pais.
"O Estado-Maior General alerta a população para evitar afrontar os militares, com armas de fogo, como ocorreu nesse trágico acidente, onde foram capturadas duas armas", lê-se num comunicado emitido na altura pelas chefias da FAA.
"Aqui não havia armas. E um menino de 14 anos com duas armas era um Rambo", ironizou na altura o avô.
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".