Chapo no Ruanda para rever apoio militar, dizem analistas
28 de agosto de 2025
Daniel Chapo visita oficialmente o Ruanda num momento em que os insurgentes intensificam a sua presença em Cabo Delgado. A crescente insegurança na região volta a expor as limitações operacionais das Forças de Defesa e Segurança (FDS) moçambicanas.
Das forças ruandesas, altamente conceituadas pela sua eficácia no terreno, pouco se tem ouvido nos últimos meses. O silêncio é interpretado por analistas como o reflexo de atrasos nos pagamentos por parte de Maputo. Segundo a revista Africa Intelligence, as dívidas acumuladas rondariam entre dois a quatro milhões de dólares mensais.
O especialista em direito internacional Andre Thomashausen destaca as tensões persistentes entre Moçambique e o Ruanda.
"Houve largos meses em que Moçambique falhou nos pagamentos devidos para o estacionamento das unidades ruandesas em Cabo Delgado, mas agora parece que conseguiram encontrar as divisas para voltar a pagar", refere.
Ainda assim, Thomashausen levanta dúvidas sobre a eficácia da presença militar estrangeira: "Ficou em dúvida a segurança em Cabo Delgado", conclui.
Falta de transparência gera críticas
A revelação dos atrasos causou surpresa na opinião pública. Oficialmente, sabe-se que a União Europeia financia as operações ruandesas no norte de Moçambique, após um alegado lobby francês que beneficiaria, em cadeia, a multinacional TotalEnergies.
Confrontado pela imprensa moçambicana, o ministro da Defesa, Cristóvão Chume, não esclareceu o montante em dívida. Limitou-se a confirmar que alguns valores são pagos às tropas do Ruanda.
A falta de transparência neste dossier tem sido alvo de críticas por parte de investigadores e organizações da sociedade civil.
O pesquisador Borges Nhamire, que acompanha o conflito em Cabo Delgado, detalha os mecanismos de financiamento militar: "Existe o 'Joint Task Force' criado pela Anadarko para proteger os projetos de gás, operado pelas FDS. Quando a Total substituiu a Anadarko, passou a canalizar fundos diretamente para os Ministérios do Interior e da Defesa, que pagam aos militares e polícias destacados."
No entanto, continua Nhamire, um relatório encomendado pela Total recomendou a suspensão dos pagamentos diretos aos militares, por risco de envolvimento no conflito e "parte desse dinheiro passa a ser canalizado para as forças do Ruanda, que cumprem o mesmo papel que deveria ser desempenhado pelas Forças de Defesa e Segurança".
Segurança deteriora no terreno
A visita de Chapo a Kigali ocorre num contexto de aparente descontrolo da situação de segurança no norte do país. Há relatos de alastramento dos ataques para as províncias de Nampula, Zambézia e Tete.
Thomashausen aponta possíveis pedidos que o Presidente Chapo levou na bagagem, como por exemplo "mais empenho, reforço da presença militar, talvez condições mais favoráveis, em vez de pagamentos em dinheiro — pagamentos com oportunidades económicas, acesso a recursos ou até a administração portuária em Pemba", conjetura o especialista.
A transição de poder entre Filipe Nyusi e Daniel Chapo parece ter criado um vazio na gestão do dossier Cabo Delgado.
Os "operadores de milagres" — como são apelidadas as forças ruandesas — tornaram-se ausentes nos discursos oficiais. Curiosamente, a primeira visita internacional de Chapo após chegar à Presidência da República foi à Tanzânia e não ao Ruanda. Um gesto que pode sinalizar uma mudança na política de segurança herdada do seu antecessor.
Risco de dependência externa
O especialista em terrorismo Rufino Sitói alerta para os riscos de dependência externa, lembrando que "não se pode confiar numa força estrangeira".
"O Ruanda enfrenta as suas próprias dificuldades. Kagame está com saúde um pouco questionável, e isso pode afetar o nível de confiança que as tropas e generais têm em Moçambique", alerta.
Sitói chama ainda a atenção para a fragilidade legal do acordo firmado entre Nyusi e Kagame, que não passou pelo Parlamento e foi conduzido em sigilo: "Tudo é muito individualizado. O facto de este assunto ter sido conduzido de forma sigilosa pelos Presidentes Nyusi e Kagame afeta a qualidade da implementação."
Segundo o analista, decisões fundamentais ainda estão pendentes. "Hoje, a decisão sobre a continuidade [ainda terá de ser tomada], assim como [a definição] dos termos de referência."
Será que o Governo de Chapo teria interesse em corrigir os manifestos atropelos do seu antecessor?