Ao comentar caso Manuel Chang, responsável dos Negócios Estrangeiros da África do Sul afirma que "não afeta" relações com Moçambique. Sobre Andre Hanekom, ministra defende a independência do judiciário moçambicano.
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"Temos relações extremamente boas com Moçambique, como temos com todos os nossos vizinhos. Essas são pessoas que cuidaram de nós e nos ajudaram no momento mais difícil de nossa luta, nos relacionamos com eles como nossos países irmãos e eles nos chamam sempre que precisam do nosso apoio", declarou a ministra sul-africana das Relações Internacionais e Cooperação aos microfones da DW África.
Lindiwe Sisulu iniciou assim sua resposta à pergunta da DW África sobre o estágio atual das relações bilaterais entre os dois países, depois da morte do empresário sul-africano Andre Hanekom, em Cabo-Delgado - acusado de financiar a insurgência naquele ponto do país - e da detenção do ex-ministro moçambicano das Finanças, Manuel Chang, na África do Sul. Chang é acusado de fraude e lavagem de dinheiro pelos Estados Unidos, no âmbito da investigação às dívidas ocultas em Moçambique.
Caso Hanekom
Depois de uma detenção irregular, segundo a lei moçambicana, efetuada por militares na província nortenha de Cabo Delgado e após subsequente detenção pela polícia, o empresário sul-africano Andre Hanekom acabou por perder a vida no Hospital Provincial de Pemba.
No dia 19 de janeiro teve convulsões, o que obrigou a sua evacuação para o hospital e no dia 23 morreu.
A este respeito, a chefe da diplomacia sul-africana, disse que o Governo sul-africano foi informado “quase que imediatamente, quando o sr. Hanekom foi preso e as acusações foram feitas a ele”, acrescentando que “da mesma forma que temos um sistema judiciário independente, Moçambique também tem".
Lindiwe Sisulu contou ainda detalhes do processo de acompanhamento da detenção do empresário em Moçambique.
"Enviamos nosso alto comissário com residência em Moçambique para visitar o sr.Hanekom e ele assim o fez, de forma a estarmos certos de que ele estava bem de saúde e a apurar seus pontos de vista", revelou.
Segundo a ministra, o caso foi acompanhado também pelo Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, que "conversou com o Presidente de Moçambique [Filipe Nyusi] sobre este assunto".
"Ficaram tristes com a morte do sr.Hanekom. O alto comissário estava lá e nós poderíamos lidar com esse assunto.Seria muito inoportuno para nós lidarmos com este assunto agora, porque não estou certa de qual é o curso de ação - da família dele ou do Governo moçambicano", justificou a ministra.
Detenção de Manuel Chang
A ministra Sisulu justificou ainda o procedimento de seu país na detenção do ex-ministro moçambicano das Finanças, Manuel Chang, detido a 29 de dezembro de 2018 no Aeroporto Internacional O. R. Tambo, em Joanesburgo, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos a 27 dezembro.
"Somos signatários de todos os protocolos da Interpol e fomos solicitados pela Interpol a interceptá-lo quando chegasse ou partisse da África do Sul e o guardar, porque há acusações contra ele que tem que responder. Temos o compromisso de fazer isso e fizemos", disse.
De acordo com Sisulu, Changa "está atualmente sob custódia" numa prisão. "Acho que o caso está em andamento", comentou.
"Nós tivemos ocasião de examinar as suas circunstâncias e tivemos a ocasião também de verificar quais são as suas preocupações e nós o mudamos para uma cela privada", relatou a responsável sul-africana.
De acordo com Sisulu, Manuel Chang "passará pelos processos legais necessários que são requeridos para o seu caso".
"Isso não afeta o Governo moçambicano ou as nossas relações com Moçambique.A solicitação veio da Interpol e nós respondemos à Interpol", concluiu a ministra sul-africana das Relações Internacionais e Cooperação.
Tanto os Estados Unidos quanto Moçambique pediram a extradição de Chang, mas as autoridades sul-africanas ainda não decidiram a este respeito.
Cabo Delgado: Datas marcantes dos ataques armados
Começaram em outubro de 2017 em Mocímboa da Praia e já se alastraram a outros três distritos moçambicanos. Os ataques armados na província de Cabo Delgado, que somam já mais de 130 mortos, ainda não têm solução à vista.
Foto: DW/G. Sousa
Outubro de 2017
Os primeiros ataques de grupos armados desconhecidos na província de Cabo Delgado aconteceram no dia 5 de outubro de 2017 e tiveram como alvo três postos da polícia na vila de Mocímboa da Praia. Cinco pessoas morreram. Cerca de um mês depois, a 17 de novembro, as autoridades dão ordem de encerramento a algumas mesquitas por se suspeitar terem sido frequentadas por membros do grupo armado.
Foto: Privat
Dezembro de 2017
Surgem novos relatos de ataques nas aldeias de Mitumbate e Makulo, em Mocímboa da Praia. Na primeira semana de dezembro de 2017, terão sido assassinadas duas pessoas. Vários suspeitos foram identificados, tendo os moradores dado conta que os atacantes deram sinais de afiliação muçulmana. Por sua vez, a polícia desmentiu o envolvimento do grupo terrorista Al-Shabaab nestes ataques.
Foto: DW/G. Sousa
Janeiro a maio de 2018
Apesar de ter começado calmo, 2018 revelar-se-ia um ano de terror na província de Cabo Delgado com os ataques a alastrarem-se a mais distritos. Dada a gravidade da situação, a Assembleia da República aprovou, a 2 de maio, a Lei de Combate ao Terrorismo. Mas, no final do mês, dia 27, novos ataques foram realizados junto a Olumbi, distrito de Palma. Dez pessoas morreram, algumas decapitadas.
Foto: Privat
2 de junho de 2018
Dias mais tarde, a televisão STV dava conta que as forças de segurança moçambicanas haviam abatido, nas matas de Cabo Delgado, oito suspeitos de participação nos ataques. Foram ainda apreendidas catanas e uma metralhadora AK-47, além de comida e um passaporte tanzaniano. Por esta altura, já milhares de pessoas haviam abandonado as suas casas, temendo a repetição dos episódios de terror.
Foto: Borges Nhamire
4 de junho de 2018
Ainda se "festejava" os avanços na investigação das autoridades, e consequente abate dos suspeitos quando, a 4 e 7 de junho, se registaram novos incêndios nas aldeias de Naunde e Namaluco. Sete pessoas morreram e quatro ficaram feridas. Foram ainda destruídas 164 casas e quatro viaturas. O mesmo cenário voltou a repetir-se a 22 de junho: um novo ataque na aldeia de Maganja matou cinco pessoas.
Foto: Privat
29 de junho de 2018
Fortemente criticado por não se ter ainda pronunciado acerca dos ataques, o Presidente moçambicano Filipe Nyusi resolve fazê-lo, em Palma, perante um mar de gente. Oito meses e 33 mortos [25 vítimas dos ataques e oito supostos atacantes] depois... Em Cabo Delgado, Nyusi prometeu proteção aos cidadãos e convidou os atacantes a dialogar consigo, de forma a resolver as suas "insatisfações".
Foto: privat
Agosto de 2018
Depois de, em julho, um novo ataque à aldeia de Macanca - Nhica do Rovuma, em Palma, ter feito mais quatro mortos, Filipe Nyusi desafiou, a 16 de agosto, os oficiais promovidos no exército, por indicação da RENAMO, a usarem a sua experiência no combate contra estes grupos armados que, mais tarde, a 24 do mesmo mês, tirariam a vida a mais duas pessoas, na aldeia de Cobre, distrito de Macomia.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Setembro de 2018
Setembro de 2018 voltava a ser um mês negro no norte de Moçambique. Ataques nas aldeias de Mocímboa da Praia, Ntoni e Ilala, em Macomia, deixaram pelo menos 15 mortos e dezenas de casas destruídas. No final do mês, o ministro da Defesa, Atanásio Mtumuke, afirmou que os homens armados responsáveis pelos ataques seriam "jovens expulsos de casa pelos pais".
Foto: Privat
Outubro de 2018
Um ano após o início dos ataques em Cabo Delgado, a polícia informou que os mais de 40 ataques ocorridos, haviam feito 90 mortos, 67 feridos e destruído milhares de casas. Foi também por esta altura que Filipe Nyusi anunciou a detenção de um cidadão estrangeiro suspeito de recrutar jovens para atacar as aldeias. No final do mês, começaram a ser julgados 180 suspeitos de envolvimento nos ataques.
Foto: privat
Novembro de 2018
Novos relatos de mortes macabras surgem na imprensa. Seis pessoas foram encontradas mortas com sinais de agressão com catana na aldeia de Pundanhar, em Palma. Dias depois, o cenário repetiu-se nas aldeias de Chicuaia Velha, Lukwamba e Litingina, distrito de Nangade. Balanço: 11 mortos. Em Pemba, o embaixador da União Europeia oferecia ajuda ao país.
Foto: Privat
6 de dezembro de 2018
A população do distrito de Nangade terá feito justiça pelas próprias mãos e morto três homens envolvidos nos ataques. Na altura, à DW, David Machimbuko, administrador do distrito de Palma, deu conta que "depois de um ataque, a população insurgiu-se e acabou por atingir alguns deles". Entretanto, o Ministério Público juntou mais nomes à lista dos arguidos neste caso. Entre eles está Andre Hanekom.
Foto: DW/N. Issufo
16 de dezembro de 2018
A 16 de dezembro, e após mais um ataque armado no distrito de Palma, que matou seis pessoas, entre as quais uma criança, Moçambique e Tanzânia anunciaram uma união de esforços no combate aos crimes transfronteiriços. 2018 chegava assim ao fim sem uma solução à vista para os ataques que já haviam feito, pelo menos, 115 mortos. O julgamento dos já acusados de envolvimento nos ataques continua.
Foto: privat
Janeiro de 2019
O novo ano não começou da melhor forma. Sete pessoas morreram quando um grupo armado intercetou uma carrinha de caixa aberta que transportava passageiros entre Palma e Mpundanhar. Na semana seguinte, outras sete pessoas foram assassinadas a tiro no Posto Administrativo de Ulumbi. Um comerciante foi ainda decapitado em Maganja, distrito de Palma, no passado dia 20.