O ciclone Idai veio confirmar a posição de vunerabilidade em que se encontra a cidade moçambicana da Beira, a segunda maior do país. Do ponto de vista ambiental várias perguntas continuam sem resposta.
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O desaparecimento da cidade moçambicana da Beira é algo já previsto por estudos. E agora com a passagem do ciclone Idai confirma-se a posição de vulnerabilidade em que se encontra a segunda maior cidade de Moçambique.
Sob o ponto de vista ambiental várias perguntas vem ao de cima na sequência do ciclone: por exemplo, a transferência do Chiveve, como também é conhecida a cidade, ou parte dela para outro lugar geograficamente mais ajustado a habitação humana seria uma hipótese a ser colocada em cima da mesa?
A região onde se edificou a cidade da Beira provavelmente não terá sido a mais ideal. Surgiu por volta de 1880 nas proximidades de dunas ao longo do estuário do rio Pungué e numa área abaixo do nível do mar. Isso deixa a cidade vulnerável a erosão e as ondas do mar, e com a ação humana, como a pressão habitacional de vária ordem, por exemplo, essa fragilidade aumenta. Mais de um milhão de pessoas habitam a cidade que inicialmente estava preparada para pouco mais de 30 mil.
Erosão tem vindo a engolir a cidade
Por outro lado, a erosão há tempos que anda a engolir a cidade, como afirma em entrevista à DW África, o ambientalista moçambicano Carlos Serra Jr. .
"A cidade da Beira já vinha há muitos anos apresentando sinais, se monitorarmos a linha de costa, basta compararmos imagens de satélite, percebemos que há um encolhimento há vários anos a acontecer, há uma redução da superfície e isso vê-se particularmente na costa. As dunas a recuarem, a perderem-se, as praias a deslocarem-se em direção ao interior do território, sinais de erosão um pouco por todo o lado."
Por termo a erosão requer igualmente ação preventiva do Homem e isso passa principalmente por acesso a meios financeiros e ao que tudo indica não há nas proporções necessárias. O pouco feito até agora não é significativo, entende o ambientalista ao alertar que "a linha de defesa que é formada por alguns meios humanos como paredões, quebra-marés construídos ao longos dos anos, também dunas com ou sem vegetação, esta linha de defesa é precária neste momento, está altamente ameaçada. E atenção, parte da cidade é zona húmida, estamos a falar de zonas com água. Logo a partida se continuarmos a construir em zonas húmidas vai haver uma fatura a pagar. As pessoas correm o risco de ficar sem nada ou ficar seriamente vulneráveis. E acho que este tipo de debate tem de acontecer a seguir, o que é muito importante...", sublinha o ambientalista.
Maputo: Solidariedade às vítimas do ciclone
01:27
Beira está condenada
Nessas condições a cidade fica mais vulnerável a eventos naturais de grande intensidade como tempestades tropicais e ciclones, como aconteceu por exemplo quando foi atingida pelo ciclone Idai a 14 de março, 90% da cidade ficou arrasada. E numa era em que os eventos resultantes das mudanças climáticas são cada vez mais frequentes talvez não seria exagero afirmar que Beira é um lugar condenado. E há estudos que já prevêm cenários desastrosos para a cidade, como conta Serra:
Ciclone Idai: Consequências ambientais nefastas para a Beira
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"A Beira tem um aspeto que temos que saber, de acordo com um estudo feito pelo INGC (Instituto Nacional de Gestão de Calamidades) em 2009, em termos de subida do nível do mar revelavam que parte da cidade até 2030 estaria submersa. Em termos de recomendações, depois das águas [do ciclone Idai] acalmarem quero acreditar que haja uma necessidade de se redesenhar a ideia de termos de continuar a insistir e a investir no edificado em zonas que são vulneráveis."
É tempo para começar a pensar no futuro de toda a organização administrativa da cidade, defende ainda o ambientalista:
"E Isto pode significar inclusivamente, porque não? Transferir parte da população para outras áreas definitivamente e parte dos serviços. Temos de ver em termos de projeções as áreas mais seguras nos próximos tempos e isto é uma coisa que pode estar na mesa no futuro", conclui Carlo Serra Jr..
Ciclone Idai: Crise humanitária no centro de Moçambique
Pelo menos 447 pessoas morreram e centenas de milhares ficaram desalojadas devido a ciclone Idai. É a "pior crise humanitária na história recente de Moçambique", diz a Cruz Vermelha. Autoridades temem eclosão de doenças.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Tragédia em Moçambique
Todos os dias continuam a chegar pessoas a centros de acolhimento, todos os dias são anunciados mais mortos no centro de Moçambique. A extensão dos danos provocados pelo ciclone Idai ainda não é totalmente conhecida. O último balanço das autoridades aponta para, pelo menos, 447 mortos e centenas de milhares de pessoas afetadas.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Vítimas esperam e desesperam
Há pessoas nos telhados à espera de ajuda, mais de uma semana depois da passagem do ciclone Idai. E a ajuda muitas vezes "não chega", diz Anabela Lemos, da organização não-governamental moçambicana Justiça Ambiental. "O povo precisa de uma resposta de emergência agora mesmo para sobreviver a esta crise", conclui.
Foto: Reuters/M. Hutchings
Destruição
O ciclone Idai destruiu uma área superior a 3.000 quilómetros quadrados (cerca de dez vezes a área da cidade de Maputo), estimam as autoridades moçambicanas. Dezenas de milhares de casas ficaram destruídas. O ciclone destruiu ainda estradas e pontes, e árvores e postes caíram nas vias, impedindo a circulação de veículos.
Foto: Reuters/M. Hutchings
"Emergência de mais alto nível"
O Programa Alimentar Mundial (PAM) das Nações Unidas diz que a situação no centro de Moçambique é "uma emergência de mais alto nível". A Beira foi a cidade mais afetada. O Governo e organizações não-governamentais têm distribuído ajuda à população. O PAM já deu assistência alimentar de emergência a mais de 115 mil pessoas. Mas as vítimas continuam a alertar que falta comida.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Acesso a comida e água potável
A diretora-executiva da UNICEF Portugal alertou que a situação em Moçambique é "avassaladora". Segundo Beatriz Imperatori, há "milhares de crianças desamparadas e que necessitam de apoio alimentar, de abrigo e de condições de saneamento com caráter de urgência". Helicópteros lançam biscoitos energéticos em zonas isoladas pelas águas. A falta de acesso a água potável é também uma preocupação.
Foto: Reuters/Josh Estey/Care International
Receio de eclosão de doenças
As autoridades temem a eclosão de doenças devido às águas paradas e à falta de saneamento básico. Daviz Simango, edil da Beira, disse em entrevista à agência de notícias Lusa que há registo de várias mortes com sintomas de cólera. E teme-se um "pico" de casos de malária. A Organização Mundial de Saúde aprovou o envio para a região de 900 mil vacinas orais contra a cólera. E são precisas latrinas.
Foto: Reuters/M. Hutchings
Extensão das inundações
A vermelho é possível ver a extensão das inundações na zona da Beira. A UNICEF alerta que os países afetados pelo ciclone Idai - Moçambique, Zimbabué e Malawi - não conseguem dar conta dos estragos. Por isso, as Nações Unidas pedem que os apoios externos sejam canalizados para a reconstrução de infraestruturas e para o "repensar da economia", diversificando as fontes de rendimento dos cidadãos.
Foto: ESA
Resgate e apoio financeiro
As operações de resgate continuam para encontrar sobreviventes do ciclone em zonas remotas. As Nações Unidas pediram 282 milhões de dólares para apoiar Moçambique nos próximos três meses - para água potável, saneamento, educação e reabilitação dos meios de subsistência dos populares.
Foto: Getty Images/AFP/M. Vermaak
Esforço conjunto
Todos os dias, pessoas são resgatadas. Camiões tentam levar ajuda humanitária a quem precisa, apesar das más condições das estradas na cidade da Beira. Há também um esforço para reconstruir esta localidade o mais depressa possível: a autarquia da Beira autorizou a reconstrução de casas e infraestruturas destruídas pelo ciclone Idai, sem ser necessária uma licença prévia das autoridades.
Foto: pictur- alliance/AP Photo/CARE/J. Estey
Gestão da ajuda às vítimas
A Cruz Vermelha diz que está a ser montado um hospital de campanha na Beira e há outro a chegar. Deverá também chegar um sistema de saneamento e uma unidade de purificação de água para milhares de pessoas. A cidade tem recebido ajuda um pouco de todo o lado. O Centro de Integridade Pública pede que a sociedade civil ajude a gerir os apoios às vítimas do ciclone Idai, para garantir transparência.