"Sentimos que há todo um povo que está de mãos dadas", diz um envolvido na campanha de mobilização de ajuda humanitária às vítimas do ciclone Idai. Só humanismo? Sociólogo fala em aumento de consciência da sociedade.
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Entre milhares de palavras de conforto e moralização neste momento em que o centro de Moçambique vive uma tragédia sem precedentes há um gesto de amor ao próximo: a mobilização de ajuda concreta para as vítimas do ciclone Idai que fustigou o país na última quinta-feira (14.03.). Nas redes sociais há uma explosão de humanismo, desde iniciativas individuais dispersas a coletivas.
Através de um desses guias de apoio a DW África ouviu um dos mentores de um coletivo: Alvim Cossa do Grupo de Teatro do Oprimido: "Estamos felizes porque cidadãos comuns, sem recursos estão a dar um pouco do seu contributo. Estamos a receber pequenos sacos de plástico com uma camiseta, um par de sapatos..."
"O cidadão comum está bastante mobilizado e sensibilizado e acredito que ao longo do dia de hoje e provavelmente ao longo do dia de amanhã, quanto mais se espalha esse apelo de solidariedade, que a participação seja maior. Sentimos que há todo um povo que de mãos dadas procura contribuir para minimizar essa situação", acredita Cossa.
Disseminação da campanha é problema no distrito
E a solidariedade chega de todos os cantos do país, até de regiões consideradas com menos recursos. A Associação dos Jovens Empreendedores da Manhiça, distrito da província de Maputo, é parte do coletivo de apoio e revela que embora na Manhiça as coisas se processem numa dinâmica diferente das grandes cidades a vontade de apoiar os irmãos do centro não esmorece.
Ciclone Idai: Quando o primeiro abraço solidário é de dentro
Nelson Nhocho é membro e conta que "a maioria das pessoas estão sensibilizadas, mas porque não temos muitas condições para prolongar a informação, por se tratar de um distrito, está um pouco complicado. Mas em termos de sensibilização estamos a lutar nas redes sociais, e as pessoas mostram interesse."
Défice de alimentos não perecíveis e material escolar
Na campanha iniciada nesta segunda-feira (18.03.) o coletivo faz pedidos específicos, em função das necessidades das vítimas. O que os residentes do distrito da Manhiça mais doam, segundo Nhocho são"alguns utensílios domésticos e roupas".
A boa vontade é o que mais importa na campanha de solidariedade. E embora tenha iniciado recentemente, os mentores já perceberam que da lista dos pedidos há mais respostas para alguns itens do que para outros.
Alvim Cossa revela o que "os alimentos não perecíveis e o material escolar continuam a ser o maior défice, mas acreditamos que as coisas vão melhorar porque as pessoas vão se sensibilizando e se comovendo cada vez mais."
E crê no seguinte: "As imagens que nos vão chegado da tarde e noite de ontem, o apelo feito feito pelo chefe de Estado acho que irá mexer cada vez mais com os corações dos moçambicanos e queremos acreditar que haverá uma maior contribuição."
Sociedade mais consciente?
As calamidades naturais têm sido uma constante em Moçambique, mas em nenhuma delas se percebeu uma mobilização social tão grande quanto esta que visa ajudar as vítimas do Ciclone Idai. Naturalmente que com o advento das redes sociais a palavra ganhou asas maiores para chegar a todos os cantos.
Será apenas o humanismo que reside nos corações dos moçambicanos o motor de tão nobre gesto? O sociólogo Obed Balói explica esta onda excepcional de solidariedade: "Temos uma situação excecional, mas o país e a sociedade tornaram-se mais conscientes, o Estado organizou-se melhor, a sociedade está mais consciente dessa vulnerabilidade a fenómenos extremos e o que se vê penso que é o reflexo disso. As pessoas reagiram logo tomando diferentes e múltiplas iniciativas de solidariedade."
Esta onda de solidariedade atingiu também empresas públicas. Por exemplo, a companhia aérea de bandeira nacional , LAM, oferece transporte gratuito de ajuda material e a maior hidroelétrica do país ofereceu 4 milhões de meticais. A procura por soluções internas parece ser a principal aposta, substituindo a opção primeira de estender a mão a ajuda externa como tem sido habitual em momentos de crise. Uma moda que veio para ficar?
Ciclone Idai causa mortes e destruição
Ciclone Idai faz mais de 200 mortos em Moçambique, no Zimbabué e no Malawi. Cerca de 90% da cidade moçambicana da Beira foi destruída com a passagem do ciclone Idai, segundo a Cruz Vermelha.
Foto: picture-alliance/AP/C. Haga
Ciclone Idai faz mais de 200 mortos
A passagem do ciclone Idai afetou mais de 1,5 milhões de pessoas em Moçambique, no Zimbabué e no Malawi, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU). Mais de 200 pessoas morreram nos três países e milhares estão desalojadas. O levantamento do número de vítimas está por concluir, dado que há locais de difícil acesso devido à subida do nível dos rios.
Foto: picture-alliance/AP/C. Haga
Beira é a cidade mais atingida de Moçambique
Há pelo menos 84 mortos em Moçambique, segundo os últimos dados. Mas o Presidente Filipe Nyusi afirma que "tudo indica que poderemos registar mais de mil óbitos". A cidade da Beira foi a mais afetada. Os ventos e chuvas fortes deixaram a cidade parcialmente destruída, sem luz nem telecomunicações.
Foto: Getty Images/AFP/A. Barbier
Ciclone visto do espaço
Esta imagem de satélite feita pela NASA mostra a passagem do ciclone Idai pelos países africanos. "A situação é terrível, a magnitude da devastação é enorme", disse o líder da equipa de avaliação da Cruz Vermelha na Beira, Jamie LeSueur. "Enquanto o impacto físico do Idai começa a emergir, as consequências humanas ainda não estão claras", lê-se num comunicado.
Foto: NASA
Deslocados à procura de abrigo
Milhares de pessoas estão desalojadas na zona centro de Moçambique. O Presidente Filipe Nyusi, que sobrevoou a região, indicou que aldeias inteiras desapareceram nas enchentes e que há regiões totalmente incomunicáveis. "Vimos durante o voo corpos flutuando, um verdadeiro desastre humanitário de grandes proporções", assinalou o chefe de Estado.
Foto: DW/B. Chicotimba
Estrada de acesso à cidade da Beira fechada
Com as fortes chuvas, o nível dos rios subiu. Um deles, o rio Haluma, transbordou e cortou a estrada nacional 6, espinha dorsal do centro de Moçambique e única via de acesso à Beira. A cidade ficou isolada. Em entrevista à AFP, o ministro do Meio Ambiente de Moçambique, Celso Correia, afirmou que "este é o maior desastre natural ocorrido no país".
Foto: DW/A. Sebastião
Motoristas isolados na estrada
Isolados na estrada nacional 6, única via de acesso à Beira, moçambicanos aguardam até que a via seja desbloqueada. Formou-se uma longa fila de camiões e outros veículos. Os ventos fortes derrubaram postes.
Foto: DW/A. Sebastião
Noutras vias, mais destruição
A estrada número 260, que liga Chimoio a Mossurize, também não escapou à intempérie. A ponte sobre o rio Munhinga foi arrastada, isolando os dois distritos. Formaram-se enormes buracos nas rodovias, a isolar zonas de Moçambique e a dificultar o acesso às equipas de socorro.
Foto: DW/B. Chicotimba
A fúria das águas
A ponte sobre o rio Haluma, em Nhamatanda, zona central de Moçambique, ficou submersa. É mais uma zona afetada pelas cheias e pelo nível elevado dos rios. Uma camioneta que transportava dez pessoas foi arrastada ao passar pelo local. Seis pessoas morreram e quatro conseguiram salvar-se, penduradas em cima de um camião basculante.
Foto: DW/B. Chicotimba
População precisa de ajuda médica
Mais de cem salas de aulas ficaram destruídas nas regiões mais afectadas pelo ciclone e cheias nos distritos moçambicanos de Chinde, Maganja da Costa, Namacurra e Nicoadalá. Em visita à Zambézia, o Presidente Filipe Nyusi afirmou que, além de bens alimentares, a população necessita também, com prioridade, de assistência médica.
Foto: DW/M. Mueia
Ciclone Idai leva a cancelamento de voos
A passagem do fenómeno também afetou os transportes aéreos. O aeroporto da Beira ficou inoperante entre quinta-feira (14.03.) e domingo (17.03). Todos os voos domésticos foram suspensos. Dezenas de voos previstos para descolar do aeroporto internacional de Maputo, o maior de Moçambique, foram cancelados. O fecho dos aeroportos também dificultou a chegada de ajuda humanitária.
Foto: Getty Images/AFP/E. Josine
Depois de Moçambique, Zimbabué e Malawi
O ciclone Idai atingiu a Beira na quinta-feira (14.03), tendo seguido depois para oeste, em direção ao Zimbabué e ao Malawi, afetando mais milhares de pessoas, em particular nas zonas orientais da fronteira com Moçambique. Casas, escolas, empresas, hospitais e esquadras ficaram destruídas. Estradas e pontes desapareceram, o que dificulta os trabalhos de resgate.
Foto: picture-alliance/S. Jusa
Plantações devastadas pela força do ciclone
No Zimbabué, o número de mortos após a passagem do ciclone Idai chega a 82. O Presidente Emmerson Mnangagwa disse que a resposta do Governo está a ser coordenada pelo Departamento de Proteção Civil através dos comités de Proteção Civil nacional, provincial e de distrito, com o apoio de parceiros humanitários.
Foto: picture-alliance/S. Jusa
Ciclone Idai chega ao Malawi
Os distritos de Chikwawa e Nsanje, no Malawi, ficaram inundados com a passagem do ciclone Idai. Segundo o balanço mais recente do Departamento de Gestão de Riscos, no país foram registadas 56 mortes. Quase 1 milhão de pessoas foram afetadas pela passagem do ciclone. De acordo com a Federação Internacional da Cruz Vermelha, 80 mil viram as suas casas destruídas e estão sem onde se refugiar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Gumulira
Cheias nos rios aumentam risco de doenças
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já alertou as autoridades para a importância de se levar a cabo um levantamento dos estragos nos serviços de saúde, já que o agravamento das cheias nos próximos dias, devido à continuação de chuvas fortes, aumenta o risco do aparecimento de doenças transmissíveis pela água e pelo ar.