Cientistas tentam desenvolver vacina contra zika
19 de julho de 2018A epidemia do vírus zika levou a Organização Mundial de Saúde (OMS) a declarar uma emergência global de saúde pública em 2016. Na altura, só em Cabo Verde, foram registados mais de 7.000 casos suspeitos de infeção pelo vírus, transmitido por mosquitos Aedes Aegypti. No Brasil, o Ministério da Saúde suspeitou de 260 mil infeções.
Nas Américas, o alastramento da doença desafia os cientistas a desenvolver uma vacina eficaz. Centros especializados no Brasil, Estados Unidos da América, Colômbia, Costa Rica, Equador, México, Panamá, Peru e Porto Rico estão a trabalhar em conjunto. A expetativa é que os resultados sejam conhecidos dentro de dois anos.
"Por quê essa escolha? Porque muito provavelmente esperamos que outras epidemias do vírus zika aconteçam em regiões mais quentes, especialmente nas Américas, onde o vírus está a circular com muita intensidade desde 2015", explica Esper Kallas, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e coordenador da produção das vacinas na cidade brasileira.
Segundo Kallas, a vacina é segura. Os resultados preliminares da primeira fase de testes, com animais, foram satisfatórios e publicados na Science, uma das revistas de pesquisa científica mais influentes do mundo.
"Mais de uma centena de pessoas já receberam as doses da vacina. A produção de anticorpos nos participantes do que chamamos de fase 1 é observada com sucesso", diz.
"É uma vacina muito segura. É um novo conceito, que traz um desenvolvimento absolutamente inovador. Esperamos que vacinas como essa possam, no futuro, não só combater o vírus zika, mas também muitas outras doenças infeciosas", acrescenta o especialista.
Voluntários
A vacina já foi testada com sucesso em animais e está na fase de testes em humanos. Para os estudos continuarem, é preciso voluntários. No laboratório da FMUSP, são necessários 220 homens e mulheres saudáveis entre os 15 e 35 anos.
"Essa população está exatamente no intervalo que mais concentra a idade reprodutiva. E está aí a grande ameaça do zika: quando uma mulher está grávida e é infetada, o vírus pode ser transmitido para o bebé e causar malformações, inclusive microcefalia. Saber se a vacina pode proteger contra o zika é especialmente importante para essa faixa etária", afirma o médico.
Em todos os centros de pesquisa envolvidos, espera-se contar com 2.400 voluntários para testar a vacina. Os voluntários passarão por uma bateria de exames e, comprovado o bom estado de saúde, receberão três doses da vacina e serão acompanhados até 2019.
O médico Jorge Kalil, professor de Imunologia Clínica e Alergia da FMUSP e ex-presidente do Instituto Butantan, um dos principais institutos produtores de vacinas no Brasil, explica que, se houver um novo surto em algum dos países em que a vacina é testada em menos de dois anos, a resposta sobre a eficácia poderá ser observada mais rapidamente, uma vez que os vacinados estarão em contato com o vírus num ambiente natural.
"Como a incidência da doença provocada pelo zika é baixa atualmente, ainda se necessita de muitos voluntários para os testes em laboratório", explica Kalil.
O primeiro caso de zika nas Américas ocorreu no nordeste do Brasil e foi notificado em maio de 2015. Em fevereiro de 2016, o vírus já havia infetado populações de 28 países da América Latina e do Caribe.
A doença passou a ser tratada como emergência global de saúde, quando se provou a relação do vírus zika com o aumento de casos de microcefalia no Brasil. A microcefalia afeta o desenvolvimento e crescimento do cérebro da criança, causando severas sequelas mentais e motoras para o resto da vida.