Moçambique: ONG promovem "cimeira alternativa" sobre gás
Lusa
12 de novembro de 2019
Sociedade civil quer ir além dos negócios no debate sobre os megaprojetos. Para isso, ONG promovem encontro em Maputo à margem da 6ª Cimeira do Gás de Moçambique, promovida pela Empresa Nacional de Hidrocarbonetos.
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Um grupo de organizações da sociedade civil moçambicana vai apelar esta terça-feira (12.11) a um debate inclusivo sobre os megaprojetos de exploração de gás no país, numa "cimeira alternativa" ao encontro de negócios que decorre, a partir de quarta-feira, em Maputo.
"A cimeira empresarial tem um sentido exclusivo, porque acarreta elevados custos" de inscrição e o que se discute "são negócios", disse Camilo Nhancale, diretor executivo da Kuwuka - Juventude Desenvolvimento e Advocacia Ambiental.
Em consequência, "temas como impactos sociais, económicos e ambientais resultantes dos investimentos são negligenciados", acrescentou o dirigente da organização não-governamental (ONG).
O encontro alternativo promovido pelas ONG, na capital, tem a designação "Nossos recursos, nossa riqueza, nossa inclusão", e arranca um dia antes da 6.ª Cimeira do Gás de Moçambique, que decorre quarta e quinta-feira.
A sexta cimeira é promovida pela Empresa Nacional de Hidrocarbonetos (ENH), em parceria com uma empresa internacional de organização de eventos do setor energético (CWC Group).
Exploração VS Desenvolvimento
As ONG pretendem discutir o contexto geral da indústria extrativa, considerando que o Estado moçambicano é "generoso" nas isenções fiscais, o que faz com que a exploração de recursos não se traduza no desenvolvimento das zonas afetadas.
Apontam como exemplos projetos de exploração de areias pesadas em Moma e Angoche (ambos na província de Nampula, Norte do país), carvão mineral em Tete (zona Centro) e gás natural em Temane (zona Sul).
O debate pretende preparar os investimentos em gás natural na bacia do Rovuma, Norte do país (que vão estar igualmente em foco na cimeira empresarial) por parte de consórcios liderados pela Total, Exxon Mobil e Eni e cujos investimentos vão rondar 50 mil milhões de dólares (45,3 mil milhões de euros).
O encontro é promovido pelas organizações Kuwuka, Associação Nacional de Extensão Rural, Coligação Cívica sobre a Indústria Extrativa e Oxfam Moçambique, com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).
Nampula: População de Angoche insatisfeita com contributos de mineradora chinesa
Contributos dados pela mineradora Haiyu Mozambique Mining Company não são suficientes, diz a população. Problemas relacionados com serviços básicos mantêm-se, não se antevendo melhorias.
Foto: DW/S. Lutxeque
Poucos benefícios para população
As populações de Angoche, considerada a terceira maior da província de Nampula e onde está instalada a mineradora chinesa Haiyu Mozambique Mining Company, continuam, depois de cerca de oito anos depois do início da exploração das areias pesadas, a enfrentar sérios problemas relacionados com serviços básicos, nomeadamente, acesso a água, corrente eléctrica e maus acessos rodoviários.
Foto: DW/S. Lutxeque
Comunidades pobres em zonas ricas
No distrito, as comunidades de Sangache, Murrua e Namue, são exemplo da pobreza extrema que assola esta região de exploração de minérios. As habitações são, maioritariamente, de construção precária, feitas com base em tijolos menos resistentes, paus e folhas de coqueiros.
Foto: DW/S. Lutxeque
Muita produção para pouco retorno
A mineradora chinesa iniciou a exploração das areias pesadas em Sangache, em 2010. E, até à data, a produção continua em alta, apesar da oscilação dos preços no mercado internacional. No entanto, a população diz continuar a não ver o retorno da exportação dos valiosos minerais explorados nas suas terras, como são o ilmenite e o zircão.
Foto: DW/S. Lutxeque
Défice de água potável
A água potável de qualidade e em quantidade, para consumo humano, é um dos problemas que tira o sossego aos milhares de habitantes destas regiões. Nos populosos bairros de Murrua e Namue, por exemplo, existem poucos furos de água potável, apesar de, nos últimos meses, a mineradora ter construído dois poços.
Foto: DW/S. Lutxeque
Degradação de estradas
Outro dos problemas é a degradação das estradas. No interior do distrito de Angoche, assim como nas suas vias de acesso, desde Nampula, as estradas não estão em boas condições. São todas de terraplanagem e, consoante a estação do ano, apresentam poeira, buracos ou lamas. A população queixa-se de falta de sensibilidade da mineradora na resolução deste problema, que também afeta a sua atividade.
Foto: DW/S. Lutxeque
Reabilitação para benefício próprio
Para além de desiludidos com a empresa chinesa, os citadinos sentem-se também enganados. Enquanto a população se queixa das dificuldades provenientes do mau estado da estrada que liga Angoche a Nampula, a mineradora está a reabilitar um troço - inferior a dez quilómetros - que dá acesso ao porto local, de forma de facilitar o transporte dos produtos da sua fábrica ao porto.
Foto: DW/S. Lutxeque
Armazéns cheios
Nos armazéns da Haiyu Mozambique Mining Company, os produtos continuam a entrar e a capacidade de armazenamento revela-se cada vez mais esgotada. Não há espaço no interior do armazém da empresa, localizado no porto de Angoche. É daqui que saem os recursos que são exportados para o mercado internacional.
Foto: DW/S. Lutxeque
Pressão popular
Apesar das promessas, a contribuição das multinacionais para a população tem sido fraca. Os líderes comunitários dizem-se desapontados. À DW, Lopes Vasco, líder comunitário de Angoche, diz que estas empresas "não estão, até agora, a responder às suas obrigações. Não se justifica que as populações continuem pobres enquanto elas fazem muito dinheiro com os nossos recursos".
Foto: DW/S. Lutxeque
Iluminação
Depois de muita pressão por parte dos líderes comunitários, e depois de uma reunião com o governo, a mineradora celebrou, em setembro de 2018, um memorando para a criação de um plano estratégico de responsabilidade social para o período de 2017-2020. A construção desta Rede de Baixa Tensão, que custou cerca de dez milhões de meticais, cerca de 140 mil euros, foi uma das ações acordadas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mais emprego
Desde 2010, quando iniciou a sua atividade em Sangache, a empresa chinesa tem vindo também a apostar na mão-de-obra nacional, em detrimento da estrangeira, tendo já levado dezenas de moçambicanos para formação técnico-profissional na China. Atualmente, a empresa conta com 500 trabalhadores, dos quais apenas 30 são estrangeiros, na sua maioria de nacionalidade chinesa.
Foto: DW/S. Lutxeque
Melhorias na saúde
Além da abertura de alguns furos de água e expansão da corrente elétrica, a mineradora está também a dar o seu contributo ao setor da saúde. No final do ano passado, a Haiyu Mozambique Mining Company comprou uma ambulância equipada para as comunidades de Angoche, avaliada em mais de quatro milhões de meticais, cerca de 56 mil euros.