O primeiro papa da América Latina foi eleito em 2013. Quebrar barreiras tem sido a missão de Francisco, que nos últimos anos se tornou numa espécie de "estrela pop" teológica e política. Balanço de um pontificado.
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"Uma pessoa que pensa em construir muros em vez de pontes não é cristã. Isso não está no Evangelho", disse, sem rodeios, o papa Francisco na viagem que fez ao México, há dois anos. O pontífice criticava desta forma os planos do Presidente norte-americano, Donald Trump, de construir um muro para separar o México e os Estados Unidos da América (EUA).
O argentino Jorge Mario Bergoglio, agora com 81 anos, está no Vaticano há cinco anos. Poucos minutos depois da eleição do primeiro papa latino-americano, a 13 de março de 2013, já havia sinais de que este papa vindo de "outro fim do mundo", como o próprio declarou na altura, parecia ser diferente dos seus predecessores.
Superar divisões
A mensagem do papa Francisco é simultaneamente política e pastoral. No muro de Belém, rezou pela paz entre Israel e a Palestina. Também defendeu o fim da "era do gelo político" entre Cuba e os Estados Unidos. E recebeu refugiados no Vaticano.
"Francisco quer superar divisões ao invés de cimentá-las com muros, porque ele é muito político", diz Bernd Klaschka, próximo do papa e ex-presidente-executivo da Ação Episcopal Adveniat, organização católica de ajuda à América Latina. "Na América Latina, Francisco desempenha um papel semelhante ao de João Paulo II na Europa, que contribuiu para a queda do Muro (de Berlim)", lembra.
Cinco anos de Papa Francisco
Embora o muro entre o México e os EUA continue a crescer, Francisco já conseguiu quebrar barreiras na Colômbia e em Cuba, através da mediação entre as partes em conflito.
Dentro da Igreja Católica também parece haver sinais de mudança. O papa nomeou novos cardeais da América Latina, de África e da Ásia e deu mais poder de decisão às conferências nacionais e regionais de bispos.
A maioria dos 49 cardeais nomeados por Francisco vem de países emergentes e em desenvolvimento, que até aqui tinham recebido pouca atenção no Vaticano. Aumenta, assim, a possibilidade de na próxima eleição papal o comité de cardeais - formado por 117 membros - escolher pela primeira vez um papa africano.
O membro mais jovem do comité é Dieudonné Nzapalainga, de 50 anos, arcebispo de Bangui, capital da República Centro-Africana. "O sumo pontífice ama África. Recentemente, ele pediu a todos os católicos e ao mundo inteiro que rezem pela paz no Congo e no Sudão do Sul", disse em entrevista à DW.
Fugir da violência na República Centro-Africana
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Em 2015, Dieudonné Nzapalainga foi distinguido na Alemanha com o Prémio da Paz de Aachen, juntamente com o imã Kobine Layama, também da República Centro-Africana, pelos seus esforços em prol da reconciliação entre cristãos e muçulmanos no país.
Para o teólogo brasileiro Leonardo Boff, o rejuvenescimento do comité de cardeais mostra que Francisco pretende formar "uma dinastia de papas do Terceiro Mundo". "Este papa vai mudar a Igreja", disse à DW pouco depois da eleição de Francisco.
"Nunca antes num Pontificado houve tanta coragem para denunciar um sistema imperati. E ele inaugura uma primavera na Igreja. Vivemos 30 anos no inverno, numa espécie de volta à grande disciplina, enquadrando teólogos, condenando muitos que ocupavam cátedras importantes", defende Boff.
Padres casados?
A primeira viagem ao estrangeiro do sucessor de Bento XVI foi ao Brasil. Francisco chegou ao Rio de Janeiro em 2013 para a Jornada Mundial da Juventude. Agora, o papa convocou uma Assembleia Especial do Sínodo dos Bispos para a região Pan-amazónica, que terá lugar em 2019, no Vaticano.
Neste evento, deverá decidir-se se homens casados podem ser ordenados padres, um tema tabu para a Igreja Católica. Os mais críticos já defendem que é preciso evitar o que chamam de "teologia Copacabana", em que os dogmas são suavizados e a doutrina tradicional da igreja é questionada.
"A igreja não pertence aos conservadores, mas a todos", responde o arcebispo de Accra, Gabriel Charles Palmer Buckle, que considera as reações exageradas. "Do mais conservador ao mais liberal, há espaço para todos nós no coração do papa Francisco".
Fuga e sofrimento na República Centro-Africana
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Aqueles que podem, fogem. Aqueles que permanecem, lutam todos os dias pela sobrevivência.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Refúgio no aeroporto de Bangui
Desde o golpe de Estado, há um ano, a situação na República Centro-Africana está fora de controle. Milícias cristãs e muçulmanas promovem amargos combates. Um milhão de pessoas estão em fuga. Quase todos os muçulmanos deixaram a capital, Bangui. Entre os que permaneceram, algumas centenas encontram abrigo num velho hangar do aeroporto.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Perder tudo
O marido de Jamal Ahmed tinha guardado dinheiro suficiente para a fuga de sua família, quando as milícias cristãs chamadas "Anti-Balaka" invadiram sua aldeia natal. As poucas economias não foram suficientes - ele pagou com a vida. Jamal Ahmed vive no acampamento que surgiu no aeroporto: "Não conheço ninguém aqui. Não tenho mais nada. Não sei como será daqui para a frente.”
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ver os netos mais uma vez
Aos 84 anos, Fatu Abduleimann está entre os moradores de idade mais avançada do campo de refugiados do aeroporto. Nas últimas décadas, Fatu assistiu a muitas dificuldades em sua terra natal. Mas nunca foi tão ruim quanto agora, diz a idosa. Seu único consolo: a maioria dos seus filhos conseguiu fugir para o Chade. Seu maior desejo: "ver os meus netos mais uma vez."
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Quilómetro Cinco, uma cidade fantasma
Exceto o acampamento de refugiados no aeroporto, quase todos os muçulmanos deixaram a cidade. Há alguns meses, o chamado "Quilómetro Cinco" era um animado centro da comunidade muçulmana. Mais de 100.000 pessoas moravam e trabalhavam aqui, a cinco quilómetros do centro da capital, Bangui. Agora, restaram apenas algumas centenas de pessoas. As lojas estão fechadas até nova ordem.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Esperar o momento certo
Quase todos os muçulmanos que ainda restam no "Quilómetro Cinco" querem apenas uma coisa: sair daqui. Os caminhões para a fuga estão prontos. Eles esperam que um comboio tenha como destino os países vizinhos como os Camarões ou o Chade.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
A cidade de campos de refugiados
Não apenas os muçulmanos temem por suas vidas. Por toda a cidade de Bangui pode-se encontrar acampamentos provisórios em que a maioria da população, cristãos e animistas, procura proteção - por medo de um retorno das milícias islamistas ou simplesmente porque não têm o que comer - e espera por doações de alimentos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Ajuda sobrecarregada
O Pastor David Bendima recebeu, na sua igreja, mais de 40 mil pessoas que fugiram dos combates no centro da cidade. Mas ele também não pode garantir-lhes segurança suficiente. "Todas as noites ouvimos tiros e granadas explodindo. As pessoas estão com muito medo", diz o pastor. Ele parece cansado.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Últimas reservas
Chancella Damzousse, de 16 anos, vive em uma aldeia a meia hora de distância de Bangui. Ela prepara o jantar. "Tudo o que resta são alguns grãos de feijão e um pouco de gergelim", diz a jovem. 15 pessoas terão que se satisfazer com a refeição. Desde que milícias muçulmanas destruíram o lugar há alguns meses e mataram muitos cristãos, a família de Chancella recebeu vários vizinhos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Vítimas, autores, centinelas
Ao lado da casa de Chancella, há um guarda da milícia Anti-Balaka. Os amuletos em seu corpo o tornam invulnerável contra balas, explica ele. A milícia tomou o controle da região. Seu trabalho é proteger os moradores da aldeia do ataque de outros rebeldes. No entanto, a sua proteção aplica-se apenas aos cristãos - há muito tempo os muçulmanos deixaram o local ou foram mortos.
Foto: Kriesch/Scholz/DW
Presença internacional
Sete mil soldados da União Africana e da França têm a responsabilidade de garantir a segurança no país dilacerado. A situação humanitária está piorando a cada dia, no entanto. Em 1 de abril, a União Europeia lançou oficialmente a sua operação militar na República Centro-Africana, com um contingente de até mil homens para reforçar as tropas francesas e africanas por um período de até seis meses.