CIP: Governação e transparência em declínio em Moçambique
19 de novembro de 2020A administração pública, a política de terras, a indústria extrativa e a justiça, entre outros, são setores críticos na governação em Moçambique. É o que diz o Centro de Integridade Pública, CIP, no seu mais recente relatório, publicado esta quinta-feira (19.11).
O diretor executivo da organização, Edson Cortês, refere que persistem enormes desafios para a boa governação, que passam pela prestação de contas e o combate a corrupção.
"Julgo que a corrupção em Moçambique é o combustível para o enriquecimento das nossas elites. Sem ela a vida que muitos deles ostentam seria tecnicamente impossível de justificar. Os carros que os filhos dos nossos dirigentes ostentam, as casas, os bens de luxo", identifica.
O diretor do CIP diz que era só uma questão de Amelia Nacari Muendani, presidente da Autoridade Tributária de Moçambique, "pedir a declaração de rendimento dessas pessoas."
Edson Cortês não tem dúvidas de que em Moçambique não há vontade política no combate à corrupção. Para o CIP, esse papel cabe, agora, à sociedade, "pressionando, denunciando, trazendo evidências, lutando nos tribunais, usando todo o tipo de argumentos possíveis para mostrar que é um sistema que não tem viabilidade a longo prazo, nem para essas próprias elites nem para o país".
O jurista e professor universitário Jaime Macuane, um dos coautores do relatório, refere que o quadro legal do setor público é consistente e sólido, mas critica a sua implementação. "Na prática, notamos que ainda existem falhas em relação a isso", explica. "Quando olhamos para uma área específica, como a orçamental, nós verificamos que nestes últimos anos houve uma melhoria, mas ainda está muito abaixo do potencial que o quadro legal existente permitiria sobre como os fundos públicos estão a ser geridos".
Rendimentos por declarar
O jurista critica ainda o facto de os servidores públicos, sobretudo os altos responsáveis, não estarem a declarar os seus rendimentos nos últimos cinco anos.
"Aqueles que normalmente são responsáveis por controlar as declarações, que é o Ministério Público, nunca nesses cinco anos chegou a mais de 80% em termos de declaração de bens. Ou seja, os fiscalizadores dessa componente fundamental para a transparência dos servidores públicos eles mesmos não cumprem", considera.
Também na política de terras a ausência de prestação de contas é problemática, diz o CIP. As falhas vão desde o fornecimento de informação na gestão de terra até à atribuição e fiscalização. "Por exemplo, se estamos a falar de um aspeto, normalmente dramático, que tem a ver com a extinção dos direitos sobre a terra, quer no âmbito de permitir a entrada de grandes investimentos assim como a construção de infraestruturas de interesse público", explica o jurista Eduardo Chiziane, outro dos autores do relatório, frisando que "é importante explicar os mecanismos que o Governo utilizou para conduzir esses processos do ponto de vista de transparência e confortar os cidadãos".