Os confrontos entre o exército sudanês e os paramilitares já causaram pelo menos 330 mortos e 3.200 feridos. Faltam alimentos e água corrente. Líder do exército diz que militares estão empenhados em transição civil.
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Tal como muitos sudaneses que estão escondidos nas suas casas, evitando abrir as janelas por medo de serem atingidos por balas, Mujtaba Musa leva o seu apelo às redes sociais e pede aos mais de 200 mil seguidores que "partilhem os seus pedidos de ajuda".
Desde que os combates eclodiram no Sudão, no passado sábado (15.04), com ataques aéreos e fogo de artilharia em áreas densamente povoadas, os civis vivem dias cada vez mais difíceis. Faltam alimentos e água corrente e há cortes de energia constantes.
"A situação é muito difícil. As condições de vida, os hospitais... é difícil em todos os sentidos. Não há transportes nem gasolina, pão e medicamentos. Não há nada!", conta Mohammed Ahmed Soliman, residente em Cartum.
Milhões de crianças em risco
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) já alertou que milhões de crianças sudanesas estão em risco devido aos confrontos entre o exército sudanês e as Forças de Apoio Rápido (RSF).
Sudão em pé de guerra civil
08:16
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Segundo a ONU, os combates entre os rivais já causaram cerca de 300 mortes e 3200 feridos, mas este número pode ser superior, já que muitos corpos ainda não foram retirados das ruas.
O mais recente cessar-fogo anunciado para terça e quarta-feira falhou, como comprovam relatos de tiros feitos por residentes.
Na quinta-feira (20.04), o militar que governa o país, Abdel Fattah Al-Burhan, declarou que "não havia lugar" para negociações com o opositor e comandante das RSF, Mohamed Hamdan Dagalo.
Como prioridade imediata, o secretário-geral da ONU, António Guterres, apelou a um cessar-fogo, a partir desta sexta-feira (21.04), "de pelo menos três dias para assinalar as celebrações do Eid al-Fitr", que marcam o fim do mês sagrado do jejum e da oração na tradição muçulmana, o Ramadão, para permitir a saída de civis das zonas de conflito.
Estudantes estrangeiros querem regressar
No caso de um cessar-fogo, o Quénia pretende evacuar todos os seus cidadãos que vivem no Sudão, incluindo 400 estudantes.
A Tanzânia tem pelo menos 210 cidadãos que não podem sair do país em conflito, dos quais 171 são estudantes. "Vamos continuar a analisar esta situação e se os combates pararem, pode não haver razão para os nossos cidadãos partirem".disse à DW Stergomena Lawrence Tax, ministra tanzaniana dos Negócios Estrangeiros.
Numa carta partilhada na rede social Twitter, estudantes nigerianos apelaram ao Governo, pedindo-lhe "a evacuação imediata dos estudantes [desse país] que estão no centro da guerra em curso", disse a Associação Nacional de Estudantes Nigerianos no Sudão (NANSS).
Os Estados Unidos da América (EUA) preparam-se para retirar, se for necessário, o pessoal da sua embaixada no Sudão.
O Presidente do Quénia, William Ruto, apelou ao fim dos combates, avisando que poderiam desestabilizar a região. "É tempo de silenciar as armas na nossa região e continente para que possamos concentrar-nos no trabalho urgente de permitir que o nosso povo persiga oportunidades e realize as suas aspirações em paz e tranquilidade. O tempo é essencial", disse o mediador.
Para quando a transição civil?
O chefe do exército e presidente do Conselho Soberano de Transição no Sudão, general Abdel Fattah al Burhan, afirmou hoje que os militares continuam empenhados numa transição para um governo civil.
"Estamos confiantes de que ultrapassaremos esta provação com a nossa formação, sabedoria e força, preservando a segurança e unidade do Estado, permitindo-nos que nos seja confiada a transição segura para um governo civil", afirmou o responsável, numa mensagem vídeo para assinalar o feriado do Eid al-Fitr, que marca o fim do Ramadão.
Além de ser o primeiro discurso desde que os brutais combates entre as suas forças e os paramilitares do país começaram, há quase uma semana, foi também a primeira vez que Al Burhan foi visto desde que a capital e outras áreas são palco de combates. Desconhece-se quando ou onde foi gravada a mensagem.
"A ruína e a destruição e o som de balas não deixaram lugar para a felicidade que todos merecem no nosso amado país", disse Al Burhan, no discurso.
Na quinta-feira (20.04), os militares do Sudão descartaram negociações com as forças rivais, dizendo que só aceitariam a rendição.
O povo contra o exército - Cronologia da luta pelo poder no Sudão
A evacuação violenta de um campo de protesto na capital sudanesa, Cartum, exacerbou as tensões entre manifestantes e militares. A luta pelo poder documentada em imagens.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Protesto
Durante semanas, manifestantes sudaneses resistiram diante do Ministério da Defesa. Milhares exigiram um conselho de transição que incluísse civis, para poderem também decidir sobre o futuro do país. No início de junho, os militares atacaram violentamente os manifestantes. Dezenas de pessoas morreram.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Em nome da nação
Um manifestante com a bandeira nacional perto do quartel-general do exército. A bandeira representa a exigência dos manifestantes de civis nos comandos para moldarem o futuro do país juntamente com os militares. A acontecer, este seria um passo importante para a democracia.
Foto: Reuters
Sinais de alarme
Os militares aumentaram massivamente a presença nas ruas, nos dias que antecederam o massacre no início de junho. Muitos manifestantes interpretaram a situação como prova de que o exército não queria abandonar o poder. Mas esta tinha sido a grade esperança de muitos sudaneses após a queda do ditador Omar al-Bashir.
Foto: Getty Images/AFP
Uma era chega ao fim
Omar al-Bashir governou o Sudão desde 1993 até sua queda, em abril de 2019. Os seus críticos foram violentamente reprimidos. Para manter o poder, al-Bashir chegou a dissolver o Parlamento, em 1999. Na mesma altura, concedeu asilo ao líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden. Acima de tudo, porém, o seu nome continua associado à guerra sangrenta contra os separatistas na província de Darfur.
Foto: Reuters/M. Nureldin Abdallah
Ditador em tribunal
Ver o ditador em tribunal era um sonho antigo de muitos sudaneses. A 16 de junho, Omar al-Bashir apareceu no processo contra ele instaurado. Para já, é acusado de corrupção e posse ilegal de moeda estrangeira. Depois da sua queda, a polícia encontrou na sua residência sacos de dinheiro no valor de mais de cem milhões de dólares.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Hjaj
As mulheres querem ser ouvidas
Muitas mulheres participaram nos protestos. As mulheres no Sudão sempre beneficiaram de uma liberdade relativamente significante. Agora, não só reforçam quantitativamente as manifestações, como também lhes dão um rosto diferente. A sua presença expressa o desejo de democracia e igualdade de muitos cidadãos.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Ícone da revolução
A estudante de arquitetura Alaa Salah tornou-se a face da revolução. Quando subiu ao telhado de um carro em abril para falar com os manifestantes, um fotógrafo atento fez esta imagem. Desde então, ela tem sido partilhada inúmeras vezes nas redes sociais. Fotos como estas tornaram-se uma parte importante da revolução, porque convidam os cidadãos a identificarem-se com os protestos.
Foto: Getty Images/AFP
Solidariedade internacional
Graças às plataformas sociais online, a notícia dos protestos no Sudão rapidamente correu o mundo. E logo mereceram apoio internacional, como aqui em Edimburgo, Escócia. Recentemente os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia também se fizeram ouvir: "A UE apela ao fim imediato de toda a violência contra o povo sudanês", disseram numa declaração oficial.
No entanto, a oposição ao exército no poder não é consensual. Muitos sudaneses apoiam os militares, porque acreditam que só uma governação autoritária pode conduzir o país a um futuro próspero. Os apoiantes dos militares consideram que o General Abdel Fattah Burhan, presidente do Conselho Militar, representado no cartaz, reúne as condições para cumprir a tarefa.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
À espera
Mas a eminência parda General Mohammed Hamdan Daglu, conhecido por Hemeti, é tido como o homem forte do regime de transição. Daglu comandou a tropa que reprimiu os protestos em frente ao quartel-general militar. Durante a guerra do Darfur, liderou as milícias Janjaweed, que combateram brutalmente os rebeldes. Os manifestantes temem que ele possa vir a ser o novo governante do país.
Foto: Reuters/M.N. Abdallah
O Golfo preocupado
Políticos de outros países árabes também olham com nervosismo para o Sudão. Por exemplo, Mohamed bin Zayad al-Nahyan, o Príncipe Herdeiro dos Emirados Árabes Unidos. Tal como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos temem que o protesto possa ser um exemplo de uma revolução popular bem-sucedida na região, pondo em questão governos autoritários. Ambos os países apoiam os militares sudaneses.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Ministry of Presidential Affairs/M. Al Hammadi
Os vizinhos a norte
Também no Cairo se olha com preocupação para Cartum. O Governo do Presidente Abdel-Fattah al-Sisi receia que a Irmandade Muçulmana possa ganhar influência no Sudão - precisamente o grupo contra o qual o Governo egípcio está a agir com todas as suas forças no seu próprio país. Se a Irmandade Muçulmana se estabelecesse no Sudão, poderia, a partir daí, voltar a exercer uma forte influência no Egito.
Foto: picture-alliance/Photoshot/MENA
Protestos sem fim à vista
No Sudão prosseguem os protestos. No dia 14 de junho, Sadiq al-Mahdi, uma das principais figuras da oposição do país durante décadas, exigiu uma investigação da evacuação violenta do campo de protesto. É algo que não pode agradar aos militares. As tensões poderão voltar a agravar-se.