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ConflitosSudão

Combates pesados marcam início de nova trégua no Sudão

Lusa | Martina Schwikowski | rl | mjp
4 de maio de 2023

Arrancou hoje (04.05) o quarto cessar-fogo anunciado entre o exército sudanês e as Forças de Apoio Rápido, mas população assiste ao "combate mais pesado" desde o início das hostilidades. ONU pede apoio para refugiados.

Sudan Konflikt l Situation in Khartum l Rauch über der Stadt
Foto: Social Media via REUTERS

As duas partes em conflito no Sudão deram hoje (04.05) início a uma nova trégua, desta vez de uma semana. Trata-se do quarto cessar-fogo anunciado entre o exército sudanês e as Forças de Apoio Rápido (RSF) desde o início do conflito, ainda que, até agora, nenhum tenha travado os combates e já haja registo de violações esta quinta-feira.

As Forças Armadas sudanesas afirmaram, num comunicado publicado na sua conta na rede social Facebook, que as RSF tinham atacado as suas posições na capital e sublinharam que tinham dado "um castigo decisivo ao inimigo, que se dispersou entre mortos, feridos e fugitivos", pedindo ao mesmo tempo à população que não tocasse em qualquer material deixado na zona, por razões de segurança.

A mesma fonte declarou que oito veículos tinham sido destruídos durante os combates e prestou homenagem aos "mártires" que se encontravam nas suas fileiras, sem comentar o número de vítimas dos combates.

Por sua vez, as RSF criticaram as "ações irresponsáveis dos líderes das forças golpistas e dos remanescentes extremistas do regime extinto (do ex-Presidente Omar Hassan al-Bashir, deposto em 2019) ao violar a trégua humanitária". "Eles atacaram as nossas forças (...) em vários locais", referiram na sua conta no Twitter.

"As nossas forças e os bairros residenciais foram alvo de bombardeamentos indiscriminados de artilharia e de caças, o que constitui uma violação cobarde e flagrante do direito internacional e do direito humanitário. Já dissemos anteriormente que existem vários centros de decisão no grupo golpista, o que afeta negativamente a implementação da trégua humanitária", denunciaram.

550 mortos e centenas de milhares em fuga

O chefe das Forças Armadas sudanesas e presidente do Conselho Soberano de Transição, Abdel Fattah al-Burhan, e o líder das RSF, Mohamed Hamdan Dagalo, conhecido como "Hemedti", deram o seu acordo de princípio no domingo para estabelecer uma trégua entre hoje e sexta-feira da próxima semana, tal como anunciado pelo Governo do Sudão do Sul, que empreendeu esforços de mediação.

No entanto, moradores de Cartum disseram à agência de notícias EFE que este é o "combate mais pesado" desde o início das hostilidades, pois ouviram fortes explosões no Palácio da República e no comando geral do exército no centro de Cartum, além de combates nas ruas da área militar de Cartum Norte, esta quinta-feira.

O conflito já provocou pelo menos 550 mortos e obrigou à deslocação de pelo menos 330.000 pessoas no interior do Sudão e mais de 100.000 pessoas a abandonar o país.

As hostilidades eclodiram a 15 de abril, após semanas de tensão sobre a reforma das forças de segurança nas negociações para a formação de um novo governo de transição. Ambas as forças estiveram por trás do golpe conjunto que derrubou o executivo de transição do Sudão em outubro de 2021.

Refugiados sudaneses no ChadeFoto: Gueipeur Denis Sassou/AFP

Países vizinhos sob pressão

A situação é extremamente complexa e está a colocar pressão nos países vizinhos, já de si extremamente frágeis. As Nações Unidas alertaram já para uma crise humanitária catastrófica com potencial para se alastrar. Milhares de sudaneses estão a fugir para países como o Sudão do Sul, Egito, Chade e República Centro-Africana.

Eujin Byun, porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados em Genebra, frisa que a chegada destes refugiados constitui um desafio para todos estes países e pede mais apoio à comunidade internacional: "Mais de 70% dos refugiados que atravessam atualmente a fronteira são mulheres e crianças. Andam a pé durante 24 horas, não levam quase nada consigo e chegam à fronteira sem abrigo, sem roupa, sem comida e sem água. Portanto, é esta a ajuda urgente que estamos a pedir à comunidade internacional".

Só à República Centro-Africana chegaram recentemente cerca de 6.000 pessoas vindas do Sudão. A sua presença está a obrigar o Governo a tomar medidas, segundo o Ministro das Finanças e do Orçamento Hervé Ndoba. "Acabámos de receber a aprovação do programa do Fundo Monetário Internacional (FMI). Vamos agora analisar quanto dinheiro pode ser retirado do orçamento nacional para medidas de ajuda", explicou, em entrevista à DW.

Também em declarações à DW, Ahmed Soliman, do grupo de reflexão Chatham House, diz que há margem para que o conflito se estenda a outras regiões do continente: "Se olharmos para o Sudão, sabemos que tem sete países vizinhos, sete zonas fronteiriças. Todos estes países vizinhos vão tentar influenciar o desfecho do conflito e têm interesse em saber quem vai liderar o Sudão no futuro", frisa.

Voluntários dão apoio a refugiados sudaneses que chegam ao EgitoFoto: AFP/Getty Images

ONU pede 402 milhões de euros aos doadores

Esta quinta-feira, a ONU anunciou que necessita de cerca de 402 milhões de euros para ajudar 860.000 pessoas que precisam de fugir dos combates mortais no Sudão entre o exército e os paramilitares, até outubro. O apelo foi apresentado aos países doadores pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) no início do dia, através de um comunicado, no qual é indicado que o Egito e o Sudão do Sul deverão registar o maior número de chegadas.

O plano apresentado aos países doadores cobrirá as necessidades destas pessoas no Chade, Sudão do Sul, Egito, Etiópia e República Centro-Africana. "A situação humanitária no Sudão e nos seus arredores é trágica - há escassez de alimentos, água e combustível, acesso limitado aos transportes, às comunicações e à eletricidade, e os preços dos produtos de base estão a aumentar", declarou o alto comissário Adjunto a agência da ONU para as Operações, Raouf Mazou, em comunicado.

"O ACNUR e os seus parceiros têm equipas de emergência no terreno e estão a ajudar as autoridades com apoio técnico, registando as chegadas, monitorizando a proteção e reforçando o acolhimento para garantir que as necessidades urgentes são satisfeitas", acrescentou, sublinhando que "isto é apenas o início" e "é urgentemente necessária mais ajuda".

Ruas estão quase desertas em CartumFoto: -/AFP

Sanções à vista?

O secretário-geral das Nações Unidas considera que o mundo "falhou" ao não conseguir evitar a guerra. Na quarta-feira, António Guterres afirmou que "sendo um país numa situação humanitária tão desesperada, o Sudão não pode ser palco de uma "luta pelo poder entre duas pessoas".

Já esta quinta-feira, o Presidente dos EUA, Joe Biden, disse que o conflito "tem de acabar" e autorizou potenciais novas sanções aos responsáveis pelo derramamento de sangue. "A violência que está a acontecer no Sudão é uma tragédia - e é uma traição à exigência clara do povo sudanês de um Governo civil e uma transição para a democracia", afirmou, em comunicado.

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